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Scripta Nova
REVISTA ELECTRÓNICA DE GEOGRAFÍA Y CIENCIAS SOCIALES
Universidad de Barcelona.
ISSN: 1138-9788. Depósito Legal: B. 21.741-98
Vol. VI, núm. 114, 15 de mayo de 2002



O CONTRIBUTO DA EDUCAÇÃO GEOGRÁFICA NA EDUCAÇÃO AMBIENTAL. O CASO DA GEOGRAFIA NO ENSINO SECUNDÁRIO

Alzira Filipe Alberto
Mestre em Geografia Humana e Educação Ambiental e Professora do Ensino Secundário


O contributo da educação geográfica na Educação Ambiental. O caso da Geografia no Ensino Secundário (Resumo)
Este artigo sintetiza as principais conclusões de uma dissertação de Mestrado, entretanto já publicada pelo Centro de Estudos Geográficos da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Se procura entender em que medida o actual ensino da Geografia pode e está, ou não, a contribuir para uma verdadeira educação ambiental. Neste âmbito tentou-se identificar quais as origens da sensibilização e preocupação dos professores de Geografia para as questões ambientais e de que forma isso se reflecte na sua prática. Procurou-se ainda compreender quais as expectativas dos alunos no que respeita á relação ambiente/Geografia.

Palavras chave: Ambiente, Conceitos Estruturantes da Geografia, Educação, Educação Ambiental, Educação Geográfica, Ensino da Geografia, Metodologias de Aprendizagem.


The contribution of the geographical education in the environmental education. The case of the geography in the secondary teaching (Abstract)

This article synthesizes the main conclusions obtained by the author in her dissertation for University degree, partly published by the Geography Study Center of Lisbon University Faculty of Arts. It explains the extent that Geography teaching nowadays can contribute and it is contributing, or it is not, to a real environmental education. In this field it tries to identify which the origin of Geography teachers’ concern and care with regard to environmental questions is and how this are reflected in their teaching exercise. It also tries to understand how the students’ expectations are in connection with the relationship between environment and Geography.

Key words: Environment, Geography concepts, Education, Environmental education, Geography education, Geography teaching, learning methodology.


La contribución de la educación geográfica en la educación ambiental. El caso de la geografía en la enseñanza secundaria (Resumen)

Este artículo sintetiza las principales conclusiones obtenidas por la autora en su Tesis de Mestrado, que ha sido publicada parcialmente por el Centro de Estudios Geográficos de la Facultad de Letras de la Universidad de Lisboa. Se procura explicar en que medida la actual enseñanza de Geografía puede y está, o no, contribuyendo en una verdadera educación ambiental. En este ámbito se intentó identificar cuáles son los orígenes de la sensibilización y preocupación de los profesores de Geografía respecto a las cuestiones ambientales y como éstas se reflejan en su práctica docente. También se procuró comprender cómo son las expectativas de los alumnos en relación con las relaciones entre ambiente y geografía.

Palabras clave: Ambiente, conceptos estructurantes de geografía, educación, educación ambiental, educación geográfica, enseñanza de la geografía, metodologías de aprendizaje.


O ambiente tornou-se uma preocupação crescente, sobretudo desde a segunda metade do século XX. A Educação Ambiental (EA) surge como um objectivo a alcançar, por parte das instituições que têm realizado múltiplos encontros e conferências nesse sentido. O conceito de EA tem evoluído, tornando-se mais abrangente e surgindo agora ligado à educação para o desenvolvimento. Mas, apesar de todos os esforços de sensibilização, a sociedade tem mantido uma posição antropocêntrica em relação ao ambiente, delapidando os recursos e consumindo duma forma exagerada; para que a sociedade mude a sua atitude, a EA é fundamental.

A Comissão de Educação Geográfica afirma que a educação geográfica é indispensável para o desenvolvimento de cidadãos responsáveis e activos no mundo actual e no futuro (Comissão da Educação Geogràfica, 1992: 5). A Geografia não é (e nunca foi…) uma disciplina neutra; ela transmite valores, quer explícita quer implicitamente; a diferença reside nos valores que se têm tentado transmitir, ao longo dos tempos, uma vez que têm mudado muito. Enquanto os manuais de ensino, durante o Estado Novo, falavam sobre: os passarinhos tão pequeninos fazem os ninhos com mil cuidados, nos dias de hoje, o apelo é para outros aspectos, nomeadamente a necessidade de preservar o ambiente (André e Cachinho, 1996).

Nos últimos anos, têm-se evidenciado mudanças no ensino da Geografia; de um modelo de ensino centrado na transmissão da informação, associada a uma ideia de neutralidade, objectividade e racionalidade de aprendizagem, confronta-se um outro onde se atribui especial atenção aos conceitos, às atitudes e aos valores éticos (André e Cachinho, 1996: 1).

É evidente a necessidade de discussão e de reflexão sobre a importância do ensino da Geografia na educação actual em geral e, na EA em particular. É neste contexto que surgiu este trabalho onde a EA e a educação geográfica constituíram os dois grandes eixos estruturantes de uma investigação realizada no âmbito de uma tese de mestrado em Geografia Humana, na área da Educação Ambiental, na Universidade de Lisboa, e que teve como quadro de referência o ensino da Geografia, ao nível do ensino secundário.

Tentou-se perceber o contributo da educação geográfica na EA (designadamente a sua interligação na disciplina de Geografia, a nível do secundário), procurando identificar os aspectos comuns entre ambas, mas partindo sempre do princípio que a educação para os valores ambientais tem de ser transversal a todas as disciplinas e níveis de ensino.

Como é que as mudanças e as propostas do actual quadro legislativo têm efeitos práticos? Será que as transformações institucionais, como a reforma do sistema educativo, têm provocado alterações, em termos práticos nas escolas, nomeadamente na disciplina de Geografia, ou não têm passado do papel? Como é que o ensino da Geografia pode ou está contribuir para a tão aconselhada EA?

Estas perguntas levaram à realização de algumas leituras exploratórias, ao mesmo tempo que se estabeleciam conversas informais, com outros docentes. Reconhecendo o valor intrínseco da «hipótese» em qualquer investigação, devido às suas características de verossimelhança e verificabilidade (Piaget, 1978), levantaram-se uma série de hipóteses de trabalho, que constituíram os elementos de orientação da investigação e das quais se destacam as seguintes:

A Geografia é uma disciplina que pode desenvolver um projecto ambientalista, uma vez que ao longo da sua história sempre se tem preocupado com as relações homem/meio; mas para o conseguir, necessita de seleccionar os problemas básicos da aprendizagem, bem como os conceitos–chave que os jovens devem adquirir (Souto González, 1990), para além de tentar mudar as rotinas dos professores.

As preocupações e a sensibilização dos professores na área da EA são muito diferenciadas e com origens muito variadas, o que acaba por influenciar as abordagens feitas, pelos professores, a esta temática.

Para mudar as rotinas dos professores e adoptar uma perspectiva mais ambientalista não é suficiente alterar o quadro legislativo, é fundamental desenvolver um programa de formação para os professores, nesta área.

As diferentes perspectivas dos professores em relação ao ensino da Geografia e à EA relacionam-se com as suas vivências pessoais e profissionais.

A dissertação realizada a partir destas hipóteses teve subjacente uma perspectiva de interligação da componente teórica e prática da investigação. Existiu, durante todo o trabalho, a tentativa de interligar a dimensão teórica e conceptual (síntese da bibliografia) com a dimensão prática e interpretativa (opiniões dos professores e alunos) por isso, em quase todos os capítulos são abordadas as duas componentes (a teórica e a prática) de forma interligada.

Além da introdução e das considerações finais, a dissertação está organizada em cinco capítulos, que devem ser lidos, numa perspectiva articulada, mas em que os três primeiros pretendem fazer uma abordagem mais teórica das questões levantadas, enquanto os dois últimos fazem uma análise mais empírica das questões, quer no quadro legislativo quer no contexto escolar. Deste modo, o capítulo I refere-se ao papel da educação na actualidade, bem como ao aparecimento e situação actual da EA; o capítulo II mostra a influência da evolução do pensamento geográfico na situação actual do ensino da Geografia; o capítulo III destaca os aspectos comuns entre a educação geográfica e a EA, bem como a perspectiva que os professores têm dessa interligação e a sua formação na área da EA ou do ambiente; o capítulo IV detecta a forma como o programa de Geografia do ensino secundário contempla a EA, para além de divulgar a percepção que os professores têm da componente ambiental desse programa e, por último, o capítulo V mostra, através da análise das entrevistas e dos questionários, a componente ambiental no ensino da Geografia, em todo o processo ensino/aprendizagem, inclusive na sala de aula.

Neste artigo procurou-se sintetizar as principais conclusões a que se chegou durante a investigação, sobretudo no que respeita ás práticas dos professores e ás opiniões dos alunos.

Para melhor atingir os objectivos do trabalho e confirmar as hipóteses levantadas, procurou desenvolver-se um processo de pesquisa, sobretudo no âmbito da investigação qualitativa, aplicando-se as técnicas da entrevista semidirectiva e da análise de conteúdo da mesma. Foram efectuadas entrevistas a seis professores de Geografia, pessoal e profissionalmente muito diferentes.

Foi efectuada uma análise de conteúdo a estas entrevistas, o que permitiu uma inventariação das ideias – chave dos professores, seguida da sua organização e consequente classificação. Respeitaram-se as fases fundamentais na metodologia da análise de conteúdo, desenrolando-se as seguintes etapas: uma leitura flutuante, que serviu para estabelecer um primeiro contacto com as ideias dos entrevistados, depois uma exploração do material e inventariação das ideias–chave, bem como a sua classificação, e por fim um inventário de indicadores que serviu de base temática para a elaboração do questionário de opinião, a ser aplicado a um número alargado de professores.

Para verificar se as ideias dos professores entrevistados se encontram generalizadas no corpo docente de Geografia, ou estão circunscritas a uma minoria de professores melhor informados, optou-se pela aplicação dum questionário a um número alargado de docentes, tendo por base a síntese dos indicadores, determinados a partir das ideias - chave das entrevistas; posteriormente estabeleceu-se a comparação entre as ideias dos entrevistados e as dos professores, em geral, tentando identificar as semelhanças e diferenças entre estes dois grupos.

Houve ainda a tentativa de entender a percepção dos alunos quanto às ligações entre o ensino da Geografia e a EA; para isso, foi elaborado um outro questionário, respeitando os princípios metodológicos já referidos.

A informação obtida nestas diferentes fontes foi o principal instrumento utilizado para verificar as hipóteses de trabalho. Os dois grupos de docentes (entrevistados e inquiridos) apresentam, à partida, características diferentes, como evidenciou a respectiva caracterização estrutural de cada grupo; o primeiro, apresenta uma caracterização estrututural mais diversificada, enquanto os segundos constituem um grupo mais homogéneo, o que poderá justificar as semelhanças e diferenças de opinião.

Os docentes entrevistados revelam perspectivas diferentes, no modo de encarar a EA, mas estão de acordo quanto à sua importância e transversalidade na educação de hoje.

As entrevistas evidenciam uma grande riqueza de ideias quanto à EA, nas aulas de Geografia, sendo importante verificar até que ponto estas perspectivas estão generalizadas no corpo docente de Geografia, do ensino secundário, através dos questionários a professores e a alunos.

No que respeita à perspectiva ambiental na planificação, os professores entrevistados consideram o programa um bom instrumento de trabalho, uma vez que apresenta uma componente ambiental. Quanto ao apuramento estatístico dos questionários, ele revela algumas contradições no modo de encarar a EA no processo de ensino/aprendizagem; a grande maioria dos professores (96%) considera vantajosa a EA para os alunos logo, deveriam estruturar a sua planificação nesse sentido, utilizando recursos (de planificação) onde a componente ambiental estivesse presente, como seja o programa de Geografia do ensino secundário, sobretudo nos seus princípios orientadores e nas finalidades e objectivos gerais. O apuramento dos questionários revela que não é isso que se passa, pois que existe uma dispersão dos recursos utilizados na planificação.

O programa, que constitui a base de qualquer planificação, devia surgir destacado em relação aos outros recursos, mas não é isso que se verifica. A experiência pessoal apresenta uma percentagem superior ao do programa, surgindo logo de seguida, o manual de ensino. Estes três “recursos” estão quase ao mesmo nível na elaboração da planificação, para os professores inquiridos, confirmando-se a ideia de que uma larga maioria dos professores (70%) não prepara as suas aulas com base no programa, mas sobretudo a partir da experiência pessoal e do manual de ensino, que eles próprios consideram com várias carências, nomeadamente na área do ambiente.

Apesar de a experiência ser fundamental para a preparação de aulas ou de outras actividades, o professor não se deve basear excessivamente nela, até porque não se trata de uma experiência reflectida, mas antes de “rotinas”, uma repetição de hábitos, de anos anteriores, onde a EA estava ausente, ou surgia com uma perspectiva errada ou ultrapassada. Esta situação agrava-se com a utilização excessiva do manual, como recurso da planificação, o que torna todo este processo limitado e em “circuito fechado”. Outro aspecto que contribui para acentuar esta problemática é o facto dos professores trabalharem sozinhos, como confirmam as suas respostas; a maioria dos docentes (79%) afirma trabalhar de forma individual, colocando em segunda opção o trabalho com outros colegas com quem se relacionam bem (13%). As respostas a esta questão mostram não só o carácter individual da actividade docente, como ainda a ausência de um trabalho sistemático ao nível do grupo disciplinar. Clarifica-se assim a «experiência pessoal» como um recurso utilizado na planificação; trata-se da experiência pessoal entendida como uma rotina, conforme a define Garcia (1987: 64): entenda-se por rotina os comportamentos interiorizados e automatizados gerados pelos próprios professores, como consequência da sua prática profissional. Para haver uma experiência reflectida e não uma repetição de hábitos, teria de existir um trabalho ao nível do grupo disciplinar, o que não acontece.

As características do processo de planificação evidenciam que qualquer inovação, como seja a introdução da componente ambiental, é difícil de implementar e depende, sobretudo, das características pessoais dos professores e são os próprios docentes que o confirmam.

O gosto individual do professor pelo tema surge em primeiro lugar, antes das directrizes do programa que, por sua vez, estão ao mesmo nível do interesse dos alunos. Aspectos importantes como as directrizes do grupo disciplinar e o Projecto Educativo da Escola parecem não ter significado para os professores.

Apesar de ser unanimemente considerada importante, a componente ambiental no ensino da Geografia, ela continua a depender do gosto do professor e do interesse dos alunos (correspondendo a 54% dos casos). Um aspecto tão importante da educação não devia continuar condicionado por perspectivas pessoais.

O programa, apesar de algumas incoerências, podia ser uma boa base de trabalho, mas os professores continuam a trabalhar individualmente, baseando-se na sua «experiência pessoal», nos manuais de ensino, não valorizando o programa, o que dificulta a mudança das suas práticas, que se tornam rotineiras e das quais depois é difícil sair. São os próprios professores inquiridos que referiram, como dificuldades para a implementação da EA, a acomodação do corpo docente (31%) e a pouca flexibilidade do mesmo (20%), aspectos também apontados pelos docentes que foram entrevistados.

Os elementos da planificação considerados fundamentais também revelam incoerências. Existe um grupo de professores a referir os objectivos gerais, em primeira opção (53%), mas atendendo à importância determinante que os objectivos gerais do programa devem ter em relação aos outros aspectos, esta percentagem é muito baixa (como se observa no quadro 1).

Sendo os objectivos gerais determinantes, porque constituem um marco de referência na organização do processo formativo (Zabalza, 1996), seria de esperar uma unanimidade quanto à sua importância na planificação.

Sem ter presente o que se pretende com o programa, como se pode desenvolver um trabalho organizado e encadeado? Ou seja, como se pode fazer o desenvolvimento dum currículo, sem se saber quais os seus objectivos?

Como se pode atribuir tanta importância aos conteúdos (com um total de 43%, nas três primeiras opções) sem ter presente o que se procura ensinar aos alunos, com eles? Os objectivos gerais, articulados com os critérios de avaliação, deviam ser o ponto de partida e, portanto, a primeira opção para todos os professores e não é isso que se passa.

Quadro 1: Elementos fundamentais da planificação, segundo os professores inquiridos

Elementos

1ª opção

2ª opção

3ª opção

Total

%

Nº ordem

%

Nº Ordem

%

Nº ordem

%

Nº ordem

Objectivos gerais

53

16

3

72

Interesses dos alunos

15

22

14

51

Conteúdos

19

17

7

43

Conceitos

3

20

11

34

Metodologias

3

7

15

25

Recursos

3

5

15

23

Capacidades

1

5

15

21

Actividades

2

4

13

19

Atitudes

1

3

2

10º

6

Não responde

-

-

-

-

4

4

10º

Outros

-

-

1

10º

1

11º

2

11º

Fonte: Questionário aos professores (Q. II - 2.2)

Um elemento bem posicionado, em relação aos outros, é o «interesse dos alunos», sendo a segunda opção mais escolhida (22%). Este facto deve estar relacionado com o modelo de formação de um elevado número de professores, que na década de 80, seguiu o modelo interpretativo. A metodologia de trabalho de projecto, centrada nos interesses dos alunos, surgia como a mais adequada; este modelo deixou marcas, no modo de trabalhar dos professores, que ainda consideram (pelo menos no plano teórico), que devem desenvolver o processo ensino/aprendizagem a partir dos interesses dos alunos. Não relegando para segundo plano este aspecto, convém lembrar que ele deve ser sempre articulado com o programa e com os seus objectivos gerais e nunca considerado como elemento determinante de todo o trabalho. Os objectivos gerais deviam ter um peso maior no processo de planificação (apenas metade dos professores o coloca em 1ª opção), assim como é estranho que exista ainda um percentagem relativamente grande (8%) que não atribui qualquer importância a este elemento, uma vez que seleccionaram a hipótese «nula».

Quanto à valorização dada aos interesses dos alunos parece não existir uma concretização dessa intenção, uma vez mais as respostas dos questionários dos alunos não o confirmam, ou seja, revelam diferenças entre os gostos dos alunos e as opções dos professores no que respeita a temas e a metodologias escolhidas.

As estratégias seleccionadas pelos professores são determinantes para a introdução das temáticas ambientais e também aqui surgem diferenças entre as ideias expostas pelos professores entrevistados e o apuramento estatístico dos questionários realizados. Os primeiros afirmam que qualquer estratégia ou metodologia pode ser utilizada para a introdução da componente ambiental, pois o importante é o desenvolvimento de certas atitudes e capacidades nos alunos. Defendem que a EA não se deve “fazer” baseada no levantamento dos problemas, uma vez que se trata de uma abordagem superficial dos mesmos, dependendo de conjunturas e que acaba por criar uma visão pessimista e fatalista das questões ambientais. Os professores entrevistados defendem que se deve partir do levantamento dos problemas para um estudo científico das causas e para a apresentação de soluções e propostas concretas, nomeadamente através da análise de dilemas.

Quando se passa para o apuramento dos questionários, os resultados contrariam esta tendência, como mostra a análise do quadro 2.

O «levantamento de problemas» destaca-se em relação às outras estratégias (68% referem-na como 1ª opção), enquanto a «análise de dilemas» parece ser pouco importante para os professores que responderam ao questionário, ocupando o 3º lugar, quando se consideram as duas primeiras opções e tendo-lhe sido atribuída uma importância «nula», por 40% dos professores.

Quadro 2: Estratégias mais adequadas para a EA, segundo os professores inquiridos

Estratégias

1ª opção

2ª opção

Total

%

N º ordem

%

N º ordem

%

N º ordem

Levantamento de problemas

68

17

85

Inventariação de recursos

8

28

36

Análise de dilemas

8

19

27

Análise de cenários

12

14

26

Resolução de problemas

3

12

15

Cartografia de problemas

1

10

11

Outros

-

-

-

-

-

-

Fonte: Questionário aos professores (Q. II - 4.4)

A avaliação é outro aspecto a ter em conta para verificar a importância da componente ambiental na prática lectiva; se as temáticas ambientais fazem parte da prática lectiva, a avaliação vai contemplar este aspecto. Quando se questionam os professores sobre a frequência da introdução da temática ambiental apenas 9% afirma introduzir «sempre» as questões ambientais na avaliação; a maioria (84%) escolheu a opção «por vezes», o que evidencia a ambiguidade da situação, confirmada depois pela selecção dos instrumentos de avaliação mais utilizados.

Uma elevada percentagem de professores (29%) não refere que instrumentos utiliza, o que vem reforçar a ambiguidade da resposta «por vezes»; os trabalhos de pesquisa são os mais referidos, ao mesmo tempo que os testes sumativos surgem com uma importância reduzida (10%); se os professores integrassem o ambiente no processo de avaliação, então questões desse âmbito entrariam nos testes, tal como surgem nos exames a nível nacional. Sobretudo a nível do ensino secundário, os testes sumativos são importantes elementos de avaliação, logo esta selecção, feita pelos professores inquiridos, vem mostrar que, na realidade, a componente ambiental ainda não entrou, de forma sistemática, no processo ensino/aprendizagem, senão também estaria presente no processo de avaliação.

Outro aspecto importante na interligação do ensino da Geografia com a EA é a utilização de determinados recursos e materiais, uma vez que ele é determinante para a perspectiva que se quer salientar. O grupo dos professores entrevistados reforça a importância da selecção dos materiais para a introdução da EA no ensino da Geografia, afirmando que a simples escolha de um texto, sobre qualquer temática pode, ou não, ter subjacente uma preocupação pela perspectiva ambiental. Alguns entrevistados reconhecem ter sempre esse cuidado, efectuando uma busca propositada nesse sentido, outros afirmam que a sua sensibilização tem, por base, sobretudo o discurso. Os diferentes modos de seleccionar recursos e materiais mostram que é sempre possível perspectivar a temática ambiental, depende sobretudo da sensibilização/formação de cada professor.

Quando se passa á análise dos resultados dos questionários (quadro 3) verifica-se que o material utilizado pelos professores, na preparação das aulas, é pouco variado, logo limitativo; o manual de ensino surge como o mais importante, seguido dos jornais e revistas. Não negando o papel do manual na preparação das aulas, ele não devia ser tão importante.

Quadro 3: Materiais utilizados na preparação das aulas pelos professores inquiridos

Opções

1ª opção

2ª opção

3ª opção

Total

%

Nº ordem

%

Nº ordem

%

Nº ordem

%

Nº ordem

Manuais

77

8

8

93

Jornais e revistas

10

42

25

77

Livros científicos

8

28

14

50

Revistas divulgação

5

12

23

40

Televisão

-

-

5

13

18

Internet

-

-

1

5

6

Apont. Faculdade

-

-

-

-

5

5

Outros

-

-

4

1

5

Fonte: Questionários aos professores (Q. II – 2.4)

Surge uma contradição entre a opinião expressa dos professores que responderam ao questionário e aquilo que são as suas práticas, uma vez que consideram os manuais de ensino com muitos aspectos negativos, como seja uma excessiva colagem à comunicação social (19%), no entanto recorrem a ele, em todas as fases do processo de trabalho, como mostra o quadro 4. Utilizar o manual escolar para a planificação, com a mesma importância que o programa e a experiência pessoal parece excessivo, pois que o programa deveria predominar em relação aos outros elementos. Também na preparação das aulas, o peso atribuído ao manual (77%) pode conduzir a uma dependência excessiva em relação ao mesmo, uma vez que os outros recursos são menos utilizados. O que parece mais equilibrado é a sua utilização nas aulas (38%), mas atendendo ao uso nas fases anteriores, tal facto pode ser a confirmação de uma excessiva dependência dos professores em relação ao manual.

Quadro 4: As diferentes funções do manual no processo ensino/aprendizagem, segundo os professores inquiridos


A utilização do manual no processo ensino - aprendizagem

fases

%

Nº ordem

No processo de Planificação

33

Material de preparação de aulas

77

Material de utilização nas aulas

38

Fonte: Questionários aos professores (Q. II - 2.1., 2.4, 4.2)

O manual é um recurso para a planificação, como material para a preparação de aulas e ainda como recurso didáctico na aula; mesmo sendo criticado pelos próprios professores. Esta utilização sistemática em todas as fases dificulta a introdução da componente ambiental, até porque são os professores a reconhecer que as temáticas ambientais não estão correctamente abordadas nos manuais

Situação idêntica se passa com os jornais e revistas; estes recursos são criticados pelos docentes, devido à sua factualidade e alarmismo. O que os professores inquiridos mais criticam é aquilo que mais utilizam, criando um círculo fechado em todo o desenvolvimento do currículo, que se torna difícil de ultrapassar.

Também a fraca utilização de materiais existentes no dossier de grupo, onde 55% dos docentes não lhe atribui qualquer importância, vêm comprovar a não existência de um trabalho sistemático, a nível do grupo disciplinar, o que constitui uma lacuna grave e acentua o isolamento e a dificuldade de inovação dos professores.

Do que foi referido, percebe-se que os manuais de ensino adquiriram uma importância excessiva, em todo o processo de ensino/aprendizagem. Os manuais, que deveriam ser apenas um recurso didáctico, entre outros, surgem ao longo de todo o processo, substituindo, muitas vezes, elementos fundamentais, como o próprio programa.

Não pretendendo justificar esta atitude, convém não esquecer que qualquer docente tem mais facilidade em conhecer os manuais de ensino do que o programa. Por questões de marketing, os manuais são oferta das editoras, enquanto o programa se encontra arquivado num dossier e o professor, se o quiser, tem de o de adquirir, por meios próprios.

Existe no mercado um elevado número de manuais, cuja qualidade científico/pedagógica não é avaliada. São os próprios professores, quer nas entrevistas quer nos questionários, a referirem a fraca qualidade dos mesmos, nomeadamente na abordagem das questões do ambiente. Por sua vez, o apuramento estatístico dos questionários evidencia as seguintes características dos manuais: a superficialidade (28%), a factualidade (22%) e a colagem à comunicação social (19%).

Estas características não facilitam a visão integradora de qualquer facto, e muito menos das questões ambientais, então como é que os professores continuam a basear o seu trabalho num elemento onde identificam tantos defeitos e em relação ao qual são tão críticos?

Tendo subjacente o princípio de que a mensagem que o professor tenta levar aos alunos não é recebida por estes da mesma forma, tentou-se ver a imagem que os alunos do ensino secundário têm da disciplina de Geografia, assim como a relação que estabelecem entre esta e a EA. São essas representações, que se obtiveram com o questionário aplicado aos alunos e que foram objecto de análise detalhada.

Para compreender o modo como os professores exercem influência nos seus alunos e, até que ponto, os professores de Geografia têm alguma representatividade nessa situação, questionaram-se os alunos sobre os professores que recordam. A análise das respostas revela que a maioria (86%) tem um professor que recorda em especial. Dentro desse grupo, o posicionamento dos professores de Geografia é significativo (15%), atendendo ao número de disciplinas/professores com quem estes alunos contactaram até aqui. Apesar do inquérito se referir apenas ao ensino secundário, a maioria dos alunos (56%) faz referência a professores doutros níveis de escolaridade, alargando muito as hipóteses de escolha, o que por seu lado, aumenta a representatividade dos professores de Geografia.

Os alunos recordam os professores por motivos afectivos (56%): «afectividade», «relação professor/aluno» e «preocupação com os alunos»; só depois surgem as características profissionais (37%): «bom professor» e o «tipo de aulas». Os temas ambientais, ou quaisquer outros, não são referidos como motivos de escolha.

As razões de preferência são as mesmas para os professores de Geografia e para os outros professores, em geral: continuam a ser os motivos de ordem afectiva (54%) e depois os de ordem profissional (46%). Não são os temas abordados nas aulas que “marcam” os alunos, não havendo qualquer referência a temas, nem mesmo aos de perspectiva ambiental.

As respostas dos alunos comprovam o que os professores entrevistados afirmavam sobre a sensibilização dos alunos para a temática do ambiente: primeiro tem de se estabelecer uma relação interpessoal para se conseguir transmitir qualquer mensagem; a empatia e a relação professor/aluno são elementos determinantes em todo o processo.

Para perceber como é que a temática ambiental surge na sala de aula, questionaram-se os alunos sobre os trabalhos desenvolvidos, procurando identificar a sua componente ambiental, numa primeira fase a nível geral e depois a nível da Geografia. O tipo de trabalhos escolhidos e os motivos da sua preferência foram depois analisados e classificados em diversas categorias, que se podem observar no quadro 5.

Quadro 5: Trabalhos preferidos e motivos dessa preferência, para os alunos

Trabalhos escolhidos

%

 

Motivos de preferência

%

Temas vários desligados do ambiente

50

Razões afectivas

22

Temas de Geografia e ambiente

25

Actualização de conhecimentos

21

Área – escola

5

Interesse dos temas

19

Visitas de estudo

5

Actividades de pesquisa

12

Temas de Ambiente e não da Geografia

3

Outros

10

Não refere

12

Não refere

12

 

 

Bons resultados

2

 

 

Temas de ambiente

2

Fonte: Questionários aos alunos (Q. 6) Fonte: Questionários aos alunos (Q. 7)

A maioria dos alunos referiu trabalhos diversificados, mas com temas de âmbito restrito e que, à partida, não têm qualquer componente ambiental, como por exemplo, trabalhos sobre a vida de determinado escritor, ou sobre certos factos históricos. Surgem depois os trabalhos de âmbito geográfico (25%); dentro destes, 17% referiram temas que podiam ou não ter essa perspectiva, enquanto 8% indicam explicitamente trabalhos de âmbito geográfico/ambiental. Os trabalhos com uma perspectiva ambiental, mas efectuados noutras disciplinas, sem ser a Geografia, têm uma importância reduzida: apenas 1%.

No que respeita aos motivos para a escolha dos referidos trabalhos, em primeiro lugar surgem os de ordem afectiva (22%), logo seguidos pela actualização dos conhecimentos (21%) e depois pelo interesse dos temas. É de realçar a importância dada às actividades de pesquisa (12%), que são um factor de preferência, bem como a justificação explícita da escolha por se tratar de temas relacionados com o ambiente, que aparece pela primeira vez, embora com uma percentagem baixa (2%).

Para detectar a abordagem da questão ambiental, questionaram-se os alunos sobre os estudos do meio, mas os resultados não foram esclarecedores, porque a maioria (60%) não se recorda da utilização desse recurso nas aulas e apenas 27% refere o seu uso. Quanto à disciplina que recorre a estes estudos é a Geografia (43%), o que pode levar à conclusão de que a utilização de estudos do meio, apesar de não ser frequente, quando acontece, é sobretudo nesta disciplina.

Ao contrário das tendências anteriores (que revelavam pouca importância para o estudo das questões ambientais), os trabalhos, que implicam utilização de material relacionado com o meio, apresentam uma forte componente ambiental.

A relação ambiente/Geografia mostra-se mais intensa do que em relação às outras disciplinas, surgindo aqui mais referências às temáticas ambientais. A maioria dos alunos gosta das aulas de Geografia (79%) e apenas 8% afirma que não gosta. Os motivos da preferência, estão agora mais ligados aos temas abordados. O interesse dos temas abordados surge em primeiro lugar (28%), bem como a ligação da disciplina à realidade (17%); a abordagem das questões de ambiente explica a preferência, em 3% dos casos; deste modo, a maioria dos alunos (57%) gosta das aulas de Geografia devido aos assuntos aí abordados, surgindo várias referências ao ambiente e à ligação com a realidade, só depois surge o tipo de aulas e a atitude do professor.

Para compreender de que forma a perspectiva ambiental está a ser introduzida nas aulas de Geografia, solicitou-se aos alunos a indicação das metodologias preferidas e aquelas onde os temas do ambiente são mais abordados. A partir das respostas, e utilizando apenas as três primeiras opções, elaborou-se o quadro 6 que evidencia as diferenças de posicionamento entre as metodologias preferidas pelos alunos e aquelas onde os temas do ambiente são mais abordados. Verifica-se que existe um posicionamento idêntico apenas na primeira opção, a partir daí surgem diferenças; as aulas tradicionais estão em segundo lugar, nas situações onde mais se abordam questões ambientais (considerando a 1ª opção – 25%), surgindo em 4º lugar nas preferências dos alunos (6%).

Quadro 6: Metodologias preferidas e aquelas onde a temática ambiental é mais abordada, segundo os alunos

Metodologias preferidas pelos alunos

Situações onde se aborda o ambiente

Opções

Total

Opções

Total

%

%

%

%

%

%

%

%

Saídas de campo

57

16

11

84

Trabalhos de pesquisa

14

36

21

71

Debates/Simulações

14

28

13

55

Saídas de campo

48

9

11

68

Trabalhos de pesquisa

10

16

22

48

Debates/Simulações

11

23

15

49

Ensino experimental

5

17

13

35

Aulas tradicionais

25

12

11

48

Jogos

6

14

12

32

Ensino experimental

1

9

12

22

Aulas tradicionais

6

5

5

16

Roteiros de trabalho

-

6

15

21

Roteiros de trabalho

2

4

10

16

Jogos

1

3

4

8

Outros

-

-

1

1

Outros

-

-

-

-

Fonte: Questionários aos alunos (Q. III - 19, 20)

Quando se consideram as três primeiras escolhas dos alunos, as saídas de campo continuam em primeiro lugar, como a sua metodologia preferida, mas são os trabalhos de pesquisa onde mais se aborda o tema do ambiente.

A comparação das respostas a estas duas questões mostra que os alunos não confundiram os seus gostos pessoais com aquilo que se concretiza nas aulas; as aulas tradicionais e o trabalho de pesquisa revelam-se aqui como metodologias muito aplicadas e onde a perspectiva ambiental está presente.

Quanto ao trabalho de pesquisa, a flexibilidade e a abertura pedagógica que lhe é inerente, leva os alunos até às questões que os rodeiam e, logicamente, às ambientais.

No que respeita às aulas tradicionais, que os professores questionados não dão importância (como se verá no quadro seguinte), são mais frequentes do que eles afirmam. Existe uma relutância, por parte dos docentes, em admitir o recurso às aulas tradicionais, mas os resultados dos questionários evidenciam a sua utilização, apesar de não serem as primeiras preferências dos alunos. Para evidenciar as diferenças de opinião entre alunos e professores, elaborou-se o quadro 7.

Quadro 7: Diferenças de opinião quanto às metodologias de abordagem das questões ambientais, entre alunos e professores inquiridos

Metodologias

Preferidas pelos alunos

Mais utilizadas, segundo os alunos

Mais adequadas, segundo os professores

Soma das três 1ªs opções

Nº Ordem

Soma das três 1ªs opções

Nº ordem

Soma das três1ªs opções

Nº ordem

Opções

%

Opções

%

Opções

%

Saídas de campo

Debates e simulações

Trabalho de pesquisa

Ensino experimental

Jogos

Aulas tradicionais

Roteiros de trabalho

84

54

48

34

31

16

15

Trabalho de pesquisa

Saídas de campo

Aulas tradicionais

Debates e simulações

Ensino experimental

Roteiros de trabalho

Jogos

71

67

48

47

22

20

7

Saídas de campo

Trabalho de pesquisa

Debates e simulações

Ensino experimental

Roteiros de trabalho

Jogos

Ensino tradicional

91

80

45

28

23

13

6

Fontes: Questionários aos professores (Q. III - 19, 20) e Questionários aos alunos(Q.II - 4.1)

Estabeleceu-se a comparação entre as três perspectivas, ou seja, mostra-se a diferença entre as metodologias que os alunos preferem, aquelas que, na sua opinião, são mais utilizadas, e aquelas que os professores consideram mais adequadas para a abordagem das questões ambientais. Uma das diferenças mais evidentes diz respeito às aulas tradicionais (em 6º lugar na primeira situação, em 3º na segunda e em 7º na terceira). Os professores consideram as aulas tradicionais como uma metodologia pouco importante, colocando-a em 7ª posição, ao mesmo tempo que 44% dos docentes não lhe atribuem qualquer importância, enquanto os alunos indicam esta metodologia como uma das mais utilizadas (3º lugar), apesar de não ser uma das suas preferidas (6º lugar).

Não existem coincidências entre as várias situações apresentadas, apesar de, nalgumas opções, as diferenças serem pouco relevantes, como o caso das saídas de campo e do trabalho de pesquisa, que surgem sempre nas primeiras posições. Esta coincidência de opinião é importante porque revela uma concordância entre o plano de intenções dos professores e as suas práticas, o que não acontece nas restantes.

Estas disparidades confirmam as diferenças entre o discurso dos professores e as suas práticas, assim como as diferenças entre as preferências dos alunos e o que, efectivamente, se concretiza na aula. Apesar de, os professores considerarem os interesses dos alunos como elementos muito importantes para a preparação do seu trabalho quando passam para o plano prático, isso parece ficar esquecido.

Foi solicitada aos alunos a opinião sobre o que se ensina na disciplina de Geografia, bem como os temas que eles gostariam de ver abordados nas aulas. Quanto à primeira questão, as respostas são variadas. Dum total de 277 opiniões, existe uma incidência em aspectos vagos como sejam a importância da disciplina (22%) e o interesse dos temas abordados (21%); depois existem referências mais precisas como o conhecimento do mundo (23%) e o conhecimento de Portugal (12%); a abordagem das questões ambientais surge em 5º lugar, com 4%. Os alunos parecem ter uma imagem vaga e dispersa do que se ensina nesta disciplina, e apesar de haver referência à abordagem de temas sobre o ambiente, não se pode considerar uma percentagem significativa.

A Geografia continua a ser a disciplina enciclopédica e de cultura geral, que dá a conhecer o mundo e Portugal, sendo importante por essa perspectiva geral.

Quanto aos assuntos que os alunos gostariam de abordar nota-se uma certa dispersão; destaca-se, no entanto, o ambiente (26%) e um maior conhecimento de Portugal (12%). Verifica-se uma expectativa, por parte dos alunos, numa educação geográfico/ambiental, onde o estudo do meio e de Portugal são os espaços privilegiados. As respostas que referem o «ambiente», o «meio» e «Portugal» totalizam 43%, o que é significativo, sobretudo quando se compara com as poucas referências ao ambiente que surgiram até agora.

Os professores e os alunos vêm as aulas de Geografia de forma diferente. Mas será que essas diferenças correspondem também a perspectivas diversificadas sobre a importância da educação geográfica e do ensino da Geografia na educação em geral e na EA em particular?

As opiniões dos professores entrevistados, sobre a existência de afinidades entre a educação geográfica e a EA, foram idênticas; todos consideram que a Geografia está vocacionada para a EA, para além de outros assuntos; alguns entrevistados afirmaram que a EA surgiu primeiro na prática lectiva e só depois nos programas, tendo sido iniciada primeiro na Geografia e só depois nas outras disciplinas. Houve unanimidade em considerar que existe um contributo específico da Geografia na EA, através da espacialização dos fenómenos, da abrangência da análise geográfica, da análise a diferentes escalas. Existe um consenso quanto ao contributo da Geografia na EA, mas os entrevistados identificaram alguns problemas, porque apesar de pioneira, neste momento, a Geografia apresenta uma componente ambiental algo insipiente; a excessiva especialização dos conhecimentos geográficos levou a um isolamento dos investigadores e a uma compartimentação do saber, que não facilita a EA.

Os professores entrevistados apresentaram razões para o facto da Geografia não estar a desempenhar o seu papel na EA, nomeadamente a redução da Geografia Física do programa do ensino secundário; outro factor referido é a separação da Geografia Física da Humana e, neste aspecto, os professores entrevistados consideram que a perspectiva ambiental pode funcionar como o elemento unificador.

Como se observa no quadro 8, o apuramento dos resultados dos questionários não confirma estas tendências, porque os professores inquiridos apresentam opiniões diferentes dos entrevistados, não referindo o ambiente como uma das prioridades do ensino da Geografia.

Quadro 8: Prioridades do ensino da Geografia, segundo os professores inquiridos

Opções

1ª opção

2ªopção

3ªopção

Total

%

Nº ordem

%

Nº ordem

%

Nº ordem

%

Nº ordem

Interligação de fenómenos

41

29

2

11º

72

Espacialização de fenómenos

26

29

16

71

Meio

13

8

16

37

Planeamento

2

11

13

26

Ordenamento

7

5

12

23

Gestão de recursos

1

4

11

16

Cultura geral

5

2

6

13

Estudar países ricos e pobres

1

6

3

10º

10

Ambiente

1

1

10º

7

9

Localização

2

3

4

8

10º

Estudar factos

-

-

2

6

8

10º

Fazer a guerra

1

-

-

-

-

1

12º

Fazer mapas

-

-

-

-

1

12º

1

12º

Fonte: Questionários aos professores (Q. III - 2.1)

A maioria considera a «interligação» e a «espacialização dos fenómenos», como as prioridades da disciplina (72% e 71% respectivamente), o que está de acordo com as características próprias da Geografia; as outras prioridades estão bastante afastadas das primeiras; parece existir um “esquecimento” dos temas do ambiente, que surgem mal posicionados.

É aqui que se centra o problema: a interligação e a espacialização são as especificidades da ciência geográfica, surgindo em posição de destaque; mas deveriam estar mais integradas nas questões actuais, das quais se salienta o estudo do meio, numa perspectiva ambiental. Enquanto os professores entrevistados salientam isto, nas suas entrevistas, os inquiridos parecem esquecer a aplicação destas especificidades. O objectivo principal do ensino da Geografia não deve ser formar investigadores ou técnicos, mas sim dotar os alunos de uma educação geográfica, que acabe com o “analfabetismo espacial”. Nesta perspectiva, o ensino da Geografia não deverá procurar formar investigadores e técnicos de planeamento mas antes, formar jovens que saibam compreender o mundo onde vivem, sabendo interligar e espacializar os diversos fenómenos.

Os professores consideram existir um contributo específico da Geografia (92%) para a EA, mas depois indicam diversos aspectos como componentes dessa especificidade.

Seleccionam como componentes dessa especificidade o «saber pensar o espaço» (35%) e a «territorialização» (17%) na primeira opção; no entanto surgem outras como a «visão global do mundo» com valores superiores (24%) e que não são componentes específicas da ciência geográfica, uma vez que muitas outras disciplinas podem dar o seu contributo.

A «territorialização» e o «saber pensar o espaço» são os aspectos onde o ensino da Geografia devia centrar as suas actividades porque, enquanto disciplina do ensino secundário, é a única que pode, efectivamente, dar um contributo nestas componentes tão importantes para a formação dos jovens.

Quando se seleccionam as especificidades, não se devia considerar todos os aspectos em que a Geografia pode contribuir, mas sim aqueles em que esta disciplina é única. Esta hierarquização parece não estar muito clara para os professores inquiridos, que continuam a querer «abarcar tudo», tornando mais difícil a afirmação da ciência geográfica em geral e da disciplina de Geografia em particular.

Ao longo deste trabalho verificou-se que os professores têm opiniões e perspectivas diferentes sobre a educação geográfica, sobre o ensino da Geografia e sobre a EA.

Algumas das ideias inferidas das entrevistas e dos questionários foram sujeitas a uma comprovação estatística, realizando um teste de fiabilidade à metodologia qualitativa, utilizada até aqui. Uma vez que se tratava de uma análise de diversas variáveis, tentando identificar a dependência entre elas (Bryman e Cramer, 1992) escolheu-se o teste qui-quadrado.

A aplicação do teste deu origem a uma série de tabelas de contingência que depois de analisadas permitiram a selecção dos valores relevantes. As características estruturais que condicionam as opiniões dos professores são: o ano de conclusão do curso, o modelo de formação e os anos de leccionação. Estas três variáveis vêm confirmar os aspectos referidos durante esta investigação como os mais determinantes nas diferentes maneiras de encarar o ensino da Geografia e a EA, ou seja, a formação inicial e a formação contínua bem como a experiência profissional do docente.

As opiniões que surgem associadas a um maior número de características estruturais dos entrevistados são: a frequência de cursos de EA e o trabalho com materiais do meio, onde foi visível a associação com todas as variáveis. Depois ligadas com as características mais condicionantes (ano de conclusão do curso, modelo de formação e anos de leccionação) surge a dificuldade na introdução da EA, bem como o conhecimento da componente ambiental no programa e nos exames, o que também vem confirmar o que já foi referido no capítulo anterior: o conhecimento que os professores têm do programa e dos exames revela muitas disparidades, que surgem agora associadas às características estruturais dos mesmos.

O desenvolvimento desta metodologia traria, por certo, outras pistas de trabalho interessantes, mas que não foram aprofundadas; o que se pretendeu com a aplicação deste teste foi a confirmação da existência de ligação entre as características estruturais dos professores inquiridos e as suas diferentes maneiras de pensar o ensino da Geografia e a EA.

Actualmente, a educação procura desenvolver nos alunos, valores éticos no campo da defesa do ambiente, visando a sustentabilidade do desenvolvimento. Nesta perspectiva, é decisivo o papel da EA, até porque as mudanças do mundo actual devem ser acompanhadas pela escola, emergindo o papel da EA ligada às preocupações da sociedade; neste contexto, é evidente a importância da educação na sociedade actual, bem como as suas diferentes funções.

O ensino da Geografia deve educar geograficamente as pessoas para o mundo onde vivem e não estar apenas vocacionado para formar futuros geógrafos. O que se pretende, independentemente do modelo de análise seleccionado (locativo, ambiental ou organizacional), é a transmissão dos valores absolutos e relativos da ciência geográfica. O ensino da Geografia deve organizar-se em torno dos seus conceitos básicos (daí que a estrutura curricular conceptual pareça a mais adequada), porque só assim será possível levar os alunos a «saber pensar o espaço» como defende Merenne-Schoumaker (1985), acabando com um certo «analfabetismo geográfico» que desaparecerá com a aquisição dos «reflexos geográficos» explicitados por Pinchemel (1989).

Em qualquer modelo de organização da ciência geográfica, ou com qualquer estrutura curricular, a gestão do programa cabe ao professor (de forma individual ou em grupo), ao transformar o currículo «planeado» em currículo «construído»; o professor constitui a figura central em todo o processo e é ele que introduz a perspectiva ambiental na planificação. Torna-se, por isso, importante, a maneira como os professores encaram o ensino da Geografia e o seu contributo na EA. A investigação mostrou que existem diferenças, quer na origem quer na forma, o que vai originar modos de contribuição da educação geográfica na EA, também muito diversas.

Ficou clara a possibilidade efectiva de um contributo do ensino da Geografia na EA; ele será tanto mais viável quanto maior for o conhecimento, por parte dos diversos agentes educativos (nomeadamente os professores de Geografia), dos vários níveis a que é possível a sua concretização.

A investigação mostrou como essas diferenças de opinião estão relacionadas sobretudo com o modo de ser de cada professor e com as suas vivências pessoais e profissionais. São os próprios professores (29%) que referem «o gosto do professor pelo tema», como factor mais importante para a implementação da EA. Os professores entrevistados, embora muito diferentes, enquanto profissionais, evidenciaram consenso quanto à importância da EA na educação actual, assim como quanto ao contributo da Geografia e ao modo de o concretizar. Os professores, que responderam ao questionário, apresentando características algo homogéneas, têm opiniões e posições muito díspares e até opostas, como se verificou. Se as diferenças de opinião constituem, à partida, um sinal de criatividade, apresentam também inconvenientes, uma vez que podem ser sintoma de alguma confusão quanto ao essencial e ao acessório da educação geográfico/ambiental. Apesar de considerarem a EA como fundamental, os professores não trabalham muito esta perspectiva, por diversas razões, que ficaram evidentes na análise das entrevistas e dos questionários, dos quais se destacam:

A planificação do processo ensino/aprendizagem baseia-se em três instrumentos, de forma quase equitativa (o programa, o manual e a experiência pessoal), quando o programa deveria ser o mais importante, até porque é aí que se pode identificar a componente ambiental.

A integração da componente ambiental está dependente do gosto de cada professor, que por sua vez trabalha de forma individual, sendo muito pouco importante o trabalho a nível do grupo disciplinar; como os próprios professores reconhecem, resulta daí alguma acomodação do corpo docente bem como a sua pouca flexibilidade, facilitando a repetição de “rotinas” e a dificuldade de inovação. A agravar esta situação está o fraco peso que os professores atribuem aos objectivos gerais, valorizando excessivamente outros elementos, como os conteúdos.

Na selecção de estratégias a utilizar, alguns professores consideram qualquer estratégia adequada, desde que facilite o desenvolvimento de atitudes e não apresente uma visão pessimista da realidade (esta pode desencadear uma posição fatalista por parte dos alunos, levando-os a não mudar de atitudes); mas a maioria dos inquiridos continuam a considerar o «levantamento de problemas» como a estratégia mais adequada, acabando por repetir o que faz a comunicação social e o que surge nos manuais.

A avaliação das temáticas ambientais apresenta um carácter pontual, mostrando que o ambiente ainda não entrou de forma sistemática na prática lectiva, senão estaria presente na avaliação e tal não acontece. Os professores também não conhecem bem os exames, os quais já apresentam, actualmente, uma forte componente ambiental.

O estudo do meio, reconhecido como fundamental para a introdução da EA, não é muito utilizado. Apesar de criticarem o manual de ensino, fazem dele um uso excessivo, bem como das notícias da comunicação social.

O gosto do professor pelo tema torna-se um elemento determinante da introdução da componente ambiental; é importante que a este gosto corresponda uma experiência reflectida e não a repetição de “rotinas”; só assim será possível uma reflexão sobre os objectivos do programa e depois sobre os conteúdos, de modo a fazer a selecção mais adequada. Para isso, a formação contínua é fundamental e deve orientar-se para a consolidação de grupos de trabalho de investigação, onde seja incentivada a reflexão sobre as “práticas”.

Por outro lado, a sensibilização (e muito raramente formação) dos professores resulta das vivências individuais de cada um e não duma reflexão e decisão consciente e sistemática do grupo disciplinar e muito menos da escola. As actividades apelidadas de EA não surgem como resultado dum efectivo investimento das instituições neste campo, mas sim como o resultado da vontade de alguns professores. Deste modo, o sistema educativo, através da escola, nunca consegue exercer um papel activo na EA; enquanto se deixar a EA entregue à decisão de cada professor e ao mesmo tempo não investir na formação dos professores nessa área, pouco se poderá avançar.

A sensibilização/preocupação dos professores pelas questões ambientais está associada à sua formação académica e profissional assim como à sua experiência (como demonstrou a aplicação do teste de qui-quadrado), um maior investimento na formação dos professores nesta área, traria consequências positivas para a EA.

Apesar do longo caminho que há para percorrer, a investigação revelou mudanças na educação de hoje, no sentido duma nova ética ambiental, inserida num campo mais vasto que é a educação para o desenvolvimento. As questões ambientais podem e devem ser abordadas por todas as disciplinas e sob diversos ângulos e pontos de vista; trata-se duma temática transdisciplinar, mas onde a Geografia tem o contributo específico de a territorializar e analisar de uma forma multidimensional.

É urgente a reflexão, tendo em vista a busca de soluções, para que se sistematize a componente ambiental no ensino da Geografia e a sua efectiva contribuição para a EA.

Enquanto cada professor continuar a ter uma perspectiva demasiado pessoal do que pretende, sem a confrontar com ninguém, sem trabalhar em grupo, sem reflectir sobre o programa e as suas práticas, vai manter-se um ensino da Geografia desarticulado, que tanto pode efectuar uma verdadeira educação geográfico/ambiental, como pode continuar a ser a disciplina descritiva e de carácter enciclopédico herdada do passado.

Um dos objectivos fundamentais da educação geográfica é o conhecimento da problemática social e ambiental dos diferentes lugares do mundo (Souto González, 1998) e é nesse sentido que o ensino da Geografia se deve orientar, superando as suas principais dificuldades, que são idênticas às das restantes disciplinas: os dois grandes males que debilitam o ensino e restringem o seu rendimento são: a rotina, sem inspiração nem objectivo e a improvisação confusa e sem ordem (Mattos, 1960, in Bordenave, 1983: 71).

A educação geográfica tem um contributo importante na educação ambiental, consciencializando os alunos do impacte do seu próprio comportamento, fornecendo-lhes informação rigorosa e ajudando-os a desenvolver capacidades que lhes permitam tomar decisões fundamentadas relativas ao ambiente, contribuindo para o aparecimento duma nova ética relativa ao ambiente, que guie as suas acções.

 

Bibliografía

ALBERTO, Alzira. O contributo da Educação geográfica na Educação Ambiental, o caso da Geografia no ensino secundário, Lisboa: Centro de Estudos Geográficos, 2001

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BORDENAVE, J.D. e PEREIRA, A.D. Estrategias de Ensino-Aprendizagem, Petrópolis: Vozes, 1983

BRYMAN, A. e CRAMER, D. Anàlise de dados en Ciências Sociais, Oeiras: Celta Editores, 1992

Comissão da Educação Geográfica – Carta Internacional da Educação Geográfica, Lisboa, Associação dos Professores de Geografia, 1992

Garcia, M. El pensamiento del professor, Barcelona: CEAC, 1987

GRAVES, N. - La enseñanza de la Geografía, Madrid, Ed.Visor, 1985

MERENNE-SCHOUMAKER, B. - Savoir penser l’espace. Pour un renouveau conceptuel et méthodologique de l’enseignement de la Géographie dans le secondaire, L’information Géographique, nº49, 1985, pp.151/60.

PIAGET, Jean. Para onde vai a educação, Lisboa: Livros Hoprizonte, 1978.

pinchemel, p. Fines y valores de la Educacion Geográfica, in Graves, N. - Nuevo método para la enseñanza de la Geografía, Barcelona: Teide, 1989, pp. 7/23.

SOUTO GONZÁLEZ, Xosé Manuel. Proyectos Curriculares y didáctica de Geografía, Geocrítica nº85, 1990, Universidad de Barcelona, pp. 3/43.

SOUTO GONZÁLEZ, Xosé Manuel. Didáctica de la Geografía, Barcelona: Ed. del Serbal, 1998

ZABALZA, M. Planificação e Desenvolvimento Curricular na Escola, Lisboa: Ed. Asa, 1996



© Copyright Alzira Filipe Alberto, 2002
© Copyright Scripta Nova, 2002

Ficha bibliográfica:
FILIPE ALBERTO, A.
O contributo da educação geográfica na Educação Ambiental. O caso da Geografia no Ensino Secundário. Scripta Nova. Revista electrónica de geografía y ciencias sociales, Universidad de Barcelona, vol. VI, núm. 114, 15 de mayo de 2002. http://www.ub.es/geocrit/sn/sn-114.htm[ ISSN: 1138-9788]


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