Scripta Nova
REVISTA ELECTRÓNICA DE GEOGRAFÍA Y CIENCIAS SOCIALES
Universidad de Barcelona.
ISSN: 1138-9788. Depósito Legal: B. 21.741-98
Vol. IX, núm. 194 (116), 1 de agosto de 2005



TURISMO E ESPAÇO: UMA LEITURA GEOGRÁFICA DA INTERFERÊNCIA DA ATIVIDADE TURÍSTICA NO PROCESSO DE (RE)ORGANIZAÇÃO SÓCIO-ESPACIAL DO MUNICÍPIO DE JOÃO PESSOA-PB

 

Xisto Serafim de Santana de Souza Júnior

Doutorando em Geografia. UNESP/ Presidente Prudente/ SP. Departamento de Pós-Graduação em Geografia.

E-mail: xtojunio@yahoo.com.br 

 

Profa. Dra. Claudemira Azevedo Ito

UNESP/ Presidente Prudente/ SP. Departamento de Pós-Graduação em Geografia.

E-mail: ito@prudente.unesp.br

 


 

Turismo e espaço: uma leitura geográfica da interferência da atividade turística no processo de (re)organização sócio-espacial do município de João Pessoa-PB (Resumo)

A década de 1970 trouxe para algumas capitais brasileiras alguns eventos que têm influenciado na sua organização espacial. Desses eventos, o turismo vem ganhando destaque por sua rápida assimilação pelas administrações públicas. O turismo tem produzido mudanças sócio-espaciais negativas, especialmente no que se refere a sustentabilidade dos espaços onde é implementado, produzindo fortes descontentamentos. A cidade de João Pessoa (PB), representa bem esta situação, se por um lado, as políticas públicas têm favorecido a manutenção de suas configurações paisagísticas, por outro têm dificultado a sua inserção no contexto do desenvolvimento do turismo regional. Além disso, o turismo tem ocorrido sem uma fundamentação científica, o que tem resultando em efeitos negativos, por exemplo, em fortes contendas, entre os atores sociais, quanto a  sua viabilidade.

 

Palabras-Chaves: Turismo; atores sociais; espaço; desenvolvimento


Tourism and space:  a geographic reading of the interference of the tourist activity in the process of (partner-space re)organização of the city of João Pessoa-PB (Abstract)

The decade of 1970 brought for some Brazilian capitals events that have influenced in their space organization.  Among these events, tourism has had prominence because ot its fast assimilation by the public administrations.  On the other hand, tourism has produced some negative social and space changes, especially as for sustentability of the spaces where it is implemented, leading to dissatisfactions. The city of João Pessoa (PB), represents well this situation.  The public politics have favored the preservation of its landscape configurations at the same time that has made it difficult its insertion in the regional context, especially for the tourism that, in the recent decades, has become one of the main alternatives of development for the cities of the northeast of Brazil. Moreover, its diffusion has occurred without a scientific basis, which it has been resulting in negative effects, such as strong disputes between the social actors, about its viability. 

 

Keywords: Tourism; social actors; space; development


 

Introdução

 

A Geografia, e mais precisamente os geógrafos, tem vivenciado, nestas últimas décadas, algumas inovações na perspectiva de abordagem do seu objeto de estudo: o espaço geográfico. Isto se deve, em parte, ao desenvolvimento de pesquisas nas áreas de saúde, meio ambiente, turismo, entre outras que, embora interfiram na organização e restruturação espacial, não despertavam o interesse do profissional de geografia.

 

Dessas novas “demandas” sócio-acadêmicas, o turismo tem recebido um certo destaque devido a sua proximidade com o objeto e os objetivos de estudo da geografia, especialmente no que se refere a dificuldade de se firmar e enquadrar-se a uma perspectiva única de investigação científica, fato que tradicionalmente tem causado fortes embates entre os geógrafos. Acrescenta-se a isto a existência de questionamentos quanto ao reconhecimento do turismo enquanto ciência ou se este corresponderia a mais uma atividade econômica que, dependendo do interesse e objetivos dos agentes que o promovem e dos atores que dão significado a sua existência, só serve para associa-lo enquanto atividade prática originada pelo desenvolvimento social. (Boullón, 2002).  Contendas à parte, o fato é que, desde sua difusão, em meados do século XIX, o turismo vem se apresentando, especialmente no Brasil, como a única das atividades econômicas modernas que literalmente atua consumindo espaços (Cruz, 2002).  Tal condicionante tem despertado o interesse dos geógrafos no que diz respeito a busca por resposta sobre as tendências e influências do turismo no processo da organização espacial.

 

Ao mesmo tempo em que a geografia tem procurado construir uma base sólida, que ratifique a necessidade de criação de vínculos com o turismo (Geografia do Turismo), as organizações sociais, especialmente as de espaços urbanos com potencialidades turísticas, tem buscado no turismo uma forma de inserção e desenvolvimento sócio-espacial o que tem influenciado nas transformações espaciais. Assim, os espaços vem sendo transformados pelo turismo sem o devido aporte científico, o que tem resultado em fortes embates relacionados a viabilidade dessa atividade enquanto alternativa de desenvolvimento. Por outro lado, espaços que fizeram a opção pelo não investimento em estruturas turísticas têm tido problemas com relação ao crescimento econômico e com o próprio desenvolvimento espacial, a exemplo de João Pessoa (PB) que só agora tem tentado reaver o “tempo perdido”.

 

Tais aspectos nos despertam algumas inquietações: Que elemento(s) poderia(m) propiciar a ligação definitiva entre turismo e geografia? Os critérios de investigação geográfica são suficientes para fornecer o aporte necessário a compreensão das causas e conseqüências produzidas pela prática da atividade turística? Quais as transformações espaciais produzidas pela inclusão do turismo como alternativa de desenvolvimento? Quais os principais embates criados entre os atores sociais envolvidos com a inclusão do turismo na organização espacial?

 

É com a perspectiva de traçar caminhos que propiciem a obtenção de respostas a tais questionamentos que apresentamos este artigo. Para isso iniciaremos com um breve resgate da base teórica tendo com objetivo situar o turismo dentro da evolução do pensamento geográfico. A nossa proposta não é a de fazermos um resgate sistemático da fundamentação científica aplicada ao turismo e nem muito menos evidenciarmos os acontecimentos enquadrando-os as categorias geográficas. A idéia é mostrarmos que a fundamentação do saber geográfico (enquanto abstração da realidade) esteve sempre vinculado aos acontecimentos espaciais, entre os quais o turismo, no sentido de elucida-los. Em seguida, tomando como exemplo a cidade de João Pessoa frente a difusão da atividade turística no Nordeste, buscaremos analisar quais os principais embates criados por parte dos atores sociais que trabalham direta ou indiretamente com a especialização do turismo.

 

 

Turismo e Espaço: do consumo a transformação

 

Se fazermos um resgate sobre a “geohistória” do turismo perceberemos que o seu desenvolvimento é mais antigo do que a origem do próprio termo. O mesmo pode-se afirmar quanto ao seu significado, o qual foi difundido na Inglaterra do século XVIII com o emprego do termo “tur” para explicar “volta, retorno”1. De fato, as viagens produzidas para contemplação dos primeiros jogos Olímpicos (776 a.C); as construções de estradas pelo Império Romano nos séculos II a.C a II d.C  que facilitaram as viagens (Seabra, 2003); as peregrinações dos romeiros para Jerusalém; entre tantos outros acontecimentos anteriores, serviram de base para a associação do turismo ou do turista como indivíduo ou grupo que viaja. Todas são evidências da origem do turismo enquanto a descoberta de coisas ou construção de objetos e  ações estando sempre relacionado a lazer e ao deslocamento.

 

A difusão da atividade turística, no entanto, só ocorreu de fato graças ao desenvolvimento tecnológico do século XIX (máquina a vapor, trem com vagão leito, etc) e século XX (desenvolvimento dos setores de transporte e comunicação). Adiciona-se a isto a busca pelo ócio (Cruz, 2002) e a descoberta das paisagens litorâneas como espaço optimun ao descanso e fuga do stress produzido pelas rotinas diárias. Contudo, se de um lado o turismo propiciou o desenvolvimento dos locais onde foi estabelecido; por outro, sua implementação resultou em fortes alterações no meio ambiente devido a exaustão do uso dos espaços selecionados e a preocupação “tardia” com o equilíbrio ambiental2, além dos embates criados entre os espaços de inclusão e os espaços de exclusão. Isto levou o poder público a tomar a dianteira no que se refere a criação de políticas públicas destinadas ao controle da implementação das atividades turísticas em espaços predefinidos. Desta forma, o turismo deixa de ser algo produto da “contingência”, se transformando em uma forte “arma” de reordenamento espacial.

 

Contudo, o que seria realmente o turismo? Até que ponto esta atividade interfere na dinâmica do espaço geográfico? Os caminhos para obtenção das respostas a esses questionamentos parecem estar centrados na visualização da atividade pela perspectiva científica –, nesse caso, que ciência poderia assumir a responsabilidade de analisar a interferência da atividade turística no consumo dos espaços?

 

Oliveira (2001:36), fazendo uma adaptação ao conceito de turismo desenvolvido pela Organização Mundial de Turismo, define este como um “conjunto de resultados de caráter econômico, financeiro, político, social e cultural, produzidos numa localidade, decorrentes da presença temporária de pessoas que se deslocam do seu local habitual de residência para outros, de forma espontânea e sem fins lucrativo”. Citando Mcintosh, Oliveira (2001:39) associa ainda o turismo como sendo uma “ciência, arte e atividade capaz de atrair, transportar e alojar visitantes, com o objetivo de satisfazer suas necessidades e a seus desejos”. Tanto a primeira como a segunda concepção tem alguns equívocos implícitos.

 

Na primeira concepção a questão da relação espaço-tempo é desconsiderada ao se valorizar o espaço e o tempo como duas coisas distintas3. O turismo não pode estar limitado a um resultado econômico, financeiro, político, social e cultural. É também isso, mas, principalmente, é reflexo temporal dessas influências em um determinado espaço com escalas hierárquicas diferenciadas porém indissociáveis, assimiladas por um observador. Nesse contexto, Pires (2002:162), compreende a paisagem como um elemento essencial para o turismo: “Se a razão de ser do turismo (...) é o deslocamento ou movimento voluntário das pessoas de um lugar para outro no espaço, então o turismo pode ser concebido como uma experiência geográfica na qual a paisagem se constitui como elemento essencial”. Avançando um pouco mais nessa perspectiva Rodrigues (1997) utiliza o termo espaço turístico para identificar a influência desta atividade no consumo do espaço uma vez que seus elementos são dotados de territorialidades e intencionalidades. Completa ainda ratificando a importância do estudo da paisagem ao enquadra-la como um recurso extraordinário sendo importante a análise da imagem (percepção) que esta produz no observador e como este interfere em sua dinâmica.

 

Um outro equívoco está relacionado a classificação do turismo enquanto ciência uma vez que este não se desenvolveu em meio a idéias conexas, resultantes de uma explicação sobre uma dada realidade. Ao contrário, o turismo tem-se apropriado das idéias desenvolvidas por outros ramos do conhecimento científico como a geografia, a economia, a antropologia, entre outras. Nessa perspectiva, Boullón (2002:19) menciona que “o turismo não nasceu de uma teoria, mas de uma realidade que surgiu espontaneamente, e foi se configurando sob o impacto de descobertas em outros campos, como, entre outras coisas, o progresso da navegação e a invenção da ferrovia, do automóvel e do avião”. Desta forma, como não surgiu enquanto produto de teorias o mais pertinente seria enquadra-lo no campo de estudo de outras ciências que tenham como ponto convergente o fornecimento de hipóteses que expliquem os fatos que levam ao desenvolvimento do turismo ou suas influências na organização espacial. Nesse contexto, a geografia seria uma importante via de acesso tendo em vista os seus objetivos de estudo. Conceitos como paisagem, região, espaço e território, tradicionalmente desmistificados pela Geografia, podem fornecer importantes subsídios a interpretação espacial e configuração territorial produzida pelo turismo.

 

De fato, se fizermos um resgate sobre a produção geográfica, desde o período pós-sistematização científica (séc. XIX), poderemos evidenciar que, assim como ocorre com outros fatores responsáveis pela relação sócioespacial, o turismo tem seu desenvolvimento em harmonia com a investigação científica, fato que pode justificar a pertinência de estudá-lo segundo o viés geográfico4

 

Isto é facilmente observado quando nos reportamos a produção de geógrafos da Geografia Tradicional, como Humboldt e Ritter que, apoiados na visão positivista, estipularam os conceitos de paisagem e região (natural e transformada) como forma de explicação da relação do homem com a natureza e a associação desta através de representações de paisagens cuja totalidade evocava a união dos elementos naturais (Gomes, 1997) como fator determinante da configuração espacial. Por outro lado, os geógrafos regionalistas pertencentes a essa mesma escola entenderam a classificação das regiões como o produto final da relação do homem com a natureza, dando base para a definição de zonas com características paisagísticas similares – definidas pelos elementos da natureza - com ênfase especial ao fator cultural, ou seja, a importância da marca deixada pelo homem sobre a natureza, transformando-a segundo seus interesses.

 

O turismo se adapta bem a esse contexto ao valorizar as “belezas paradisíacas” produzidas pela natureza, especialmente em regiões pouco habitadas e de difícil acesso (Oliveira, 2001). Com a influência de “agentes patrocinadores”, não demorou muito para que a atividade turística se utilizasse, indiretamente, do aporte descritivo fornecido pela geografia ao optar pela seleção de espaços destinados ao seu desenvolvimento. Tais espaços passaram a ser não apenas os que compreendiam os cenários naturais, mas também as grandes construções e monumentos arquitetônicos históricos. São, assim, criados roteiros onde os diversos conjuntos arquitetônicos adquirem importância semelhante a dos ambientes naturais uma vez que ambos são produtos de uma temporalidade, como é o caso da “exploração” das ruínas de civilizações antigas (Maia; Inca; Egípcia; etc). Adiciona-se a isto a profissionalização das atividades e a crescente exigência dos visitantes que refletiram na necessidade de mudança também dos aspectos fisionômicos dos centros urbanos, especialmente no que se refere a infra-estrutura (transporte, hospedagem, alimentação, etc) e equipamentos (objetos criados e/ ou adaptados para o turismo, como é o caso do trem com leito e do navio a vapor) (Oliveira, 2001) Isso resulta na criação das primeiras zonas ou paisagens planejadas para o desenvolvimento da atividade turística5.

 

Novamente a produção geográfica se torna fundamental para explicação dessas novas relações sócioespaciais produzidas pelo turismo. O conceito de região assim como o de território, enquanto delimitação de áreas, passam a ser utilizados na análise das organizações espaciais. Para isso, a geografia, da segunda metade do século XX, busca nos modelos sistêmicos – como por exemplo o das localidades centrais, de W. Christaller –, o embasamento para a análise das funcionalidades definidas para o espaço e dos elementos responsáveis por sua produção. Tal fator coincide com as descobertas das praias como ambiente de lazer, especialmente por parte dos europeus que, no período de férias e fugindo do rigor do inverno, rumaram em direção as orlas marítimas da região intertropical (Oliveira, 2001). Isto foi ainda mais acentuado com a criação de  empreendimentos e roteiros destinados exclusivamente para a atividade turística. Assim, o turismo passa a ser também enquadrado como um sistema cuja dinâmica encontra-se relacionada ao diálogo oferta e demanda. Novamente existe uma valorização da paisagem, estipulada como potencialidade devido ao seu caráter estético produzido pelo arranjo e interdependência de seus elementos6.

 

Nesse contexto, os ecossistemas costeiros se tornaram os condicionantes paisagísticos mais valorizados pelos visitantes e, evidentemente, pelos agentes de turismo. Em contraposição, com o objetivo de se adaptar a esta nova conjuntura, os espaços urbanos, especialmente os das capitais litorâneas, são reconstruídos através da implementação de novos equipamentos e infra-estruturas que, direta ou indiretamente, são criados para o atendimento das novas demandas espaciais “impostas” pela atividade turística. Em uma outra escala, as localidades rurais (interioranas), com todos os seus atributos geofísicos, começavam a despontar como um outro atrativo turístico ao fornecer uma possibilidade de fuga ao stress urbano cada vez mais presente e sufocante .

 

Dessa forma, o sistema turístico e a rede onde este se encontra sitiado é produto da relação entre os pólos de atração e os espaços satélites cujos atrativos passam a dar sentido ao espaço turístico confabulando para a criação de espaços hierárquicos para o desenvolvimento do turismo (Barros, 1998; Barros, 2002). Entre os aspectos que passam a ser relevantes para o desenvolvimento do sistema turístico, destacam-se os elementos arquitetônicos de valor histórico, estimulando vários centros urbanos a investirem na construção de infra-estrutura para “exploração” do turismo cultural. Com o estabelecimento de vários pontos de atração e difusão são criadas as primeiras redes turísticas, ou seja, o turismo passa a não privilegiar o fixo, mas os roteiros, contribuindo para uma maior divulgação das regiões que investiram na atividade turística.

 

A partir da década de 1970, o crescimento urbano e o agravamento dos embates sociais, especialmente sobre o futuro da natureza, produzem toda uma mudança na forma de compreender a relação homem-natureza. Na geografia o reflexo disso é representado pelas críticas aos modelos anteriores de explicação da dinâmica espacial os quais, de um lado, são provenientes das produções de geógrafos adeptos ao materialismo histórico e dialético que tem na relação sócioespacial o seu principal viés de análise e; por outro lado a contribuição dos geógrafos fenomenologistas mais preocupados em analisar a reprodução dos espaços a partir da interferência da cultura da sociedade e do seu grau de subjetividade. Isso encontra-se bem refletido nos encaminhamentos estipulados para o desenvolvimento da atividade turística que passou a valorizar tanto os aspectos naturais e artificiais produzidos ao longo da história, frutos da influência dos mais diferentes atores sociais, como a própria impressão que as configurações paisagísticas deixam no imaginário do indivíduo – lembranças ou desejos de visitação. A atividade turística é, assim, de um lado valorizada como atividade consumidora de espaços (Cruz,2002) e por outro se apresenta como produto também de ações dos mais diferentes atores sociais através de suas práticas ou intencionalidades.

 

A primeira perspectiva é valorizada pelos geógrafos marxistas que se preocupam em analisar os impactos produzidos pela atividade turística na (re)organização espacial. Os objetos e as ações ganham uma relevância na abordagem. Além disso, os atores sociais se tornam objetos de investigação uma vez que suas ações passam a ser determinantes do processo de organização espacial pela atividade turística e pelos embates por ela produzidos. Já a segunda perspectiva, a dos fenomenologistas, busca analisar as produções dos espaços turísticos segundo as representações dos indivíduos que reproduzem, com apoio do imaginário, ambientes de aproveitamento turístico onde a paisagem seria “o concreto e característico produto da complexa interação entre uma determinada comunidade humana com suas preferências e potenciais culturais, e um quadro de circunstâncias naturais” (Wagner & Mikessel, 1962 Op. Cit. Barros,1998: 4). Neste caso, a relevância maior não está direcionada a observância dos conflitos, mas a importância da influência dos atores sociais, a partir de suas representações, criação e recriação de espaços estrategicamente delimitados para o desenvolvimento do turismo.

 

Além das divergências de ordem conceitual e teórica, teríamos o tradicional equívoco relacionado ao enquadramento do turismo ao setor econômico. É comum identificarmos nas mais diversas produções bibliográficas a associação do turismo ao segundo setor da economia: construção ou indústria. No caso da associação ao setor da construção não existe dificuldade em identificarmos a falibilidade desta associação tendo em vista que o turismo não constrói nada, apenas fornece uma função a um objeto construído. Já no caso da indústria o que nos preocupa é o vínculo literal do turismo como integrante desse setor. Desde sua origem o turismo surge como sinônimo de serviço, especialmente os relacionados ao fornecimento do lazer. Assim, sua classificação como indústria se torna questionável, especialmente se levarmos em consideração o fato da existência de várias formas de se fazer turismo (turismo ecológico, ecoturismo, turismo aventura, etc), as quais nem sempre  produzem mudanças espaciais. 

 

A indústria, como conhecemos, corresponde ao setor econômico destinado a transformação de matéria-prima em produtos finais ou intermediários. O turismo não é um produto final e nem muito menos intermediário. Conforme menciona Boullón (2002) não existe uma indústria do lazer ou do tempo livre, o que nos leva a dedução de que essas atividades não podem estar associadas como “industria do turismo” uma vez que nem todos que têm tempo livre ou praticam atividades de lazer estão produzindo ou são produto do turismo. Os próprios equipamentos utilizados por aqueles envolvidos com o turismo são produtos industriais criados para tornar mais fácil e confortável o “fazer turismo”. Isto se torna ainda mais grave quando o termo é associado a um agrupamento de restaurantes, agências de viagens, redes de hospedagem como indústrias do turismo (indústria dos restaurantes; das agências de viagens e; das redes de hospedagem, respectivamente). Tais elementos correspondem a setor de serviços e tem no turismo um importante campo de ação.

 

De acordo com o quadro de referências apresentado o turismo corresponderia a uma atividade econômica responsável pelo consumo do espaço estando sua implementação diretamente relacionada a existência de um espaço de atração, com os devidos elementos espaciais presentes, e um sujeito disposto a desfrutar das potencialidades desse espaço. Nesse contexto, o papel da geografia se torna muito importante tendo em vista a influência dessa atividade com o seu objeto de estudo (o espaço geográfico) e com as relações presentes entre os atores sociais responsáveis pela existência dessa atividade.

 

Diante do exposto, os conceitos de espaço e território seriam os principais meios de inserção ao estudo científico dessa atividade: o primeiro por conter todas as possibilidades de relações entre os atores (sistemas de objetos e sistemas de ações direcionados a explicação das mudanças espaciais produzidas pelo turismo), assim como as percepções desses com as paisagens dos locais visitados; e o segundo por ser o principal significado do chamado fazer turismo ao possibilitar a identificação das estratégias e táticas dos atores sociais no que se refere a interferência histórica dessa atividade no consumo do espaço, abarcando com isso desde a explicação da existência das zonas turísticas até a evidência das redes que interligam os espaços turísticos. A atividade turística, ou o “fazer turismo”, se relacionaria, assim, a uma forma de consumo e produção do espaço cujo reflexo está relacionado aos aspectos sócio-econômicos em seu reflexo no meio ambiente.

 

Outrossim, ao analisarmos a  produção e consumo do espaço pela atividade turística a teoria se sobrepõe a prática uma vez que uma se torna dependente da outra. O resultado disso seria a concepção de paisagem ou de configurações paisagísticas enquanto aspectos fisionômicos de um espaço influenciado pelo turismo tanto no que se refere aos conflitos sócioespaciais produzidos pelos atores sociais como no que diz respeito as representações inerentes destes ao longo de um período de ocupação.

 

 

O turismo e a (re)produção do espaço: o município de João Pessoa/PB em contexto

 

A atividade turística no Brasil teve sua ascensão a partir da década de 1970 quando os grandes centros urbanos resolveram investir em políticas públicas que propiciassem o desenvolvimento sócio-econômico dos seus espaços. A inclusão e difusão do modelo capitalista fizeram com que os governantes investissem cada vez mais em programas de infra-estrutura e alocação de equipamentos voltados para a dinamização econômica de seus centros administrativos. Dos diversos empreendimentos criados, o turismo ganha um destaque progressivo ao se tornar um elemento estratégico ao desenvolvimento e organização espacial, especialmente para os centros urbanos que dispunham dos condicionantes (físico-naturais e sócio-culturais) básicos para o desenvolvimento desta atividade, com exceção da infra-estrutura que passa a ser montada paulatinamente a medida em que o turismo vai fornecendo novas dinamizações ao espaço onde é implementado.

 

Os fatores que motivaram tais mudanças são, no entanto, de natureza externa e interna. A primeira é decorrente dos novos processos produzidos na economia mundial: a globalização (abertura de mercados), a reestruturação produtiva (desenvolvimento de novas tecnologias e meios de produção) e o neoliberalismo (minimização da participação do Estado no mercado) (Leubauspin, 2000), os quais passam a interferir diretamente na escala estadual e municipal; Já o segundo, de origem interna, se destaca através da autonomia administrativa decorrente da (re)democratização do país na década de 1980 – os municípios deixam de ser obrigados a submeter-se ao modelo centralizador importo pelo governo Federal durante praticamente 30 anos –, e a conseqüente participação mais ativa do empreendedores privados e da própria sociedade civil organizada que passaram a influenciar de forma mais significativa no processo de seleção das políticas públicas de desenvolvimento (Araújo, 2000).

 

Associando este raciocínio ao advento do turismo estaríamos identificando que um dos principais elementos que comandam sua origem e difusão – a infra-estrutura – está relacionado a interferência de duas escalas cuja as ações são tanto convergentes como divergentes: a escala exterior – corpo da superestrutura, representada pela administração pública e setor privado, responsáveis pela seleção dos espaços e difusão das atividade; e a inferior – tipos de investimentos em infra-estrutura turística que propiciam toda as dinâmicas e relações espaciais no desenvolvimento do turismo (Boullón, 2002).

 

Concomitante a esses  acontecimentos, ocorre a difusão do turismo de massa e a valorização das orlas marítimas como principais opções de lazer. As administrações municipais, em sua maioria, passam a fazer fortes investimentos em obras de infra-estrutura (rodovias, aeroportos, obras de restauração, etc) e estímulo a difusão de equipamentos urbanos (hotéis, pousadas, restaurantes, etc), elementos indispensáveis a atração do turista. Embora isto tenha se desenvolvido em praticamente todas as capitais, foi no Nordeste em que tais investimentos se apresentaram como elementos-chave no processo de reorganização espacial, embora não de forma homogênea.

 

O  fato é que a difusão do turismo no Nordeste brasileiro não ocorreu por acaso. De um lado, foi nesta região que os agentes de turismo encontraram a combinação então predominante na escala mundial: a tríade sol, praia e mar. Por outro lado, foi com estímulo ao desenvolvimento desta atividade que o governo Federal pode “amenizar” a má impressão deixada com a ineficiência da SUDENE (Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste)7 através da valorização das propriedades físico-naturais desta região (morfológica e climática)8 adequada ao modelo de internacionalização ou de massificação do turismo (Cruz, 2002). A paisagem natural se torna, assim, o principal elemento na seleção dos espaços destinados ao desenvolvimento da atividade turística.

 

Para viabilizar o desenvolvimento do turismo nas orlas marítimas da região nordeste, o governo Federal criou, no final da década de 1970, dois programas: o PRODETUR – Programa de ação para o Desenvolvimento do Turismo no Nordeste – que tinha por objetivo o investimento em infra-estrutura para áreas estipuladas como espaços-potenciais9 a atividade turística – e a política de MEGAPROJETOS10 – que visava a urbanização turística de trechos da orla marítima viável ao aproveitamento turístico. Tais programas foram complementados durante a década de 1990 com a criação do PLANTUR - Plano Nacional de Turismo – cujo objetivo estava centrado na criação de pólos-turísticos. Tais pólos foram concebidos enquanto premissa de que a concentração e seleção de espaços turísticos levariam a uma difusão e aceitabilidade desta atividade bem como um conseqüente retorno sócio-econômico (Cruz, 2002). Como exemplo disto teríamos dois Pólos turísticos desenvolvidos no Recife: o Pólo Pina e o Recife antigo (Souza Júnior, 2001). Contudo, ao contrário da valorização da paisagem natural, nesta nova proposta evidenciou-se a valorização dos elementos culturais e humanizados criados para servir prioritariamente a prática do turismo. Isto só foi possível em decorrência da ação pública em infra-estrutura urbana e no estímulo aos investimentos em equipamentos urbanos por parte das empresas privadas.

 

Contudo, os programas desenvolvidos não foram eficientemente aplicados em todas as capitais o que gerou fortes tensões no que se refere a locação de recursos destinados ao desenvolvimento e estímulos a atividade – especialmente no que diz respeito aos entraves políticos produzidos entre os governantes dos diversos estados da região. Isto é bem evidenciado em João Pessoa, capital da Paraíba, que embora tenha sido um dos espaços selecionados para implementação do megaprojeto (Cabo Branco) este, após ter tido a implementação de toda a infra-estrutura básica, foi deixado de lado retornando apenas ao debate no cenário político nesses últimos anos, fato que não ocorreu nas capitais dos estados vizinhos a exemplo do projeto Costa Dourada em Pernambuco e o projeto Parque das dunas Via-costeira, em Natal.

 

Se analisarmos o histórico do investimento turístico na porção oriental do litoral nordestino, tomando como exemplo de caso as capitais Natal (RN), João Pessoa (PB) e Recife (PE) poderíamos visualizar as divergências paisagísticas criadas pelo turismo. João Pessoa encontra-se localizada entre Recife e Natal. Essas três capitais constituem um dos eixos mais dinâmicos da porção oriental no nordeste brasileiro, especialmente no que se refere a economia e as potencialidades de desenvolvimento sócioespacial. Contudo, elas são muito diferentes. Enquanto as áreas metropolitanas de Natal e Recife fizeram, nestas últimas três décadas, fortes investimentos na criação de infra-estrutura para implementação da atividade turística, João Pessoa investiu pouco. O resultado disso é que, diferente do que ocorreu em Recife e em Natal, se de um lado houve favorecimento a manutenção dos seus aportes paisagísticos naturais; por outro obteve investimentos inferior aos obtidos por Recife e Natal que já dispõem de uma área turística composta por um ou mais centros turísticos o que dificulta a inserção concreta do município no roteiro turístico do Nordeste oriental. Apenas recentemente é que se tem evidenciado ações (por partes do governo municipal, estadual e empresas privadas) voltadas para reverter a situação mencionada.

 

Desta forma, se de um lado o “acordar tardio” de João Pessoa produziu perdas consideráveis, especialmente as de ordem econômica; por outro lado este município pode contar com um fator diferencial: a manutenção dos seus potenciais paisagísticos os quais, se bem trabalhados, podem produzir o arranque definitivo do município como referencial turístico para a região Nordeste. Contudo, as divergências entre os atores sociais e a própria distância que separa o município em relação as áreas turísticas vizinhas já edificadas assim como a disputa com outros atrativos turísticos que emergiram nos últimos anos (turismo rural; aventura; ecoturismo; etc) se apresentam como obstáculos a esse  processo de implementação da área turística de João Pessoa, basta lembrarmos que no momento em que os empreendimentos turísticos foram criados em Recife e Natal as representações sociais (ONG´s, Organizações comunitárias, etc) ainda estavam em estágio inicial de consolidação não existindo, assim, grandes embates sobre a elaboração de espaços turísticos. Já em João Pessoa, esse quadro se apresenta bem diferente tendo em vista a coesão em que se encontram alguns importantes setores da sociedade civil e o desenvolvimento das políticas ambientais  que tem sido usada como instrumento de retenção ao uso das potencialidades paisagísticas, especialmente pelos movimentos ambientalistas.

 

O fato é que a cidade de João Pessoa, no que se refere ao turismo, possui algumas qualidades que se apresentam como fator diferencial se relacionadas as de outras capitais, como Recife e Natal. Esta diferença se inicia a partir do próprio processo de urbanização. A existência de muitas barreiras litorâneas fez com que o acesso ao continente fosse realizado apenas pelo estuário do rio Sanhauá (Mello, 1987). Foi nas margens desse rio, a partir do porto (porto do Capim)11 que a cidade nasceu e se difundiu (Rodriguez, 1992), deixando preservada toda a área litorânea. A proteção litorânea foi mantida devido ao surgimento de várias leis de preservação ambiental e inibição a criação de edificações de grande porte. Isto fez com que João Pessoa tivesse condições de manter preservado o seus condicionantes paisagísticos – fato não evidenciado em outros municípios. Assim, contrariando a tendência evidenciada em outras capitais, a cidade de João Pessoa possui um acervo paisagístico ainda pouco urbanizado a exemplo das praias do litoral norte (município de Lucena) e do litoral sul (município do Conde), além das praias de Cabo Branco e Tambaú, localizadas no próprio município.

 

Contudo, se de um lado a legislação urbana acabou resultando em benefícios para a cidade, por outro os seu desenvolvimento fez com que a cidade fosse praticamente negligenciada nos investimentos no setor de turismo. O Megaprojeto Cabo Branco ficou limitado a montagem da infra-estrutura básica, não existindo ações ou investimentos que tornassem viável a sua dinamização. Nesse contexto, a dialética está centrada entre reaver o tempo perdido no que se refere a inserção da cidade como espaço da zona turística do nordeste oriental e, ao mesmo tempo, promover medidas de preservação dos seus condicionantes paisagísticos que acabaram por se tornar a identidade da cidade. Seria isso possível?

 

A resposta para essa questão depende do interesse do poder público e  da participação de outros atores sociais na organização de planos e estratégias para o desenvolvimento e difusão da atividade turística em João Pessoa e sua conseqüente inserção na zona turística do nordeste oriental. Como vimos anteriormente, João Pessoa conta com os requisitos básicos para tornasse um importante espaço turístico: um ambiente paisagístico diferente dos encontrados em outras capitais no que se refere a preservação. Além disso, a infra-estrutura criada para o desenvolvimento do megaprojeto Cabo Branco, no início da década de 1990, pode ser utilizada como justificativa a atração de investimentos por parte dos agentes que trabalham com o turismo, ficando as demandas maiores para a revitalização das infra-estruturas urbanas necessárias a viabilização do Pólo Cabo Brando, como é o caso de obras em saneamento ambiental e montagem de equipamentos urbanos.

 

Contudo, o longo período de ausência de uma política pública eficiente no processo de dinamização desse espaço para o desenvolvimento da atividade turística se apresenta como um agravante a implementação desta atividade. Os principais atrativos turísticos estão em locais pouco acessíveis e sem uma estrutura que possibilite uma rápida conexão entre ambos. Esta desarticulação entre a cidade de João Pessoa e esses pólos turísticos tem sido um dos principais problemas para o desenvolvimento do turismo e conseqüente inserção da cidade enquanto um espaço de referência na criação da zona turística do nordeste oriental. A situação se torna ainda mais agravante se levarmos em consideração a inexistência de um diálogo entre os atores sociais no sentido de criar uma proposta de dinamização do espaço turístico de João Pessoa sem perda da qualidade do seu meio ambiente e da herança cultural.

 

Embora tais deficiências sejam evidenciadas, o fato de possuir áreas turísticas sitiadas nas cidades vizinhas que podem ser utilizadas como pontos na montagem da rede turística e, conseqüentemente, na criação de um sistema turístico bastante promissor onde a capital seria a área core e  os municípios próximos os pontos-satélites, contribuindo para a organização do espaço turístico da grande João Pessoa, são fundamentos que justificam a necessidade de observar as possíveis transformações espaciais que podem ser produzidas com a criação desse espaço. Identificar as potencialidades e analisar as intencionalidades dos atores sociais no processo de construção e (re)construção do sistema turístico de João Pessoa seria, assim, a melhor forma de se analisar as conseqüências sócio-espaciais do turismo na organização do espaço urbano de João Pessoa.

 

Exemplos como os de Recife (PE) e Natal (RN) ratificam bem a necessidade de se pensar em medidas para se evitar transformações negativas do espaço. Isso se deve a decadência do setor de saneamento básico e falta de ações em infra-estrutura urbana. Os primeiros passos já estão sendo dados tanto por parte do poder público federal e estadual ao investirem na restauração de infra-estrutura básica como o aeroporto, realizada no final de 2004, e duplicação de avenidas e  rodovias federais; como por parte das administrações públicas dos municípios que compõem a grande João Pessoa como é o caso da criação de resorts, recapeamento e, principalmente, com a reativação do Megaprojeto Cabo Branco. Por outro lado, as empresas privadas e a sociedade civil organizada têm demonstrado interesses em investir e debater sobre ações de melhoria do espaço turístico de João Pessoa. Tal evidência já se apresenta como um elemento importante para o desenvolvimento sustentável do espaço turístico de  João Pessoa. 

 

Nesse contexto, a Geografia pode fornecer um importante subsídio tendo em vista o compromisso desta com o estudo das organizações espaciais. Os conceitos de paisagem, território e região se apresentam como elementos-chave no estudo do espaço pela atividade turística. Tais critérios de análise, no entanto, não podem ser concebidos com existência em si. O turismo é uma atividade social e econômica e como tal é objeto de estudo de outras ciências sociais. Assim, o desafio é tentar delimitar as estratégias e táticas que remetam a um diálogo não apenas horizontal entre as ciências, mas também vertical no sentido da sobreposição das concepções sobre a análise da dinâmica do espaço turístico. Esta visão multidisciplinar, por sua vez, tem que ser conduzida levando-se em consideração as possíveis transformações espaciais e a identificação de instrumentos que ao mesmo tempo possibilitem o desenvolvimento sócioespacial de João Pessoa.

 

 

Concluindo

 

Conforme observado, a relação turismo e espaço é influenciada pelas mudanças produzidas nas organizações espaciais uma vez que esta cria distorções verticais e horizontais na configuração dos espaços onde é implementada cuja marca chega as vezes a superar as temporalidades dos eventos em questão. A atividade turística se apresenta como um importante agente reorganizador das configurações espaciais ao criar núcleos de inclusão e núcleos de exclusão.

 

Isto pode ser observado se levarmos em consideração que se de um lado a implementação da atividade turística no consumo do espaço resulta na dinamização sócio-espacial; por outro, produz fortes embates intra-regional uma vez que não ocorre de forma homogênea resultando em fortes divergências espaciais e embates sociais. Essa relação entre espaços de inclusão e espaços de exclusão se apresenta igualmente contraditória, como foi observado em João Pessoa no que se refere a inserção da atividade turística: se apresentando como espaço de exclusão, o que favoreceu na preservação do seu aporte paisagístico (natural e cultural). Contudo, a falta de investimentos em infra-estrutura para o turismo e estímulo a implementação de equipamentos urbanos que facilitem o desenvolvimento dessa atividade têm propiciado sérios problemas no que se refere a inclusão definitiva da cidade na zona turística do litoral oriental brasileiro. Para saber se este aspecto é  positivo ou negativo, se faz necessário um estudo mais aprofundado.

 

Por outro lado, novamente verifica-se o equívoco que vem acompanhando o turismo ao longo do processo de sua difusão: sua análise faz parte dos objetivos finais de sua implementação, ou seja, não é fruto de um arcabouço teórico que seja capaz de analisar as conseqüências sócioespaciais dessa atividade segundo uma perspectiva científica. Cabe  a Geografia o fornecimento do aporte teórico que ratifique a importância do turismo para o desenvolvimento sócioespacial e a articulação dos referenciais metodológicos necessários a redução dos impactos dessa atividade no contexto espacial.

 

 

Notas



1 Oliveira (2001) aponta que a origem do termo pode estar relacionada a denominação “tur” do hebreu antigo que significa “viagem de descoberta, de exploração, de reconhecimento”.

2 De acordo com Seabra (2003) a preocupação com os danos ambientais produzidos pela atividade turística só ocorre na década de 1990 com os ambientalistas que propõem a substituição do turismo de massa pelo ecoturismo.

3 Santos (1997) vai mais além ao alertar para a necessidade de indissociarmos os termos espaço e tempo para não cairmos nos erros que limitam a interpretação de um com a ausência do outro.

4 Não queremos com isso negar a importância do estudo do turismo por parte de outras ciências sociais. Cada uma tem seu objeto e objetivo de análise e pode fornecer substanciais contribuições acerca da compreensão da dinâmica turística. O que estamos advogando é que a Geografia se apresenta como a melhor opção quando o assunto está relacionado a investigação da relação sócio-espacial nas mudanças espaciais.

5 As referências sobre o(s) tipo(s) de paisagem(ens) são, predominantemente, os modelos emergentes no mundo ocidental. No oriente, por exemplo, os templos e os jardins, em suas variedades, já eram motivos de visitação turística antes mesmo do turismo aparecer como atividade consolidada no campo da economia.

6 A importância da paisagem é destacada por vários autores. Um destes é Maria de Bolós y Capdevila que cogita a possibilidade da existência de uma Ciência da Paisagem que tem no geossistema o modelo ideal para compreensão dos fatores responsáveis por sua diversidade (Bolós y Capdevila, 1992).

7 Embora a SUDENE tenha feito fortes investimentos na Região ela não conseguiu atingir os objetivos que fundamentaram sua criação. Nesse contexto, os investimentos no setor de turismo emerge como forma de minimizar esta deficiência (Cruz, 2002).

8 Existe, no entanto, uma outra perspectiva nesta argumentação uma vez que ao valorizar os condicionantes naturais das áreas litorâneas, o semi-árido foi praticamente excluído das propostas para o desenvolvimento do turismo o que produziu fortes contrastes sócio-econômicos entre o litoral e o sertão.

9 Termo utilizado por Boullón (2002) para se referir a espaços aptos ao desenvolvimento da atividade turística.

10 De acordo com Cruz (2002) os megaprojetos são: Projeto Parque das Dunas-Via-Costeira, Natal (RN); Cabo Branco, João Pessoa (PB); Costa Dourada, litoral sul de Pernambuco e norte de Alagoas; e Linha Verde, litoral norte da Bahia.

11 Denominação popular dada ao porto do Viradouro, era o ponto principal da cidade de João Pessoa antes da fundação do Porto de Cabedelo.

 

 

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© Copyright Xisto Serafim de Santana de Souza Júnior y Claudemira Azevedo Ito, 2005

© Copyright Scripta Nova, 2005

 

Ficha bibliográfica:

SANTANA, X.; AZEVEDO, C. Turismo e espaço: uma leitura geográfica da interferência da atividade turística no processo de (re)organização sócio-espacial do município de João Pessoa-PB . Scripta Nova. Revista electrónica de geografía y ciencias sociales. Barcelona: Universidad de Barcelona, 1 de agosto de 2005, vol. IX, núm. 194 (116). <http://www.ub.es/geocrit/sn/sn-194-116.htm> [ISSN: 1138-9788]

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