Scripta Nova
REVISTA ELECTRÓNICA DE GEOGRAFÍA Y CIENCIAS SOCIALES
Universidad de Barcelona.
ISSN: 1138-9788. Depósito Legal: B. 21.741-98
Vol. IX, núm. 194 (43), 1 de agosto de 2005

 

POLÍTICAS ESPACIAIS DE REQUALIFICAÇÃO URBANA NA ÁREA CENTRAL DO RIO DE JANEIRO: NOVA ESTÉTICA DA DESINTEGRAÇÃO LOCAL E ESPETÁCULO DA PROJEÇÃO GLOBAL

 

Julio Cesar Ferreira Santos

Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Departamento de Geografia.

E- Mail: uerjulio@yahoo.com.br

 


Políticas Espaciais de Requalificação Urbana na Área Central do Rio de Janeiro: Nova Estética da Desintegração Local e Espetáculo da Projeção Global (Resumo)

Diversas cidades implementaram em suas Áreas Centrais intervenções pós-fordistas buscando requalificação urbana através de recentralização econômica. No Rio de Janeiro, essas políticas espaciais do Estado pretendem transformar o Porto em um pólo multifuncional e integrá-lo à dinâmica do Núcleo Central.

Este trabalho analisa tal estratégia através das duas últimas reestruturações capitalistas para compreender a atual organização espacial da Zona Periférica do Centro e as conseqüências da revisão de seus usos. Estuda a tentativa de localizar o Rio de Janeiro no grupo das metrópoles mundiais, assim como uma provável desterritorialização dos moradores devido às novas funções e símbolos.

Finalmente, evidencia-se a inter-relação da requalificação com a formação de cidades-espetáculo, metrópoles com uma nova estética afirmadas pelo complexo cultural e turístico. Para integrar o Porto, a fragmentação do espaço urbano é enfatizada, subordinado à lógica do capitalismo contemporâneo.

 

Palavras-chave: Requalificação Urbana, Recentralização, Cultura, Turismo, Metrópoles Mundiais.


Spatial policies of urban reclassification in a central urban area of Rio de Janeiro: a new strategy of local disintegration and a spectacle of global projection (Abstract)

Several cities have implemented in their Downtown Areas post-fordist interventions searching for urban requalification through economic recentralization. In Rio de Janeiro, these State spatial policies intend to turn the Harbor into a multifunctional pole and also integrate it to the Central Core dynamics.

This paper analyzes such strategy based on the two last capitalist restructuring to understand the current spatial organization of the Outskirts Zone Downtown and the consequences of the revision of its uses. It studies the attempt to localize Rio de Janeiro in the global metropolises set, as well as a probable deterritorialization of the inhabitants due to the new functions and symbols.

Finally, it becomes evident the interrelation of the requalification with the formation of spectacle cities, metropolises with a new esthetic affirmed by the cultural and tourist complex. To integrate the Harbor, the fragmentation of the urban space is emphasized, subordinated to the contemporary capitalism logic.

 

Keywords: Urban Requalification, Recentralization, Culture, Tourism, Global Metropolises.


 

 

Requalificar[1] as áreas portuárias e adjacentes de metrópoles tem se mostrado uma tendência pelo mundo. Diversas cidades já implementaram em suas Áreas Centrais[2] práticas intervencionistas buscando uma “renovação” urbana e um maior incremento econômico. Essas práticas baseiam-se em um receituário “pós-fordista” indutor de políticas urbanísticas de recentralização e desenvolvimento econômico terciário (de produção e consumo). Tal dinamismo é notadamente percebido pela atração de empreendimentos representativos para os locais contemplados pela requalificação urbana e pelos abalos conseqüentes na estrutura interna das cidades.

 

Desta forma, a estratégia de recuperação e eliminação da obsolescência tem agora, como laboratório, a área do Porto do Rio de Janeiro. Os bairros do Santo Cristo, Gamboa, Saúde e parte do Centro (Praça Mauá) são apresentados, então, como o recorte espacial a ser modificado estruturalmente pelo projeto.

 

No entanto, constata-se que os investimentos imobiliários cariocas têm seu foco na Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro, mais precisamente na direção da Barra da Tijuca, do Recreio dos Bandeirantes e do novíssimo Recreio de Guaratiba. Competir por esses recursos e justificar a viabilidade econômica desses investimentos no Porto é tarefa da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, principal agente que planejou este projeto de intervenção urbana.

 

Neste contexto, transformar a Zona Portuária em um pólo multifuncional (com ênfase na cultura, alta tecnologia, habitação e turismo) e integrá-lo à dinâmica do núcleo central carioca é o grande desafio assumido pelo poder público, estabelecendo os paradigmas e os eixos de desenvolvimento local.

 

Assim, a presente pesquisa tem como objetivo precípuo analisar o referido projeto sob a luz dos dois últimos processos de reestruturações capitalistas, fundamentais para a compreensão da atual organização espacial da zona periférica do centro e, ainda, a revisão das funções urbanas a partir da intervenção, e suas conseqüências naquele lugar. Além disso, estuda a tentativa de localizar, de fato, o Rio de Janeiro no rol das metrópoles mundiais[3] (no que tange à dimensão turístico-cultural), ao lado de Nova York, Miami, Londres, Paris, Tóquio. Neste contexto, busca compreender uma provável desterritorialização dos moradores locais, desconexos com os simbolismos do processo de globalização, devido à implantação de determinadas funções incompatíveis com um modo de vida depauperado, refletido nas formas espaciais degradadas da Zona Portuária.

 

 

Do Fordismo à “Crise”

 

Os efeitos da última reestruturação pela qual passou o modo de produção capitalista tiveram ascendência inequívoca sobre a metamorfose urbana nos países centrais, de 1920 a 1970 (Soja, 1993). Através de processos da chamada “modernização” fordista, o espaço de reprodução do capital é alterado substancialmente. Como reflexo da ação desses processos, cabe destacar a desconcentração da produção industrial em torno do centro da cidade e a formação dos núcleos secundários, descentralizando as atividades comerciais e de serviços (terciarização). Deste modo, a mancha urbana se expandiu e o centro esvaziou-se economicamente sofrendo uma brutal desvalorização imobiliária, bem como de sua mão-de-obra, agora mais segregada e segmentada espacialmente. Tal fato comprometeu sobremaneira a organização dos movimentos sociais no centro, principalmente o sindical. É neste contexto de precarização do trabalho[4] e degradação das formas espaciais que terão lugar as iniciativas do Estado voltadas para a “requalificação” de Áreas Centrais.

 

Em relação aos efeitos dessa reestruturação no Brasil, mais especificamente no Rio de Janeiro, registra-se uma desindustrialização da Área Central acompanhada de uma proliferação pelo espaço carioca das atividades terciárias, constituindo centralidades complementares (subcentros comerciais). Na Zona Portuária, a conteinerização[5] crescente também reduziu a área utilizada do Porto gerando “vazios urbanos” (Vaz & Silveira, 1999).

 

Em relação aos países centrais, com a interrupção de uma trajetória de crescimento na década de 1970, sustentada por consistentes investimentos produtivos no após-guerra, a ruína do edifício fordista evidencia-se inegavelmente. Os elevados gastos realizados pelo “Estado previdenciário”, direcionados à contenção das tensões sociais e ao planejamento urbano desigual, definiram uma nova redistribuição das classes sociais pelo território urbano (Soja, 1983). As ações do Estado concentraram-se no afastamento das elites para bairros distantes através de políticas habitacionais e de transportes, e na manutenção das classes populares no entorno do centro.

 

Fruto dessas políticas segregadoras, a materialização dos conflitos sociais (insurreições urbanas na Europa em 1968 e 1969) e a recessão global de 1973-75 desnudaram a falência do Welfare State, sua “crise urbana” e a necessidade de reestruturá-lo. Neste sentido, o impacto da crise do Estado gerou a demanda de revisão das práticas de planejamento.

 

Esta quebra do paradigma fordista, aqui entendido como uma “crise”, redefine as estruturas espaciais de modo a expandir as potencialidades de extração de lucros e de maior produtividade do sistema. Recombinando espaços e a lógica da localização industrial, precarizando as relações trabalhistas e desenvolvendo novas tecnologias alcança-se o nível de flexibilização exigido[6]. Para Geraiges de Lemos (2002: 183), “as descobertas tecnológicas do após-guerra e o processo produtivo industrial localizado nas cidades trazem um novo elemento da modernidade: forma-se um mercado consumidor que até esse momento não se conhecia”. Dessa forma, esboça-se uma estratégia global para formalizar uma nova sociedade para uma cidade renovada, escravizadas pela “ideologia da felicidade através do consumo” das coisas e do espaço (Lefebvre, 1991; Bauman, 1999).

 

Do fordismo herda-se “uma multiplicidade de centros manufatureiros e cidades portuárias, outrora importantes, [que] perderam suas funções e encontra-se em declínio, não só nos países menos desenvolvidos como também nas economias mais adiantadas” (Sassen, 1998, p.17). Assim, de acordo com a nova estratégia, esses espaços inviáveis emergem como laboratório para experiências urbanísticas visando ao desenvolvimento de novas atividades econômicas e implantação de novas funções em uma tentativa de restituição da centralidade. “As centralidades antigas, a decomposição dos centros são por ela substituídas pelo centro de decisão” (Lefebvre, 1991: 21) buscando a concentração dos “meios do poder: informação, formação, organização, operação” (Lefebvre, 1991: 26).

 

Destarte, o Estado rege a recentralização das nodalidades urbanas e o fortalecimento da Área Central conduzido por políticas de renovação que estimulem as funções de um centro de gestão do território[7]. Nesse momento, a desindustrialização globaliza a produção e faz da Área Central da metrópole o locus de controle e gestão internacional dos novos complexos industriais. Organiza-se uma reindustrialização seletiva na Área Central renovada baseada na alta tecnologia e na mão-de-obra flexível, mas bem remunerada.

 

Os aspectos internacionais são de fundamental importância na análise da formação do novo papel das metrópoles, pois, desta forma, expõe-se a estratégia de classe que direciona o desenvolvimento desigual no espaço urbano e seus desdobramentos no arranjo espacial, totalmente indissociáveis do processo de globalização. Além disso, contribuem para a compreensão das políticas urbanas atuais e suas implicações no comportamento da sociedade. Com efeito, tais processos contemporâneos de “reconquista” são passíveis de observação nas Áreas Centrais. Para Lefebvre (1991: 12), “o núcleo urbano torna-se, assim, produto de consumo de alta qualidade para estrangeiros, turistas, pessoas oriundas da periferia, suburbanos. Sobrevive graças a este duplo papel: lugar de consumo e consumo do lugar. Assim, os antigos centros (...) tornam-se centros de consumo”.

 

Desse modo, buscamos explicitar a estratégia de “renovação” da Zona Portuária carioca pelo poder público, associado às camadas mais privilegiadas e ao capital imobiliário. Balizados pela história do lugar, expomos o atual quadro de degradação e o projeto de intervenção municipal. Com a missão de reestruturar o espaço, ele estabelece as novas funções mais condizentes com o atual momento do capitalismo. Finalmente, analisamos as prováveis conseqüências e os reveses conjunturais do projeto de intervenção urbana que leva o nome do lugar: Plano Porto do Rio.

 

 

O Projeto de Intervenção: Terciarização por Excelência

 

A atual configuração da Zona Portuária guarda suas origens no início do século XX, durante a “Administração Pereira Passos”, inspirada na reforma empreendida em Paris pelo barão Haussmann. De 1903 a 1906, o Estado implementa uma verdadeira Reforma Urbana pela Área Central, apagando à força as marcas e os expurgos da antiga cidade colonial.

 

Durante a Reforma Passos, morros foram desmontados e seus destroços utilizados para aterros. Com parte desse entulho, desenhou-se o litoral retificado do espaço em tela guardando em seu interior um retroporto bem dimensionado. Lá, consolidou-se a área de usos sujos da capital da República e os estigmas decorrentes (Rabha, 1985).

 

Os bairros portuários não acompanharam a modernização da cidade e a verticalização do núcleo central. À medida que as indústrias caminhavam para São Cristóvão acompanhando os eixos ferroviários e, em seguida, para a periferia metropolitana, o Porto perde dinamismo e ganha vazios urbanos. Enquanto isso, a cidade estende-se com o bonde pelas praias da Zona Sul.  “Virou de costas para a baía, aproximou-se do oceano e internalizou-se em busca de chãos” (Lessa, 2000: 11). 

 

Devido à própria geomorfologia do lugar e à progressiva redução das atividades, o Porto isola-se. Com a abertura da Avenida Presidente Vargas[8], na década de 1940, separa-se, na prática, o Porto da cidade. Mais adiante, a inusitada construção da Avenida Perimetral afastou drasticamente os bairros da Zona Portuária do próprio Porto. Gerou-se um deslugar.

 

Assim, quatro das mais importantes avenidas da Área Central carioca (Presidente Vargas, Rodrigues Alves, Francisco Bicalho e Rio Branco) formam um verdadeiro anel de isolamento dos bairros portuários (Rabha, 1985) constituindo uma “ilha” circundada pelos fluxos. Romper essa compartimentação é fundamental para o sucesso do projeto de requalificação apresentado pela Prefeitura.

 

O Plano de Revitalização da Zona Portuária integra projetos que têm por fim a valorização do patrimônio cultural tombado da área, a reconquista de seus espaços urbanos, a melhoria de sua acessibilidade para os novos fluxos e sua reativação econômica a partir do comércio e serviços, opção que é adequada ao perfil da PEA carioca[9]. Na estrutura do projeto, são definidos seis núcleos de áreas especializadas[10] (Rio de Janeiro, 2003). Aqui, reorganizamos os núcleos, pois nos interessam as funções envolvidas. São eles: Transportes, Tecnologia e Comunicações; Habitação e Meio Ambiente; Turismo e Entretenimento;  Turismo e Cultura.

 

Transportes, Tecnologia e Comunicações

 

Planeja-se intervir no sistema viário, buscando uma vertebração intra e extrabairros, para uma melhor articulação e circulação dos novos fluxos e um real fomento ao turismo. Santos (2002: 133) ressalta que, “com o aprimoramento das infra-estruturas de transporte, conseqüências positivas para o comércio em geral são sentidas. Como resultado, cresce um grande número de outras atividades que dependem de uma circulação mais intensa. O fato de que as pessoas também circulam mais facilmente estimula o comércio e assegura uma clientela para as atividades de transportes”.

 

O projeto corresponde à primeira etapa do processo de efetiva modernização portuária no Estado do Rio de Janeiro. Através de parcerias públicas e privadas, nacionais e internacionais, espera-se a consecução de fases vitais do projeto. Dentre elas, a remodelagem com fins operacionais[11], de maneira a dotá-las de novos berços de atracação mais modernos, localizados no novo Terminal Internacional de Passageiros, na Gamboa, já que o Píer Mauá deverá estar ocupado pelo empreendimento-âncora da requalificação.

 

O eixo representado pela Avenida Barão de Tefé destaca a importância das infra-estruturas de comunicação e tecnologia. O projeto implica a implantação de um pólo que se torne um eixo de produção e difusão de tecnologias na Zona Portuária.

           

Não obstante a sinalização positiva, cabe destacar a existência de um outro pólo tecnológico no Estado: Petrópolis. A cidade serrana apresenta um projeto competitivo e pode comprometer a instalação plena de empresas de base tecnológica na Zona Portuária. Além disso, parte considerável das empresas que já estava no Rio migrou para São Paulo, expandindo o CBD paulistano. Apesar disso, recomenda-se a observação do exemplo do Recife e o sucesso de seu Porto Digital, base de empresas de software de baixo investimento e alta rentabilidade.  É importante ressaltar que, próximo a um pólo tecnológico, recomenda-se haver sempre um campus universitário.

 

Habitação e Meio Ambiente

 

Com a redução da área útil do Porto, grandes extensões de solo urbano da Área Central passaram à condição de vazios. Aliada ao recolhimento dos pátios de contêineres no Caju e a desativação do Cais da Gamboa, a subutilização de terrenos pertencentes à União, à RFFSA e a particulares para a especulação representa um potencial de reaproveitamento do uso do solo.

 

Em recentes pesquisas empíricas, já constatamos um reajuste dos valores das propriedades muito acima daqueles que eram praticados antes da requalificação mostrar-se uma possibilidade real. No morro da Conceição, por exemplo, novos empreendimentos residenciais encontram-se em construção, assim como já há a indicação da refuncionalização de alguns sobrados históricos como ateliês.

 

Na tentativa de minorar os efeitos negativos desse procedimento, o subprojeto “Morar no Porto” terá a função de dobrar o tamanho da população atual com renda em torno de dez salários mínimos (Rio de Janeiro, 2003) e diminuir a pressão sobre a Zona Sul, constituindo uma intervenção segmentada. Concordamos com Vaz & Silveira (1999: 60) a respeito da “efetiva ocupação desses vazios por meio da implementação de projetos habitacionais”. O retorno às políticas de residências populares deveria ser orquestrado e posto em pauta pelo poder municipal e seus parceiros. Por fim, destaca-se a implantação da Vila Olímpica da Gamboa e do Favela-Bairro nas três comunidades da Zona Portuária: Providência, Pedra Lisa e Padre Pedro.    

 

No tocante à recuperação dos espaços públicos, há propostas de intervenção em logradouros. O reforço do caráter paisagístico e cultural dará a tônica das intervenções. A reforma do imobiliário degradado diminui os riscos potenciais e garante a preservação dos prédios históricos. Além disso, a retirada dos moradores de rua é apontada como ação fundamental para diminuir a sensação de insegurança, já que os órgãos públicos enxergam uma associação entre pobreza e violência urbana. Para o reordenamento da fachada marítima, o projeto de despoluição da baía de Guanabara é um passo importante. Dependente disto é a refuncionalização do Porto do Rio. Seu núcleo habitacional inviabiliza-se se as águas estiverem poluídas (LESSA, 2000). Inviabiliza-se, também, a imagem forjada da recuperação do diálogo da cidade com a baía.

 

Quanto à legislação urbanística, propõe-se a revisão da mesma com propostas de mudança no zoneamento e nos projetos de alinhamento, visando adequar a área a um novo perfil de desenvolvimento fundamentado na prestação de serviços e atividades comerciais formais. Assim, o problema da arrecadação fiscal é atacado, pois é esperado um aumento do pagamento de impostos e tributos a partir dos novos serviços voltados para os novos moradores e para os novos comerciantes.

 

Turismo e Entretenimento

 

No projeto, privilegiam-se as atividades turísticas como forma de atração de recursos em moeda forte, dinamização da economia local e fortalecimento da imagem da cidade. A Zona Portuária requalificada contemplará o turismo cultural, o histórico e o de negócios.

 

Dentre as medidas indicadas pela Prefeitura para a requalificação do local, podemos destacar a ocupação dos armazéns por programações culturais e artísticas; recuperação de fixos históricos, como as igrejas; criação de parques públicos às margens da baía; visitação ao morro da Conceição, com seu casario centenário e suas ruelas coloniais sinuosas; a Cidade do Samba; restaurantes e bares à beira mar.

 

O turismo é uma das ferramentas utilizadas para ativar a economia dos centros “renovados”, e a arquitetura de vanguarda dos principais equipamentos é um grande atrativo. Assim, o maior destaque deverá ser o equipamento cultural âncora do processo de requalificação. A questão que se coloca é se a cidade do Rio de Janeiro possui condições de sustentar esse processo ao lado de seus colaboradores privados e instituições de fomento internacionais, pois “a fabricação/produção desses espaços [turísticos] implica, em primeiro lugar, grandes somas de dinheiro, que normalmente só podem ser aportadas às economias locais por empresas multinacionais. Estas têm, via de regra, pouco comprometimento com a problemática local, com as questões ambientais e com o retorno econômico para a população” (Barreto, 2000: 25).

 

Apesar disso é inegável o potencial de reutilização de “prédios em desuso, equipamentos obsoletos, costumes sepultados no tempo. O Turismo recicla tais elementos, incorpora homens e meios a novos processos, estimula novos fazeres, gerando novas ocupações, novos empregos” (Moesch, 2001: 98).

 

Turismo e Cultura

 

A intersecção entre turismo e cultura nos últimos anos produziu uma nova forma de apreensão do espaço enquanto produto passível de consumo. O turismo é um dos argumentos pelos quais o capitalismo penetra, altera o conteúdo de cultura de um lugar e o transforma em mercadoria. Entre as estratégias adotadas, encontra-se a necessidade forjada de se criar um grande equipamento com forma arquitetônica arrojada para acarretar uma “renovação” urbana.   

           

No caso carioca, desde o início, a Prefeitura cogitou a instalação de um museu internacional. A opção pelo Museu Guggenheim dependeu de contrapartidas mútuas, mas não foi a única organização procurada pela “Administração César Maia”. Além da Fundação Solomon Guggenheim (EUA), também foram sondados o Centro Georges Pompidou (França) e a Tate Gallery (Inglaterra).      

 

A tese central é a inclusão da cidade em uma rede urbana de museus internacionalmente reconhecidos, aumentando sua credibilidade, tornando-a um pólo cultural internacional. Além disso, a presença de um museu como o Guggenheim, catalisaria investidores privados nacionais e internacionais, pois estes já conhecem os efeitos dos projetos de requalificação de outros portos. O reforço da idéia de competitividade, da atração de recursos e eventos a qualquer custo, sustenta a cidade-espetáculo, vendida como uma mercadoria.

 

Nos países mais pobres há uma busca pela cópia de certos modelos de consumo, como se fossem a grande demanda da sociedade. Isso é decorrente da idéia de modernidade. Como corolário, tem-se a exclusão daqueles que não podem copiar, marginalizados, já que não podem fazer parte do sistema. Dessa forma, uma lógica colonial pós-moderna ganha espaço a cada nova proposta anunciada.

 

Porém, o Museu Guggenheim representa bem mais. Como ideologia materializada, ícone de uma classe e de seus valores, desencadeia uma tentativa de homogeneização cultural, já que os equipamentos culturais são concebidos por arquitetos de uma mesma escola. É a presença física da ideologia da generalização da cultura, dos valores e dos hábitos. Segundo ALERJ (2001: 15), “é emblemática e simbólica a instalação do Guggenheim na Zona Portuária. Dessa forma, nos posicionamos como espectadores do Porto, como se estivéssemos esperando a grande novidade que irá proporcionar a mudança que irá nos inserir em um processo de civilização”.

 

Como visto, o projeto de requalificação objetiva o rompimento do processo de inércia procurando alterar a estrutura que guarda o momento histórico que lhe deu origem e introduzir o novo, gerando formas tangíveis. A requalificação urbana surge para desestigmatizar e impor uma identidade terciária e turística à Zona Portuária. Após o rompimento do processo de inércia, o projeto de recentralização busca impedir o avanço dos vazios sobre o CBD, procurando evitar a degradação dos espaços públicos.

 

Na competição por recursos, o projeto de intervenção municipal terá de competir com a Barra da Tijuca pelas empresas prestadoras de serviços. Hoje, essas organizações preferem instalar-se nos business centers. Mudar essa tendência dependerá de um marketing urbano e de uma política de incentivos muito bem sucedidos.

 

Quanto ao turismo, o modelo utilizado pela Prefeitura sustenta-se na turistificação a partir da implantação de símbolos da globalização.    O turismo, a mais nova forma de reprodução do capital, é condicionado pela terceira revolução industrial, apoiada nos serviços e na tecnologia. A consciência coletiva dos dirigentes e das elites compreende o turismo como um processo inexorável para a inserção competitiva no mercado globalizado de cidades.

 

 

Espetacularização e Estetização: O Projeto “Global City” Carioca e o Exemplo de Miami

 

O projeto de requalificação da área portuária do Rio de Janeiro constitui uma “carta de intenções” visivelmente conectada à lógica global de espetacularização dos espaços urbanos, uma tendência que possui entre seus destaques cidades como Barcelona, Curitiba, Montevidéu e Buenos Aires (Sánchez, 2003), modelos de gestão e intervenção dominantes.

 

Com a ascensão da cidade-empresa, uma gestão pública essencialmente empresarial, as cidades surgem como produtos expostos para o consumo dos investidores. Sánchez (2003: 548) define a cidade-espetáculo como “a cidade-mercadoria, a cidade vendida como produto no mercado mundial. Para a potencialização dessa venda, uma combinação de transformações materiais e representações, reunidas em imagens-síntese, são acionadas como atributos mercadológicos do produto-cidade, construído por meio de (...) city marketing”. O processo de formação das cidades-espetáculo depende da criação de um marketing de cidade bem construído e interiorizado na consciência coletiva da população.

 

A partir da formulação de um discurso de crise, justifica-se a necessidade de intervenções. Então, ao requalificar a imagem, o projeto de intervenção agrega a seus objetivos “a transformação de algumas áreas em ‘novas centralidades’, fragmentos urbanos transformados em nós de atividades e fluxos – empresariais, comerciais, de serviços – somados aos espaços da chamada ‘oferta cultural’, museus e centros de lazer” (Sánchez, 2003: .499). Para isso, é necessário um redesenho do lugar, com base em um modelo internacional[12], privilegiando a instalação de uma infra-estrutura adequada e uma substancial atração de setores de prestação de serviços. Neste discurso, a criação de equipamentos culturais e turísticos de grife torna-se a chave para o desenvolvimento dos espaços obsoletos.

 

Caso um projeto semelhante seja de fato implantado no Rio de Janeiro, a Área Central da cidade passará a uma transição de seu conteúdo social. Devido à “reabilitação” engendrada, o perfil do morador se redefine. A intervenção legitima a segmentação. No lugar dos trabalhadores pobres que viviam em residências cuja forma-aparência cristalizada refletia estruturas descartadas pelo capitalismo (Rabha, 1985), instalam-se típicos representantes da classe média em residências recicladas ou recém-construídas. Este processo social é conhecido como elitização[13] (Garcia Herrera, 2001) e se contrapõe à gentrificação (Vazquez Varela, 1997; Sánchez, 2003). Os novos moradores, segundo Martínez I Rigol (2003: 1), caracterizam-se como “empleados en el creciente sector terciario, con un alto nivel de formación y con un nivel económico medio y alto, ocupaban barrios de la clase trabajadora contribuyendo al desplazamiento de la població residente”.      

 

Sánchez (2003: 550) aponta a “existência de uma rede global na qual operam fluxos informacionais associados à cidade-tipo, imbricados nos processos constituintes de um mercado global de cidades”. E completa mais à frente: “o capitalismo (...) reorganiza a produção subordinada às cidades e aos centros de decisão, implica a compra e venda do espaço na escala mundial” (Sánchez, 2003: 552).

 

A ascensão desse mercado global ligado às finanças e aos serviços especializados contribuiu para a expansão das funções decisionais e da demanda por esses serviços a partir das empresas. Sassen (1998, p.35) afirma que “a combinação da dispersão geográfica das atividades econômicas e da integração dos sistemas, que está no centro da atual era econômica, contribuiu para o papel estratégico desempenhado pelas grandes cidades”. Não perderam suas funções de comando, pelo contrário, concentraram. A cidade tornou-se o campo privilegiado para o setor financeiro e de serviços especializados construindo mercados, concentrando geograficamente as transações (Santos, 2002b).

 

Desse modo, essas cidades não se tornaram obsoletas: passaram a associar na escala global o capital produtivo e o financeiro. Essas cidades se internacionalizaram, mas, em um movimento contraditório, passaram a centralizar espacialmente o capital formando o centro de gestão do território (Corrêa, 1996) integrando pela informação múltiplas atividades industriais dispersas.

 

O Rio de Janeiro, segundo Pacheco (1998: 1), “é uma metrópole marcada pela urbanização terciária e (...) está iniciando um processo de reconstrução vinculada à modernização do setor terciário. Dentro deste contexto é que pensamos o Rio de Janeiro como um centro de decisões e de produção de serviços. (...) A cidade se internacionaliza reunindo um conjunto de atividades terciárias e economias de aglomeração, assim como sedes de empresas e producer services, além das condições de mercado favoráveis e facilidades de telecomunicações e informação”.

 

Não obstantes tais características, a cidade apresenta dinamismo questionável. O recente esvaziamento econômico metropolitano evidencia uma grave crise estrutural. De fato, a cidade apresenta características internacionais, porém não centraliza um conjunto de atividades essenciais à gestão da economia mundial.

 

Já a cidade de Miami, uma cidade mundial “latino-americana” por excelência, tornou-se um importante centro de gerenciamento administrativo e de tomada de decisões, com sedes secundárias e sucursais das principais empresas com jurisdição sobre a América Latina. “Ao mesmo tempo, a cidade é uma plataforma fundamental para as operações das empresas latino-americanas nos Estados Unidos” (Sassen, 1998: 107). Sua grande imigração cubana levou ao desenvolvimento de um complexo de comércio internacional orientado para a América Latina e Caribe, constituindo a hinterlândia de Miami.

 

Ao contrário das reduzidas atividades do Rio de Janeiro, às sedes e sucursais de bancos em Miami direciona-se grande fluxo de investimentos internacionais na América Latina promovendo o desenvolvimento de funções de cidade mundial e de grande número de postos de emprego qualificados. 

 

Assim, comparando o Rio de Janeiro com outras cidades classificadas como mundiais, percebe-se a desproporção dos mercados e da força econômica. Enquanto São Paulo[14] consolida-se como a cidade primacial do Brasil, a metrópole carioca ainda planeja uma estratégia de recuperação através de um projeto de requalificação e espetacularização.

 

Shachar (1983) nos lembra que a cidade mundial plena é aquela que se sustenta na vinculação de seis clusters: serviços de negócios de alto nível; demanda derivada no mercado imobiliário para construção e administração; turismo internacional; indústrias fundamentadas na alta tecnologia; oferta racional dos serviços governamentais; e uma parcela reduzida da população inserida no setor informal da economia. Analisando o Rio de Janeiro a partir de tais variáveis, afirmamos com segurança que apenas a dimensão turístico-cultural e um grande contingente populacional não são suficientes para posicionar uma cidade no topo da hierarquia urbana mundial, mas condições parciais para tal.

 

 

Considerações Finais

 

A Área Central é um local estratégico. Possui vantagens estruturais, já que preserva investimentos urbanos acumulados ao longo do tempo. Compreende o entroncamento das redes de transportes, pois é centralidade receptora de indivíduos produtores e consumidores.

 

Esses “investimentos” marcados no espaço[15] registram uma estrutura ímpar no espaço urbano carioca. Testemunham modos de acumulação capitalistas tidos como ultrapassados e não nos permitem que esqueçamos a mão pesada do Estado interventor.

 

Por isso, é de suma importância “vigiar” e analisar as propostas apresentadas pelo poder público. Preservar as formas pretéritas não significa deixar à mercê da ação do tempo, assim como requalificar deveria estar distante da substituição do conteúdo social. Políticas sérias de valorização da cultura carioca e para um planejamento mais justo se fazem presentes em um momento delicado como este.

 

Assim, deve-se incentivar as manifestações culturais com mais oportunidades de acesso a essas atividades na Zona Portuária. O objetivo é a valorização da rica história dos diversos grupos migracionais que fizeram do Porto um novo território.

 

Nesse sentido, a Zona Portuária possui necessidades muito mais prementes do que um museu internacional, receptor de consumidores turísticos e estéticos, totalmente desajustado àquela realidade. Segundo IBGE/ENCE (2002), mais da metade das mulheres daquele lugar não têm instrução. Investir no retorno à escola básica de qualidade é função da Prefeitura, integrando à cidade populações abandonadas, qualificando-as como cidadãs.

 

Por fim, ressalta-se a inter-relação do processo de requalificação da área portuária com uma tendência mundial de se formarem cidades-espetáculo. As metrópoles passam a se afirmar pela importância de seu complexo cultural e pelo potencial turístico, catalisador de moeda forte. Buscando integrar os bairros portuários à cidade, a Prefeitura enfatiza a fragmentação do espaço social urbano, subordinando aquele lugar à lógica do capitalismo contemporâneo.

 



Notas

 

[1] O processo espacial em destaque já recebeu diversas acepções, não havendo consenso entre os estudiosos. Aqui, o termo “requalificação” deverá ser compreendido como um tipo de intervenção urbana segmentada, voltada à ressignificação de uma imagem diante dos consumidores do espaço, objetivando agregar uma nova qualidade ao lugar a ser alterado através de políticas de reestruturação urbana. Nesta interpretação, podemos enquadrar os termos renovação, revitalização, reabilitação e refuncionalização. Os conceitos de gentrificação e elitização serão diferenciados e abordados a seguir.

 

[2] Segundo Corrêa (1995a, p.38), a Área Central é composta por dois setores: o núcleo central (CBD, Central Business District) e a zona periférica do Centro (local do cais e dos armazéns em cidades portuárias). Na Área Central “concentram-se as principais atividades comerciais, de serviços, da gestão pública e privada, e os terminais de transportes inter-regionais e intra-urbanos”.

 

[3] Segundo Arie Shachar (1983, p.75), “as ‘cidades mundiais’ seriam regiões urbanizadas em grande escala, os centros básicos de controle e acumulação do capital ao nível internacional. Responsáveis, assim, pelos investimentos capitalistas e pelo desempenho do sistema econômico mundial, elas teriam seu poder não mais como núcleos de produção – pois esta torna-se cada vez menos importante como veículo articulador do sistema, mas como veículo de articulação financeira, núcleos de pesquisa e desenvolvimento, ‘marketing’ e acumulação de capital”.

 

[4] Para um maior detalhamento do processo, ver Soja (1993) e Castells (1999).

 

[5] “Com o uso de contêineres no transporte marítimo, a partir de 1960, os velhos cais em linhas, com ou sem píeres, ficaram obsoletos e desocupados, passando a ser requisito técnico do transporte marítimo moderno uma ampla área de retroporto com profundidade suficiente para armazenar filas de contêineres e uma ligação direta à rodovia ou à ferrovia” (Barbuda & Escobar, 2002, p.7).

 

[6] “Boston, onde um profundo e prolongado processo de disciplinamento do trabalho, fechamento de fábricas e fuga do capital produziu as condições para uma recuperação econômica baseada, em grande parte, na rápida expansão dos setores de alta tecnologia e serviços” (Harrison apud Soja, 1993, p.249).

 

[7] O centro de gestão do território é “uma metrópole com numerosas sedes de grandes corporações com múltiplas localizações e o complexo conjunto de atividades associadas” (Corrêa, 1996, p.25).

 

[8] Urge uma revisão da setorização da Avenida Presidente Vargas (monumentalidade do Estado Novo). Seria conveniente abranger nesta tarefa, além da avenida e seu entorno, a Zona Portuária e integrar a avenida à dinâmica de requalificação.

 

[9] A cidade “destaca-se (...) pelo seu perfil terciário ou de serviços, que ocupa mais de 50% da população ativa, e pela disponibilidade de um mercado de recursos humanos qualificados para o desempenho de atividades vinculadas ao terciário avançado” (Cocco, 2001, p.87).

 

[10] “Definir investimentos públicos a partir da identificação de eixos visa a priorizar as obras e projetos capazes de carrear o maior número possível de investimentos privados” (Gazeta Mercantil apud Cocco, 2001, p.33).

 

[11] Segundo Barbuda & Escobar (2002, p.3), “a chamada Lei de Modernização dos Portos, lei 8.630 de 25/02/1993, apresenta como fator básico a concepção do programa de reestruturação da atividade portuária, no que se refere a sua desregulamentação, desestatização, descentralização e privatização”.

 

[12] É importante ressaltar que existem contextos distintos em cada caso de requalificação urbana. Barcelona, por exemplo, recebeu vultosos investimentos dos países da União Européia por inserir-se no projeto de adaptação/desenvolvimento da Catalunha e da Espanha, contando com os investimentos para os Jogos Olímpicos de 1992. Um caso similar é o da cidade de Atenas, capital da Grécia e sede das Olimpíadas de 2004, pronta para recolher os dividendos de seu esforço modernizador.

 

[13] O termo elitização permite a inclusão das classes médias e altas. Não é tão restritivo quanto o termo gentrification (em uma tradução literal, “aristocratização”). Segundo Garcia Herrera (2001, p.6), “la noción de elite alude al protagonismo de un grupo específico, privilegiado, con capacidad de influencia social, de liderazgo y de influir en la toma de decisiones”.

 

[14] The downtown section of New York City is deeply connected to the downtown section of Sao Paulo, much more than the downtown of Sao Paulo is to its own periphery (Sassen, 1996, p.5).

 

[15] As rugosidades são “formas herdadas do passado (...) [que] tiveram uma gênese vinculada a outros propósitos e permaneceram no presente” (Corrêa, 1995b, p.71). 

 

 

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Ficha bibliográfica:

FERREIRA, J. Políticas Espaciais de Requalificação Urbana na Área Central do Rio de Janeiro: Nova Estética da Desintegração Local e Espetáculo da Projeção Global. Scripta Nova. Revista electrónica de geografía y ciencias sociales. Barcelona: Universidad de Barcelona, 1 de agosto de 2005, vol. IX, núm. 194 (43). <http://www.ub.es/geocrit/sn/sn-194-43.htm> [ISSN: 1138-9788]

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