REVISTA BIBLIOGRÁFICA DE GEOGRAFÍA Y CIENCIAS SOCIALES Universidad de Barcelona ISSN: 1138-9796. Depósito Legal: B. 21.742-98 Vol. XIXI, nº 1075, 25 de mayo de 2014 [Serie documental de Geo Crítica. Cuadernos Críticos de Geografía Humana] |
PLANOS
DIRETORES PARTICIPATIVOS E GESTÃO URBANA EM CIDADES
MÉDIAS SOB O ESTATUTO DA
CIDADE
Jefferson O.
Goulart
Universidade
Estadual Paulista (GAAC/UNESP)
Eliane T. Terci
Universidade
Metodista de Piraciba (UNIMEP)
Estevam V. Otero
Universidade
Metodista de Piracicaba (UNIMEP)
Recibido:
29 de marzo de 2013; devuelto para revisión: 25 de mayo de 2013; aceptado 15 de
octubre de 2013
Planos diretores participativos e gestão urbana em cidades médias sob o estatuto da cidade (Resumo)
O trabalho analisa a implantação do novo marco regulatório da politica urbana brasileira, sintetizado pela Constituição Federal de 1988 e sua posterior regulamentação através do Estatuto da Cidade (Lei Federal nº 10.257/2001). A análise empírica se concentra em três cidades médias do interior do estado de São Paulo (Piracicaba, Bauru e Rio Claro), e aborda três dimensões complementares. Primeira: interpreta os processos participativos que resultaram nos novos Planos Diretores. Segunda: analisa a crise do modelo desenvolvimentista para compreender as transformações experimentadas pela rede urbana brasileira, através dos quais as cidades de porte médio assumiram crescente relevância econômica. Terceira: examina a inclusão e regulamentação das Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS) e como este instrumento vem sendo utilizado no enfrentamento do passivo urbano e do déficit habitacional. Para além de considerações normativas, o estudo pretende avaliar a efetiva contribuição do Estatuto da Cidade na democratização da gestão urbana.
Palavras chave: estatuto da cidade, planos diretores participativos, gestão urbana, ZEIS.
Planes de ordenación urbana participativos y gestión urbana en ciudades intermedias bajo el estatuto de la ciudad (Resumen)
El artículo analiza la aplicación del nuevo marco regulador de la política urbana brasileña, sintetizado por la Constitución de 1988 y su posterior reglamentación por el Estatuto de la Ciudad (Ley Federal No. 10.257/2001). El análisis empírico se centra en tres ciudades intermedias del estado de São Paulo (Piracicaba, Bauru y Rio Claro), en tres dimensiones complementarias. Primera: interpreta los procesos participativos que resultaran en los nuevos Planes de Ordenación Urbana. Segunda: analiza la crisis del modelo desarrollista para la comprensión de las transformaciones en la red urbana brasileña, con creciente relevancia económica de las ciudades intermedias. Tercera: examina la reglamentación de las Zonas Especiales de Interés Social (ZEIS) y como este instrumento ha sido utilizado para enfrentar los problemas urbanos y la escasez de vivienda. Además de las consideraciones normativas, se busca evaluar la efectiva contribución del Estatuto de la Ciudad en la democratización de la gestión urbana.
Palabras clave: estatuto de la ciudad, planes de ordenación urbana participativos, gestión urbana, ZEIS.
Participative master plans and urban management in medium-sized cities under the statute of the city (Abstract)
The paper analyzes the implementation of the new regulatory framework of urban policy in Brazil, synthesized by the Constitution of 1988 and its subsequent regulations by the Statute of the City (Federal Law No. 10.257/2001). The empirical analysis focuses on three medium-sized cities in the state of São Paulo (Piracicaba, Bauru and Rio Claro), and addresses three complementary dimensions. First: interprets the participatory processes that resulted in the new Master Plan. Second, analyzes the crisis of the developmental model for understanding the transformations experienced by the Brazilian urban network, through which the medium-sized cities took on increasing economic relevance. Third: examines the inclusion and regulation of Special Zones of Social Interest (ZEIS) and how this instrument has been used in dealing with urban problems and the housing deficit. Apart from normative considerations, the study aims to assess the actual contribution of the City Statute in the democratization of urban management.
Keywords: statute of the city, participative master plans, urban management, ZEIS.
A implantação do novo marco regulatório da política urbana no Brasil – sintetizado pela Constituição Federal de 1988 e por sua posterior regulamentação, a Lei Federal nº 10.257/2001 (Estatuto da Cidade) – ensejou novas possibilidades para a pesquisa sobre o desenvolvimento urbano contemporâneo do país. Aqui o fazemos por meio da investigação empírica de cidades médias do interior do estado de São Paulo: Piracicaba, Bauru e Rio Claro. Os resultados preliminares resultam de pesquisa financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), a saber: “Processos contemporâneos de desenvolvimento urbano em cidades médias: Estatuto da Cidade, expansão imobiliária, engrenagem econômica e dinâmica decisória político-institucional [2001-2011]” (Processo 2011/14082-3).
Registre-se inicialmente que os estudos sobre a configuração urbana brasileira focalizaram majoritariamente as grandes cidades e regiões metropolitanas. A tradição é compreensível porque nesses territórios estiveram concentrados os núcleos dinâmicos dos processos de industrialização e urbanização do país e a maior parte da população, especialmente a partir da segunda metade do século XX.
Não obstante, a tendência de homogeneização do objeto não capta a multiplicidade de variáveis que compõem o mosaico urbano brasileiro. Certamente há características comuns – especulação imobiliária, dinâmica de segregação socioespacial balizada pela clivagem centro-periferia etc. –, mas é forçoso reconhecer que há múltiplos urbanos. As diferenças têm várias expressões e determinações: clivagens regionais, formato político-institucional, escala, peso econômico, configuração socioeconômica, especificidades territoriais etc.
Para essa involuntária imprecisão analítica também concorreu a dinâmica federativa brasileira, cujo histórico é marcado por longos períodos de centralização que concentraram recursos de poder ao nível da União (prerrogativa decisória, instrumentos de políticas públicas, orçamento etc.), com clara desvantagem para os níveis subnacionais. Nesse cenário, o urbano no Brasil seria explicado sob a investigação das grandes aglomerações, onde estariam expostas e condensadas todas as nossas contradições urbanas e seus contenciosos mais explosivos.
Os dados do Censo de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) confirmam que o Brasil consolidou-se como um país urbano: praticamente 85 por cento da população vivem nas cidades, invertendo a proporção do início do século XX. Não obstante, ainda se conhece relativamente pouco sobre os processos de urbanização de cidades que não se situam nas grandes regiões metropolitanas.
Esta pesquisa, ainda em estágio intermediário, adota como base empírica um estudo comparativo sobre cidades médias importantes do interior do estado de São Paulo – a mais dinâmica unidade federativa do país que concentra praticamente 1/3 do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. Em que pesem outros esforços para redefini-las conforme critérios que vão além da escala populacional relacionando também “funções e, principalmente, o papel que desempenham na rede urbana regional, nacional e internacional”[1], tomaremos como parâmetro a distinção demográfica adotada pelo IBGE, segundo a qual municípios de porte médio têm população entre 100 mil e 500 mil habitantes.
Essa escolha metodológica do objeto permite esboçar comparações mais apropriadas para as variáveis selecionadas: processo político-institucional, engrenagem econômica e dinâmica imobiliária. Além disso, as cidades selecionadas polarizam as microrregiões das quais são sedes e comportam variáveis comparáveis pelas escalas e pelos perfis socioeconômicos relativamente similares.
A magnitude do escopo tem como contrapartida a expectativa de formular hipóteses explicativas mais abrangentes sobre os processos recentes de desenvolvimento urbano em razão dos elos e relações de interdependência entre as mencionadas variáveis. Análises que se resumem à dimensão espacial, embora possam esclarecer muito sobre os interesses fundiários e a dinâmica imobiliária, não capturam necessariamente os interesses econômicos que as determinam, desconhecem as correspondentes disputas sociais e tampouco se articulam às dinâmicas decisórias que envolvem diferentes atores e imposições institucionais (normas, leis, governos etc.).
A escolha do recorte cronológico (2001-2011) não foi casual. Se antes se repetia ad nauseam que o problema central do desenvolvimento urbano no Brasil era “falta de planejamento” – afirmação no mínimo discutível em razão dos padrões de intervenção e regulação praticados pelo poder público –, a última década é marcada pela implantação de um marco regulatório singular para o desenvolvimento urbano: o Estatuto da Cidade, paradigma cuja originalidade reside no reforço das prerrogativas dos municípios, na exigência de mecanismos participativos nas decisões públicas e na subordinação da lógica urbana às funções sociais da cidade e da propriedade. Dez anos após sua aprovação como regulamentação do capítulo de Política Urbana da Constituição Federal (artigos 182 e 183), já é possível esboçar as primeiras avaliações sobre a implantação desse arranjo institucional efetivamente inovador e analisar as generosas expectativas geradas pelo Estatuto da Cidade.
O texto está
organizado da seguinte forma: na primeira parte, faz-se um breve histórico da
emergência do tema da participação e do colapso do modelo desenvolvimentista e
de seus impactos nos processos de desenvolvimento regional e urbano que se
processaram dos anos de 1970 a 1990. Na segunda seção, examinamos a evolução
das cidades médias, fazemos a caracterização socioeconômica dos municípios
selecionados e tratamos empiricamente das experiências participativas que
resultaram nos novos Planos Diretores. Na terceira seção, analisamos mais
detidamente a implantação do instrumento das Zonas Especiais de Interesse
Social (ZEIS). Ao final, esboçamos algumas explicações provisórias sobre a
efetiva capacidade do Estatuto da Cidade em democratizar a gestão urbana e
apontamos os obstáculos e variáveis que têm se revelado mais salientes no
período contemporâneo.
Mudanças profundas nas décadas de 1970 a 1990
O Brasil passou por profundas transformações no século XX. De país agrário-exportador, o modelo de substituição de importações lhe permitiu alcançar a posição de oitava economia mundial com feição nitidamente urbano-industrial. Em fins da década de 1950 e início do decênio seguinte a agenda política do país comportava um conjunto de mudanças estruturais necessárias à sua modernização, em cuja pauta das reformas de base já figurava a reforma urbana.
Com a instalação do regime autoritário, em 1964, liberdades foram suprimidas, movimentos sociais criminalizados e o processo político reassumiu um formato elitizado. Já o fim da ditadura, 21 anos depois, não foi apenas uma modificação político-institucional de regime político (de uma ditadura para uma democracia), mas também uma alteração do modelo de desenvolvimento dado pelo colapso do padrão nacional-desenvolvimentista, além de exprimir um fecundo movimento de democratização originário da própria sociedade[2].
Assim emergiram novos protagonistas que alteraram o ritmo e o alcance da transição democrática: movimentos por moradia, creche, direitos trabalhistas, de gênero, contra a carestia, pela anistia etc. De modo geral, se distinguem, de um lado, por reclamam acesso a direitos e inserção no sistema de difusão bens e serviços e, de outro, por desafiarem e romperem com os limites impostos pelo regime autoritário.
Nesses termos, o tema da participação assume uma importância crescente e também ganha destaque o inevitável conflito entre a política institucional e a política não institucionalizada, embora suas fronteiras não sejam facilmente delimitáveis. Para os movimentos sociais, essa ambivalência era percebida basicamente na tensão entre duas concepções: na primeira, mais flexível e aberta à sua própria institucionalização, vigorava uma visão “integrativo-corporativa, pela qual buscavam conquistar maiores níveis de integração social pelo acesso a bens e serviços”; já a segunda visão, mais basista e antiestatal, exprimia a “face expressivo-disruptiva, pela qual se manifestam valores morais ou apelos ético-políticos tendentes a deslegitimar a autoridade política”[3].
Nesse cenário, a participação societária no processo constituinte (1986-1988) pode ser explicada por várias determinações. Em primeiro lugar pelo contexto histórico que marca a ascensão de inúmeros grupos de interesse, movimentos e entidades civis com larga capacidade organizativa[4]. Em segundo, pela crise de hegemonia daquele momento que não se circunscreve à obtenção de maiorias parlamentares, mas que diz respeito à incapacidade de se impor determinada concepção de mundo[5]. Terceiro (desdobramento do item anterior), pelas escolhas procedimentais dos constituintes, que recusaram a adoção de um anteprojeto constitucional e optaram por uma dinâmica descentralizada baseada em comissões temáticas e subcomissões, além de admitirem o instrumento da emenda de iniciativa popular[6].
A nova Constituição incorporou um inédito capítulo dedicado à Política Urbana (artigos 182 e 183), e a porosidade desse processo se estendeu ao escopo da reforma urbana – objeto de emenda de iniciativa popular (nº 63) encaminhada pela Federação Nacional dos Engenheiros, Federação Nacional dos Arquitetos e Instituto de Arquitetos do Brasil, a qual obteve 133.068 assinaturas.
Mesmo modificada – e uma das mais significativas dessas mudanças foi a exigência do Plano Diretor para municípios com mais de vinte mil habitantes como “instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana” (Art. 182, §1º) –, a proposta foi ratificada. As inovações não são de pequena monta: foi inscrito um enunciado decisivo que subordina o direito de propriedade à sua função social.
Treze anos depois, tais enunciados foram regulamentados através da Lei Federal nº 10.257/2001 (Estatuto da Cidade). Esse marco regulatório impôs formas participativas de formulação e implantação de políticas públicas de gestão urbana, indicando instrumentos como Planos Diretores Participativos, audiências públicas, conselhos etc., cujo objetivo central consiste em alargar os espaços decisórios para além das autoridades eleitas pelo sufrágio (Executivo e Legislativo). A agenda setting da participação assumiu um formato mais preciso a partir do Estatuto da Cidade, como de resto aconteceu em diversas outras regulações de políticas públicas (saúde, educação etc.).
Esses avanços anunciam o formato a ser assumido pela participação, isto é, de movimentos autônomos da sociedade civil se passa progressivamente a instrumentos participativos incorporados às instancias de poder. Em suma, a participação se institucionaliza[7] e desloca-se para as arenas decisórias vinculadas ao Estado impondo uma combinação entre as instituições e os padrões clássicos da democracia representativa (eleições, partidos políticos, processo decisório compartilhado entre Executivo e Legislativo) e as novas formas participativas orientadas pela ampliação dos decisores (conselhos gestores de políticas públicas, audiências públicas, conferências, órgãos colegiados de política urbana, iniciativa legislativa popular etc.). A participação passou a ser mais regrada e assumiu um formato híbrido combinando ingredientes representativos tradicionais e outros inovadores.
No entanto, diferente de certa vocalização ainda difundida, não adotamos a noção de “democracia direta” para o caso da participação na gestão urbana. Em sentido estrito, para que haja “democracia direta” nos termos em que a expressão designa, seria necessária uma modalidade de processo decisório em que não houvesse rigorosamente nenhuma intermediação ou intermediários entre os decisores e as decisões tomadas[8].
Não só a participação de que se trata não é efetivamente direta porque envolve múltiplas mediações (representantes, regras restritivas, atores estatais e societários, imposições jurídicas, número limitado de decisores etc.), como assume caráter representativo pelo fato de que os agentes a tomarem parte dos processos decisórios também representam interesses e agem nessa condição mediante delegação de mandatos, cuja investidura, embora não seja idêntica ao sistema eleitoral, implica transferência decisória, alcance limitado, tempo de incumbência e outras restrições. Em síntese, conselheiros, delegados e outros também são portadores de delegação de interesses mediante representação, de modo que não é definitivamente o povo que participa das decisões, e sim seus representantes[9].
Em contraponto à tradição excludente da política brasileira, fórmulas inovadoras de tomada de decisões que alargam o universo de decisores são promissoras porque aprimoram o sistema democrático. Em outros termos, a perspectiva liberal-pluralista da democracia que a resume a método restrito aos eleitos pelo sufrágio é insuficiente para absorver novos atores e os correspondentes processos participativos, embora os termos e o alcance dessa participação precisem ser examinados criteriosamente.
Desconcentração econômica, crise do desenvolvimentismo e transformações na rede urbana
Se as mudanças políticas foram muitas e profundas no mesmo período, as décadas de 1980 e 1990 também realçam o esgotamento do projeto desenvolvimentista que se firmou no Brasil desde os anos de 1950, cujas características centrais foram o planejamento e a liderança do Estado no enfrentamento dos dilemas estruturais das economias do capitalismo periférico. A mudança já havia sido sinalizada na “década perdida” (1980), mediante recessão mundial, crise fiscal, endividamento externo e inflação que paralisaram o Estado nos países subdesenvolvidos.
Naquele contexto, o desenvolvimentismo deu lugar a uma série de planos e medidas de ajuste visando à estabilização monetária e ao equilíbrio das contas externas que inviabilizam as políticas e reformas estruturais. Na esfera regional, a nova conjuntura implicou o abandono das políticas de desconcentração industrial[10]. O vácuo deixado pela ausência de política regional não provocou, contudo, uma reconcentração como se poderia imaginar.
Essa nova orientação vincula-se a dois eventos simultâneos e complementares daquela conjuntura que polarizaram a condução da política econômica e se impuseram como alternativa ao desenvolvimentismo: a globalização e a reestruturação produtiva. A globalização impôs austeridade fiscal e um modelo de Estado mínimo como condições para acesso aos recursos e investimentos externos e a retomada do desenvolvimento. Já a reestruturação produtiva procurou reverter as debilidades do parque industrial brasileiro frente à nova agenda da inovação tecnológica em curso desde os anos 1980, cuja forma impactou fortemente as cidades na medida em que a elevação da produtividade – através da redução de custos, incentivos e subsídios fiscais, e conquista de externalidades positivas – alterou a geografia dos negócios[11]. Isto também implicou mudança na relação entre Estado e empresariado, permitindo articulações em torno de projetos público-privados, combinando desenvolvimento urbano e estratégia empresarial de utilização de recursos locais consolidados na criação de clusters de empresas, parques tecnológicos, Arranjos Produtivos Locais (APLs) e novos distritos industriais[12].
Em interpretação crítica, esse movimento guarda semelhança com o empresariamento da gestão urbana, caracterizado pelo acirramento da competição interurbana que distinguiu os ajustes neoliberais de países centrais, particularmente Grã Bretanha e Estados Unidos[13]. Ou seja, mediante a crise fiscal e consequente descompromisso do Estado com a agenda do welfare, administrações locais passaram a compartilhar o desafio do pleno emprego concedendo incentivos e benefícios diversos para facilitar e atrair os investimentos privados, facilitando assim o reposicionamento destes interesses.
No Brasil, orientação semelhante já havia sido adotada nos anos 1970, no bojo da política de desconcentração industrial do II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), quando os governos locais promoveram ações para atrair os investimentos privados por meio de construção dos distritos industriais, provisão de infraestrutura, edificação de bairros operários, dentre outros instrumentos, complementando as iniciativas dos governos federal e estaduais que se pautaram principalmente pela construção dos corredores rodoviários, oferta de incentivos fiscais e subsídios. A partir dos anos 1980, com a crise fiscal e o endividamento externo que paralisaram o Estado, essas estratégias se subordinaram às políticas de estabilização e à solução do desequilíbrio externo, ressurgindo com roupagem nova a partir dos anos 1990 com a reestruturação produtiva. Assim, o empresariamento da cidade – que inicialmente assumiu as formas contestáveis da renúncia fiscal, concessão de terreno público e infraestrutura gratuita – a partir dos anos 1990 passou a ter contornos mais sofisticados e menos controversos com as parcerias público-privadas e construção dos Parques Tecnológicos e dos Arranjos Produtivos Locais.
Com o objetivo de promover a desconcentração industrial e a interiorização do desenvolvimento econômico – constrangida até os anos 1970 pela ausência de uma rede urbana adequadamente estruturada[14] –, foram formulados os Planos Nacionais de Desenvolvimento. Parte integrante do II PND, a Política Nacional de Desenvolvimento Urbano (PNDU) previa como estratégia regional o “reforço das cidades de porte médio”[15], contrapartida fundamental para desconcentrar as regiões metropolitanas. O fortalecimento das cidades médias como polos de desenvolvimento tornou-se um dos pontos centrais, promovendo desenvolvimento mais equilibrado associado aos benefícios das economias de aglomeração.
Esse movimento de desconcentração, entretanto, foi limitado. No início dos anos 1990 constata-se que a desconcentração econômica se restringiu à área delimitada por Belo Horizonte-Uberlândia-Londrina/Maringá-Porto Alegre-Florianópolis-São José dos Campos-Belo Horizonte, abarcando praticamente a totalidade do interior paulista, denominado “novo polígono de aglomeração industrial”[16].
Este era, à época, um dos poucos espaços do território nacional que continha um conjunto de cidades médias articuladas em rede, decorrência de seu desenvolvimento estreitamente vinculado à expansão do “complexo cafeeiro”, entre fins do século XIX e início do XX[17]. Disso decorre que o interior paulista já se configurava, em 1939, como uma das principais regiões industriais, com 14,4 por cento de participação no Valor de Transformação Industrial (VTI) do país, atrás apenas da Região Metropolitana de São Paulo [RMSP] (26,3%) e do estado do Rio de Janeiro (25,5%). Em 1970 a participação do interior paulista pouco havia se alterado (14,7%), com ampliação da importância da metrópole (43,5%) e expressiva redução fluminense (15,5%). Em 2004 o interior paulista já representava o mais importante conjunto industrial do Brasil, com 26,2 por cento do VTI nacional, enquanto a Região Metropolitana de São Paulo caiu e ficou em segundo lugar (16,9%)[18].
Os principais fatores promotores da expansão industrial em direção ao interior paulista a partir da década de 1970[19] foram: 1) as deseconomias de aglomeração da metrópole, envolvendo altos custos de produção e mão de obra, mobilidade precária, poluição e crescimento da mobilização sindical; 2) as políticas estaduais de descentralização, especialmente as melhorias na infraestrutura rodoviária; 3) as políticas municipais de atração industrial, envolvendo a concessão de vultosos benefícios e incentivos públicos; 4) as políticas federais de incentivo às exportações e o Programa Nacional do Álcool (Proálcool), por meio de subsídios federais; e 5) os grandes investimentos federais em indústrias de base e em centros de pesquisa.
Nesse processo sobressai o papel desempenhado pelas cidades médias, palco do “espraiamento espacial da riqueza nacional”[20] a partir dos anos 1970, especialmente as de melhor infraestrutura que se beneficiaram da relocalização industrial. Os municípios aqui analisados – Piracicaba, Rio Claro e Bauru – tiveram expressivo crescimento dos índices de emprego industrial e do VTI no período[21].
Os anos 1990 constituem ponto de inflexão decisivo para essa nova configuração urbana. A eleição de Collor de Melo e a adesão ao receituário neoliberal, principalmente a abertura econômica e a política de reestruturação industrial, contribuíram fortemente para a alteração geográfica dos negócios. Castro[22] esquematiza os principais traços desse processo a partir da estabilização monetária de 1994 (Plano Real)[23]: 1) adoção de métodos modernos de gestão para atender padrões internacionais de eficiência; 2) modernização/diversificação da linha de produtos ajustando a oferta às novas exigências do mercado doméstico; e 3) deslocamento de fábricas para áreas e regiões portadoras de economias de aglomeração (infraestrutura, mão-de-obra e matérias primas baratas, incentivos fiscais etc.).
Ao final dos anos 1990 o quadro urbano-regional nacional havia sido alterado, observando-se um peso cada vez maior dos “centros urbanos médios, e espraiamento do fenômeno de consolidação de aglomerações urbanas não-metropolitanas”[24], direcionados ao interior e favorecidos pelas correspondentes rodovias: Carvalho Pinto/Presidente Dutra no sentido do Vale do Paraíba e o complexo Anhanguera/Bandeirantes em direção a Campinas e Ribeirão Preto.
Esses eixos articulavam uma rede de cidades médias, cuja ascendência econômica vinha acompanhada de expressiva expansão demográfica, evoluindo para uma estrutura “hierarquicamente mais equilibrada”[25], decorrência direta da “interiorização da rede urbana”:
Essa complexidade, que expressa a desconcentração das atividades produtivas e o surgimento de novos espaços economicamente dinâmicos, configura-se em função das peculiaridades da estrutura produtiva e de especificidades físico-espaciais que modelam distintamente o território construído.[26]
Entre 1970 e 2000 os municípios com população entre 100 mil e 500 mil habitantes ampliaram bastante sua participação na distribuição da população brasileira. O conjunto das cidades médias não-metropolitanas passou de 10,295 milhões de pessoas, em 1970, para 20,157 milhões, em 1991[27], fenômeno que os autores associam aos efeitos da desconcentração concentrada da indústria iniciada a partir dos anos 1970.
A expressão conceitual desconcentração concentrada, adotada por vários autores, sintetiza o processo de interiorização da indústria circunscrita a uma limitada porção do território brasileiro, o que figurava, inclusive, como uma das diretrizes do II Plano Nacional de Desenvolvimento, com a "concentração regional com contenção das metrópoles nacionais e reforço das cidades de porte médio”[28]. Longe de representar um processo de “reversão da polarização”, como ocorrido em diversos países industrializados, esse processo “estaria mais próximo de um espraiamento da indústria dentro da área mais industrializada do País”[29], assemelhando-se a uma “suburbanização das atividades industriais” em direção às cidades localizadas “dentro do campo aglomerativo da grande região industrial brasileira”[30], num raio de até 150 km da Região Metropolitana de São Paulo, como definido por Azzoni.
Em reconhecimento ao papel polarizador de São Paulo, Diniz[31] amplia essa área e a denomina “polígono de aglomeração industrial”, já citado anteriormente. Enfocando especificamente o interior paulista, Negri[32] e Cano[33] também analisam a impossibilidade de reversão dessa concentração face às próprias raízes da concentração industrial em São Paulo. Em análise mais recente, Lencioni[34] observa que a desconcentração territorial da produção não diminuiu o papel da cidade de São Paulo; pelo contrário, “afirma e desenvolve sua centralidade”, fenômeno que a autora define como “expansão da concentração”[35].
O aumento do peso relativo das cidades inseridas naquela faixa demográfica também pode ser verificado no estado de São Paulo. O incremento populacional no interior entre 1970 e 2000 se deu, sobretudo, nas cidades médias, ampliando sua participação na população estadual de 22 por cento para 29,7 por cento. Entre 1991 e 2000 a população do interior cresceu a uma taxa de 1,9 por cento ao ano (a.a.), enquanto na metrópole o crescimento anual foi inferior (1,6%). As Regiões Administrativas de Campinas e de Sorocaba apresentaram o maior crescimento populacional no período (2,3% a.a.), seguidas das de São José dos Campos e Santos (2,1% a.a.)[36]. Estudo realizado pelo Núcleo de Estudos de População da Universidade Estadual de Campinas (NEPO-UNICAMP) confirma a tendência de crescimento e o potencial de atração dessas regiões: do crescimento populacional da Região Metropolitana de São Paulo entre 2000 e 2007, apenas 10 por cento deveu-se à migração, em contraste com o ritmo elevado da década de 1970 (51%). Já nas regiões interioranas o peso da migração foi significativamente superior: na região de Bauru, por exemplo, a migração no período 2000-2007 foi responsável por 43 por cento do crescimento populacional[37]. Essa evolução “fortalece as funções de algumas aglomerações do interior que ampliaram sua centralidade na rede urbana estadual”[38].
O aumento do peso econômico e demográfico dessas aglomerações também se fez acompanhar da migração dos problemas urbanos metropolitanos, que passaram a ser observados em grande parte desses centros urbanos a partir de então[39]. A intensificação do processo de industrialização promovido pelo II PND, sob os auspícios do governo autoritário, ainda que modernizasse o país, não produziu melhores indicadores sociais; ao contrário, a maior concentração urbana não foi acompanhada de investimentos em educação, saúde e mesmo qualificação da mão de obra: “com isso, e com o enfraquecimento dos sindicatos trabalhistas, deteriorou-se o salário real e piorou a distribuição da renda – bom para o crescimento imediato, péssimo para o futuro do país”[40].
Cidades Médias, Estatuto da Cidade e Participação
Piracicaba, Bauru e Rio Claro são cidades médias do interior paulista, exemplos da trajetória descrita anteriormente.
Com uma população de 364.504 habitantes[41], taxa de urbanização de 97,33 por cento, vasta extensão territorial e alta concentração urbana, Piracicaba foi uma das sedes regionais que mais se beneficiou de um dos programas prioritários do II Plano Nacional de Desenvolvimento, o Programa Nacional do Álcool (Proálcool). Município de perfil canavieiro, polarizava importante complexo sucroalcooleiro com as lavouras de cana, usinas processadoras e pujante setor metal-mecânico produtor de máquinas e equipamentos para usinas açucareiras e destilarias.
Sua evolução acompanha o processo de urbanização do país, reproduzindo os contrastes de uma industrialização dinâmica de efeitos urbanísticos dramáticos, sob a cumplicidade do poder público. Sob o impulso da interiorização da indústria, bem como no intuito de se servir das estratégias de desconcentração, Piracicaba deu inicio à instalação de seu primeiro distrito industrial – a Unidade Industrial Leste (UNILESTE) – consolidado em meados dos anos 1970. Com localização privilegiada, no acesso à Rodovia Luiz de Queiroz, e contando com toda sorte de incentivos fiscais e tributários, além de cessão de terreno, água e esgoto, atraiu grandes empresas multinacionais do porte da Caterpillar e Philips, atendendo às expectativas das elites locais de diversificar seu parque industrial.
Conforme o censo industrial de 1980, a indústria era a maior empregadora de Piracicaba, contando com 749 estabelecimentos industriais que empregavam 24.428 pessoas (63,24 por cento da força de trabalho), sendo a indústria mecânica a responsável por grande parte do pessoal ocupado (37,1%), seguido da metalúrgica (17,57%)[42]. A conjuntura dos anos 1990, seguindo a abertura e reestruturação produtiva[43], altera esse quadro, tanto na empregabilidade – com o setor serviços superando o industrial (49.472 e 39.413 respectivamente, seguido do comércio com 29.638) – como na participação no valor adicionado, com o setor comércio e serviços passando a representar 56,7 por cento. Ainda assim, a indústria é a grande força do município, e coloca Piracicaba na 9ª posição no ranking de geração de empregos industriais do estado de São Paulo[44].
A expansão industrial e o processo migratório intensificaram a urbanização, o encarecimento do solo urbano e a favelização: em 1979 havia 22 núcleos de favelas com população de 10 mil pessoas passando, em 1992, a 53 favelas, onde viviam 22 mil pessoas. A renda familiar de 92 por cento dessa população ficava na faixa de 1-3 salários mínimos. A tentativa de remoção das favelas, geralmente localizadas em áreas públicas, através de ações como as do Programa de Financiamento de Lotes Urbanizados (Profilurb)[45], provocou resistência e mobilização, pois o projeto previa assentamento em regiões mais afastadas sem infraestrutura, enquanto a reivindicação dos moradores era pelo assentamento nos locais ocupados[46].
O crescimento econômico e demográfico do período resultou na expansão do perímetro urbano, acompanhada da periferização das camadas de baixa renda em ocupações fragmentadas, precárias e descontínuas, especialmente nos bairros a norte e sudoeste. Aí se concentravam “a pobreza, a precariedade habitacional e a presença de imóveis sub-normais”[47]. Ao mesmo tempo aumentaram os vazios urbanos e ocorreu uma tendência ao esvaziamento da área central. Tal quadro de segregação socioterritorial confirma os padrões típicos da urbanização brasileira, marcado por vazios urbanos, precariedade de infraestrutura, habitação precária e baixíssimos índices de qualidade de vida[48].
Bauru, com população de 343.659 habitantes e taxa de urbanização de 98,5 por cento[49], está localizada em lugar central privilegiado do estado de São Paulo, valendo-lhe a qualificação de “cidade sem limites”. Sua formação econômica remonta à implantação das ferrovias, processo que conduziu a expansão cafeeira rumo ao oeste paulista e ao qual se deve a importância econômica da cidade até o final da década de 1950, tornando-a o mais importante “entroncamento ferroviário” do estado. Posteriormente o apelido de “entroncamento rodoviário” se acrescenta à sua imagem: “durante pelo menos vinte anos, entre meados das décadas de 1960 e 1980, ferrovia e rodovia foram transportes significativos para Bauru e deram suporte à imagem de entroncamento”[50].
Era “industrial” o adjetivo que as elites e a classe média bauruenses, tendo à frente as lideranças políticas dos anos 1950-60, pretendiam agregar à imagem da cidade, numa adesão incondicional ao ideário desenvolvimentista da época e num momento bastante propício em que o governo paulista começava a investir na desconcentração da indústria. Seriam três as potencialidades locais alardeadas insistentemente de modo a atrair as indústrias: i) disponibilidade de infraestrutura e disposição do poder executivo municipal em criar estratégias industrializantes; ii) classe trabalhadora bem comportada e iii) facilidade de transportes devido à sua localização privilegiada[51].
“Industrialização é a meta principal”, foi um dos slogans que justificaram o propósito de elaboração do primeiro Plano Diretor de Bauru (1967), a cargo do Núcleo de Pesquisa de Estudos Urbanísticos da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, que propunha a constituição de um Distrito Industrial na cidade, oferecendo diversas vantagens às indústrias: terreno, isenção e restituição de tributos municipais, vias de acesso, mão-de-obra qualificada, água, esgoto, energia elétrica.
Ainda nos anos 1950-60, na gestão do prefeito Avallone Jr., outra ação deliberada no sentido obstinado de industrializar a cidade foi a expansão periférica implantada a partir da compreensão de que criar bairros operários na cidade seria um forte atrativo às indústrias e, ao mesmo tempo, um empreendimento que prometia grande valorização, afinal “vender lotes seria oferecer infraestrutura para uma virtual cidade industrial e operária”. Mais:
No período de auge, a obsessão dele com a industrialização articulava-se também à sua atividade profissional. Uma fonte de renda era a venda de loteamentos em Bauru. Ele criou muitos bairros na cidade: Parque Vista Alegre, Jardim Eldorado, Jardim Marabá, Jardim Tangarás, Jardim Industrial Manchester (nomeado por Avallone de “Manchester Brasileira”.[52]
Apesar do empenho de vários governos locais, Bauru não se tornou a almejada cidade industrial. Ainda que sua indústria tenha sido ampliada, a economia do município acabou sendo alavancada pelas atividades ligadas ao comércio e serviços: em 1996, segundo dados da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (SEADE), os serviços absorviam 51 por cento do pessoal ocupado, percentual seguido da indústria (26%) e do comércio (23%). No entanto, a expansão dos loteamentos prosseguiu nas décadas seguintes, “conformando certa simbiose e promiscuidade entre público e privado”, alimentando flagrante especulação imobiliária, configurando um desenho urbano marcado por forte contraste: de um lado a região nobre demarcada pelo eixo da Avenida das Nações e, de outro, a periferia precária formada pelos conjuntos habitacionais. Como em casos similares, a expansão da cidade se revelou errática:
Parcelamentos sobre parte ou total de antigas áreas rurais contíguas ou não à cidade já implantada, produzindo grandes vazios urbanos cuja valorização fundiária gerou vantagens privadas mediante suporte público de infraestrutura; grandes parcelamentos promovidos e executados pela COHAB ou INOCOOP em espaços originalmente não tão próximos do núcleo urbano, casos de conjuntos residenciais como “Presidente Geisel” e “Mary Dota”; parcelamentos privados que ocupam parte de glebas intersticiais que ficaram como vazios urbanos; intervenções municipais em áreas de vazios urbanos, seja em fundos de vale ou na totalidade destas, tendo em vista a necessidade de atendimentos de infraestrutura como sistema viário, equipamentos sociais e outros.[53]
Rio Claro, com população de 186.081 habitantes e taxa de urbanização de 97,57 por cento[54], localiza-se na Região Administrativa de Campinas, às margens da rodovia Washington Luís, com uma economia de perfil industrial relevante no estado de São Paulo – conforme dados da Fundação Seade. Sua caracterização como “centro ferroviário” foi importante fator de dinamização urbana e econômica, fortalecido pela instalação das oficinas da Companhia Paulista de Estradas de Ferro, contando com mais de dois mil empregados em 1892.
O desenvolvimento urbano de Rio Claro acelera-se sobremaneira a partir da extensão da linha férrea para além do município (1882) e da implantação das oficinas da Companhia Paulista, em 1892[55]. Desde então há crescimento populacional e urbano contínuo e acelerado vinculado aos empregos e à infraestrutura criados pelas indústrias nascentes, alimentando a demanda por comércios e serviços.
A dinâmica urbana e regional da “cidade azul” vincula-se ao seu papel como outrora importante centro da economia cafeeira. A partir da crise de 1929, Rio Claro experimentou, ao longo das três décadas seguintes, uma combinação de “estagnação econômica e de retração demográfica”[56], só superada no começo dos anos 1970 com seu crescimento econômico baseado na expansão industrial.
A partir da década de 1970, no bojo das políticas nacionais e estaduais voltadas à desconcentração econômica, o desenvolvimento urbano tomou novo impulso, decorrente da expansão do setor industrial, com a instalação de novas empresas de setores mais “dinâmicos”, como indústrias químicas, mecânicas, plásticas, dentre outras[57]. Em decorrência dessa expansão industrial, “verificou-se um aumento da população total residente em Rio Claro: natural e migrante”[58]. Nessa década, a cidade venceu a barreira à expansão urbana representada pela Rodovia Washington Luís, que corta a cidade de Sul a Oeste[59]. Nesse período “a expansão da malha urbana ocorreu desorganizadamente, sem critérios e planejamento crítico que orientasse essa expansão com vistas a minimizar os problemas citados oriundos do crescimento acelerado”[60].
A expansão econômica e o crescimento demográfico determinaram a expansão da malha urbana por meio da abertura de novos loteamentos, em grande parte sem a necessária infraestrutura básica[61]. Resultado: houve crescimento da periferia urbana, que ocupou loteamentos precários, sobretudo nas regiões norte e oeste da cidade, nas imediações do então recém-implantado Distrito Industrial[62]. Se até meados da década de 1960 as diferenças de classe na ocupação do espaço eram pouco evidentes, a partir desse momento constituiu-se vasta periferia precária, sem infraestrutura adequada, habitada majoritariamente pelas camadas de baixa renda[63] – padrão tão marcante do processo brasileiro de urbanização que opõe o centro (bem equipado) à periferia (precarizada).
Em síntese, o expressivo crescimento demográfico e a evolução econômica por que passaram essas cidades a partir dos anos 1970 traduziu-se numa gama variada de problemas sociais e urbanos, surgidos no vácuo da atuação das administrações municipais na regulação desse processo. Nesse cenário, embora em proporções mais modestas, as cidades médias também passaram a reproduzir problemas urbanos antes restritos às metrópoles, tais como expansão periférica sem infraestrutura, favelização etc.
Os novos Planos Diretores e os dilemas da participação
O Estatuto da Cidade (EC) impôs formatos participativos de formulação de políticas públicas: “gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano” (art. 2º).
O instrumento fundamental que sintetiza o novo marco regulatório é o Plano Diretor – definição ainda hoje contestada, seja pelo fato de que na proposta original do movimento pela reforma urbana não constava essa imposição, seja porque sua eficácia também é controversa. As posições mais receptivas ao Plano Diretor reportam-se à nova institucionalidade e à perspectiva de que os novos instrumentos urbanísticos e a conjuntura democrática ensejariam um ambiente mais propício aos Planos, em oposição ao modelo tecnocrático precedente[64].
O Capítulo IV do EC é dedicado à gestão democrática da cidade: “órgãos colegiados de política urbana; debates, audiências e consultas públicas; conferências; iniciativa popular de projeto de lei e de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano” (art. 43º). Ademais, exige a articulação das diretrizes de política urbana à gestão orçamentária, de modo a serem adotados “debates, audiências e consultas públicas sobre as propostas do plano plurianual, da lei de diretrizes orçamentárias e do orçamento anual, como condição obrigatória para sua aprovação pela Câmara Municipal” (art. 44º).
Mas há grandes diferenças entre enunciados normativos e a realidade. Balanço da geração de Planos Diretores Participativos (PDPs) da década de 2000 realça o paradoxo: absorção formal dos instrumentos do Estatuto evidencia o conflito de uma “nova cultura vinculada aos direitos sociais inscritos na Constituição e no Estatuto da Cidade” com outra em que “as velhas práticas se ligam à cultura conservadora e aos paradigmas tecnocráticos que ainda vigoram nos municípios”[65].
Numericamente foram muitos os processos participativos, mas “poucos foram os Planos que estabeleceram definições precisas quanto à forma de funcionamento dos mecanismos de participação e previram a articulação entre os mesmos”[66]. A menção ao contexto geral serve como ponto de partida para o estudo comparativo que se segue. O formato dos Planos analisados revela a permanência do paroxismo: em termos substantivos, legislações inspiradas no Estatuto da Cidade, mas com participação desigual (quadro 1).
Quadro 1 Resumo comparativo dos processos de elaboração dos Planos Diretores Participativos |
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Fonte: elaboração própria. (*) Prefeito desligou-se do partido pelo qual se elegeu e continuou sem filiação partidária até o fim do mandato |
Metodologicamente, a abordagem adota o modelo sugerido por Avritzer[67] que incorpora três dimensões complementares: como a participação se organiza; em que termos as estruturas estatais absorvem a participação; e como o marco jurídico-legal influi nesses processos.
Assim é possível dimensionar o desempenho e o potencial dos desenhos participativos quanto à sua capacidade democratizante e à efetividade ou dependência do sistema político. Avritzer sustenta, ainda, que existiriam basicamente três formatos contemporâneos de participação. O primeiro tipo seria um modelo de baixo para cima (identificado nos Orçamentos Participativos), no qual há livre e ampla participação dos cidadãos, daí sua maior capacidade democratizante. O segundo seria um desenho de compartilhamento com participação simultânea de representantes estatais e da sociedade civil (identificado nos conselhos de políticas públicas), no qual a participação stricto sensu é mais restrita e há necessariamente leis e sanções que o regulam. O último desenho institucional teria caráter de ratificação na medida em que as decisões não seriam efetivamente estendidas aos atores da sociedade civil, que apenas cumpririam um papel homologatório, caso dos Planos Diretores.
A escolha analítica não implica absolutizar desenhos institucionais para mensurar sua efetividade participativa. Cumpre articular a dimensão institucional a outras duas variáveis complementares: a capacidade organizativa da sociedade civil e a conduta do governo de turno. Tal agenda setting responde às exigências institucionais da Constituição Federal e do Estatuto da Cidade, além de refletir decisões governamentais e demandas societárias. Portanto, seus resultados refletirão essas múltiplas determinações.
Começando por Piracicaba, a elaboração do Plano Diretor Participativo ocorreu na gestão do prefeito José Machado (PT), tendo sido finalizado por ocasião do II Congresso da Cidade, em 2004. Com a mudança governamental resultante das eleições do mesmo ano, ocorre uma substantiva alteração processual que culmina em novo projeto conduzido pelo novo prefeito, Barjas Negri (PSDB), em dezembro do ano seguinte. Apesar de o escopo geral não ter sofrido modificações formais, a exequibilidade da nova legislação ficou comprometida.
Originalmente, o Executivo empreendeu uma metodologia participativa que incluiu levantamento técnico da realidade urbanística local e suas tendências, além de um “diagnóstico participativo” com oficinas de capacitação para lideranças comunitárias (operacionalizado através das redes do Orçamento Participativo) e seminários e entrevistas com representantes de entidades da sociedade civil (universidades, órgãos técnicos de engenheiros e arquitetos). Ao fim, ocorreram dez audiências públicas, duas Conferências e dois Congressos da Cidade. Para tanto, foi contratada a consultoria do Instituto Pólis.
Em termos substantivos, o conteúdo (Lei nº 186/2006) é integralmente orientado pelo Estatuto da Cidade: defesa da função social da propriedade e gestão participativa.
A mudança governamental, contudo, implicou alterações significativas. Embora a proposta original mantivesse a limitação do perímetro urbano, o novo governo promoveu ampliação da ordem de 1/3 do território, medida com largo impacto urbanístico. Além disso, promoveu modificação na legislação urbanística (Lei Complementar nº 175, de 2/8/2005) que induz adensamento de área que colide com o macrozoneamento original (espaço de restrição por limitações de infraestrutura e comprometimento ambiental).
No quesito estritamente participativo, propostas mais restritivas de desenvolvimento urbano ratificadas pelos Congressos da Cidade foram abandonadas e as alterações processadas transcorreram sem formatos transparentes.
Também merece registro a facilidade com que o Executivo fez uso de sua maioria parlamentar para aprovar o Plano e promover novas modificações urbanísticas que o contrariavam, tanto pela falta de regulamentação (muitos dos instrumentos previstos não são autoaplicáveis), quanto pela adoção de medidas de orientação oposta. Como a composição do Conselho da Cidade é controlada pelo Executivo e sua atuação tem sido litúrgica, nem este foro se pronunciou, em evidente expressão de impotência da sociedade civil.
Já em Bauru o processo se iniciou com a montagem de dois grupos: o Grupo de Trabalho (de composição mista entre representantes técnicos e políticos do governo e da sociedade civil) e posteriormente o Grupo de Apoio (equipe de suporte administrativo). Além destes, o Núcleo Gestor (integrado por gestores políticos e técnicos) assumiu a efetiva condução do processo. Preliminarmente, procedeu-se à sistematização de informações e conhecimento mínimo do marco regulatório (Estatuto da Cidade e legislação urbanística local em vigor). No momento seguinte, foram realizados encontros de “sensibilização” com líderes comunitários, ensejando a fase de diagnóstico ou “leitura técnica e participativa”.
Em seguida a Prefeitura patrocinou assembleias e plenárias nos bairros da cidade, quando foram eleitos delegados para o congresso que ratificou as bases do projeto de lei posteriormente encaminhado à Câmara Municipal. Em razão da complexidade da legislação, o congresso conclusivo se desdobrou em dois eventos porque a metodologia didática adotada incluía a leitura detalhada de todos os itens da peça jurídica.
O processo teve início em 2005 e foi concluído somente em 2008, quando finalmente o Legislativo municipal aprovou a proposta encaminhada pelo Executivo e ganhou a forma de Lei nº 5.631.
A participação contabilizou “114 reuniões contando com a presença de aproximadamente 4.800 pessoas, alcançando média de 42 pessoas por evento” segundo Ferreira, 2007. É possível admitir que critérios quantitativos de participantes possam não representar obrigatoriamente um aprimoramento da poliarquia em razão de eventual ignorância dos participantes em relação à agenda em debate ou ao ativismo intenso de minorias que podem subverter os interesses da maioria[68], mas é evidente que a participação, aqui, adquiriu números expressivos que não podem ser ignorados.
Além da participação no processo de elaboração do Plano Diretor, o texto final da lei também incluiu um item dedicado aos “instrumentos de democratização da gestão”, no qual são previstos dispositivos como conferências, assembleias, audiências públicas, plenárias, além de outra originalidade, a saber, a iniciativa popular legislativa de projetos, planos e programas (artigos nº 280, nº 281, nº 282, º 283). Os princípios do fomento à participação popular e à capacitação estão inscritos no Art. 285, que trata de “efetivar a participação na gestão pública na vivência democrática na cidade”.
A participação revela o esforço governamental em fazê-lo, o que não é desprezível se se considerar a tradição tecnocrática com que o planejamento urbano foi tratado no país ou mesmo no plano local[69]. Em resumo, “apesar do grande número de emendas propostas pelo Legislativo, a efetiva participação popular em todo o processo garantiu o respeito ao trabalho elaborado pela comunidade”[70].
Já o Plano de Rio Claro foi elaborado entre 2005 e 2007, na gestão do prefeito Dermeval Nevoeiro (DEM), culminando na Lei nº 3.806/2007. Formulado de forma pouco participativa, com algumas reuniões públicas voltadas principalmente a públicos restritos ligados a Conselhos Municipais e a entidades técnicas, o Plano prevê a “participação das entidades comunitárias no estudo, encaminhamento e solução dos problemas, planos e projetos que lhes sejam concernentes” (Art. 3º) e um Sistema de Planejamento e Gestão com funcionamento de “Conselhos Municipais criados em lei” (Conselhos de Defesa do Patrimônio Histórico; de Cultura; de Segurança e Defesa Social; todos previstos no Art. 203). Além desses, foi instituído o Conselho de Desenvolvimento Urbano (Art. 185, cujas competências são relacionadas no Art. 192), composto por representantes de entidades civis.
Em razão de vários conflitos relativos à sua forma de elaboração (pouca abertura à participação popular), ao seu conteúdo (não ter incorporado todos os instrumentos do Estatuto da Cidade) e à mudança governamental (em 2008 foi eleito um novo prefeito), o Plano Diretor de 2007 teve sua revisão proposta e aprovada pelos participantes da 3ª Conferência da Cidade de Rio Claro, realizada em janeiro de 2010. No mesmo ano a Secretaria de Planejamento, Desenvolvimento e Meio Ambiente (SEPLADEMA) solicitou ao arquiteto José Magalhães e ao advogado Paulo Lomar pareceres técnicos sobre Plano Diretor de 2007, de modo a orientar a revisão.
Com base no parecer dos consultores, o governo solicitou ao Conselho de Desenvolvimento Urbano (CDU) a revisão do Plano Diretor, com o objetivo de adequá-lo aos princípios do Estatuto da Cidade. Assim, CDU e SEPLADEMA deram início à nova revisão do Plano Diretor ao longo do ano de 2011. Esse processo, que culminou com a apresentação de uma nova versão em meados de 2012, transcorreu mediante uma série de reuniões – tanto nos conselhos municipais quanto em alguns bairros da cidade – e três audiências públicas.
Paralelamente, as leis de Parcelamento do Solo e do Zoneamento Urbano também passaram por revisão, promovendo significativa modificação no arcabouço legal urbano do município. O processo, contudo, ainda não foi concluído porque o novo projeto de lei ainda não foi votado pelo Legislativo.
Para uma visão panorâmica, o Quadro 2 apresenta um balanço comparativo dos instrumentos do Estatuto da Cidade incorporados pelos novos Planos Diretores Participativos de Piracicaba, Bauru e Rio Claro. Registre-se que boa parte dessas ferramentas potencialmente capaz de fazer valer as funções sociais da cidade e da propriedade, a despeito de constar do texto legal, não foi regulamentada e, portanto, não pode ser aplicada na regulação do crescimento urbano ou no combate à especulação imobiliária. As exceções mais notáveis referem-se às esferas participativas (conselhos etc.) e às Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS), instrumento largamente utilizado que será objeto de análise mais detida em seguida.
Quadro 2 Comparativo de Planos Diretores sob o Estatuto da Cidade |
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Fonte: elaboração própria |
Política Urbana, Planos Diretores e as ZEIS
A partir de 2003, o recém-criado Ministério das Cidades passou a apoiar os municípios na formulação e revisão de seus Planos Diretores, gerando grandes expectativas de ampliação da capacidade do poder público de interferir na dinâmica de produção do espaço urbano, garantindo o cumprimento da função social da propriedade urbana, notadamente em relação ao acesso à moradia às camadas mais pobres da população[71].
Analisaremos aqui particularmente as Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS)[72] – o instrumento mais absorvido pelos novos Planos Diretores associado à política de habitação[73]. Oliveira e Biasotto[74] observaram que as ZEIS foram incorporadas em grande parte, ainda que, em muitos casos, careçam de delimitação e regulamentação. Na grande maioria, referiam-se a áreas ocupadas por assentamentos precários de baixa renda para fins de regularização, sendo pouco utilizada a demarcação de áreas vazias ou subutilizadas, comprometendo sua “eficácia (...) como instrumento indutor da promoção da democratização do acesso à terra urbanizada, bem localizada e próxima dos centros de emprego”[75]. As razões desse parco uso das ZEIS seriam: “reserva de área para habitação popular em áreas cobiçadas para outros usos, muito mais lucrativos, implica disputas e conflitos que ou foram perdidos na luta política e econômica, ou não foram sequer enfrentados no processo de elaboração do plano diretor”[76].
Com a adoção do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV)[77] pelo governo federal, há indícios de ampliação da utilização desse instrumento, ainda que, não necessariamente, implique a ampliação da oferta de áreas urbanizadas com boa infraestrutura)[78].
A incidência do PMCMV nos municípios é expressiva e não pode ser ignorada. Em Piracicaba, entre os anos de 2009 e 2011, foram realizados 18 empreendimentos, totalizando 2.511 unidades habitacionais, o que representou um investimento pouco maior que R$ 200 milhões. Com a segunda fase do programa, esses números expandiram-se ainda mais: em 2012 foram financiadas, junto à Caixa Econômica Federal, gestora do PMCMV, 1.816 imóveis e, apenas nos três primeiros meses de 2013, foram aprovados empreendimentos que totalizavam 1.634 novas unidades habitacionais. No total, são 5.961 unidades no município.
Em Bauru, na Fase I, foram construídas 1.816 unidades (casas e apartamentos), e na Fase II são projetadas novas 4.300 unidades. Para se ter ideia da importância desses números, a Companhia Habitacional Popular de Bauru (COHAB), através de vários programas, produziu 17.465 casas populares desde sua criação, em 1966. Ou seja, uma média anual de pouco mais de 371 habitações em quarenta e sete anos. Já o Programa Minha Casa Minha Vida, somadas as Fases I e II, deve atingir 6.116 unidades em seis anos, isto é, média anual de pouco mais de 1.019 habitações. Quantidade certamente insuficiente para atender o déficit habitacional do município, mas expressiva o bastante para aquecer fortemente o mercado imobiliário e valorizar determinadas áreas dotadas de infraestrutura, interferindo bastante na dinâmica do desenvolvimento urbano local.
Em Rio Claro, no período de 2009 a 2011, foram contratadas 899 unidades habitacionais em 15 empreendimentos. O valor total dos empreendimentos correspondeu a pouco menos de R$ 68 milhões. Os empreendimentos financiados pelo PMCMV, para os três municípios, comportam tipologias diversas, desde casas unifamiliares em loteamentos populares a condomínios verticais multifamiliares. Grande parte desses empreendimentos foi viabilizada pela demarcação e utilização do instrumento das ZEIS.
Na sequência analisamos as diferentes formas de incorporação e regulamentação das Zonas Especiais de Interesse Social a partir das revisões dos Planos Diretores nos três municípios.
Em Piracicaba, já na etapa de diagnóstico de laboração do Plano Diretor, observou-se que pouco menos da metade do perímetro urbano era constituído de áreas desocupadas, em grande parte equipadas de infraestrutura urbana à espera de valorização imobiliária, de modo que seu primeiro Eixo Estruturador era “promover a destinação socioeconômica dos vazios urbanos e integrar socioterritorialmente os bairros da cidade”[79]. Para tanto, decidiu-se pelo congelamento do perímetro urbano, valendo-se da aplicação dos instrumentos do Estatuto para combater a especulação e promover a ocupação dos vazios existentes.
Duas modalidades foram incorporadas: ZEIS 1 para a urbanização e regularização fundiária de áreas públicas e particulares ocupadas por assentamentos de baixa renda; e ZEIS 2 para a promoção de habitação popular em áreas não edificadas (art. 79º). Estas últimas foram regulamentadas em dezembro de 2009 (Lei Complementar 246/09). Piracicaba conta hoje com vinte e uma (21) ZEIS 2, a maior parte na Região Norte, em zoneamento definido como de Ocupação Controlada por Fragilidade Ambiental (ZOCFA) e nas franjas da mancha urbana.
As ZEIS 1 foram regulamentadas em dezembro de 2010 (Lei Complementar 264/10), sendo demarcadas cinco áreas, apesar dos 42 núcleos de favelas apontados pelo Plano Municipal de Habitação, onde residiam 16.581 pessoas[80]. Na figura 1 podemos observar a localização das ZEIS dentro do perímetro urbano, bem como a localização dos núcleos de favela levantados à época da elaboração do Plano.
Figura 1. Perímetro urbano de
Piracicaba 2012 Localização das favelas (laranja), ZEIS 1 (verde) e ZEIS 2 (vermelho). Fonte: Instituto de Pesquisas e Planejamento de Piracicaba. Elaboração própria. |
Já em Bauru o Plano Diretor (Lei 5.631/2008) foi objeto de veto pelo Executivo de algumas mudanças aprovadas na Câmara de Vereadores, restrições estas relativas aos limites estabelecidos às construções, à verticalização e à expansão do perímetro urbano.
O Plano incorporou grande parte dos instrumentos do Estatuto, dentre estes as ZEIS (arts. 81º a 85º), sob três modalidades regulamentadas pela Lei 5.766, de 30/07/2009. ZEIS 1: áreas particulares ocupadas por população de baixa renda, abrangendo favelas onde haja interesse na produção e manutenção de habitações de interesse social; ZEIS 2: glebas ou lotes subutilizados, destinados à produção e à manutenção de habitações de interesse social; e ZEIS 3: “glebas ou terrenos públicos ocupados por favelas, áreas verdes ou institucionais, onde existe interesse público em promover a recuperação urbanística, a regularização fundiária, a produção e a manutenção de habitações de interesse social”. No Plano Diretor já haviam sido indicadas nove ZEIS 1, dezesseis ZEIS 2 e doze ZEIS 3 (Art. 81). E a mencionada lei que regulamentou o instrumento incluiu uma nova ZEIS 2 (art. 2º).
Na figura 2 é possível observar a distribuição das ZEIS do município de Bauru. Nota-se uma concentração mais expressiva de ZEIS 2 nos extremos oeste e norte da cidade – localização melhor inserida na malha urbana local do que a versão consolidada em Piracicaba.
Figura 2. Perímetro urbano de
Bauru 2012 Localização das favelas a serem removidas (laranja), ZEIS 1 (verde), ZEIS 2 (vermelho) e ZEIS 3 (rosa). Fonte: Prefeitura Municipal de Bauru. Elaboração própria. |
Em
Rio Claro, o primeiro Plano data do começo dos anos 1990 (Lei 2.492/1992),
depois revisado em 2007, dando origem ao atualmente em vigor (Lei 3.806/2007).
Entretanto, em virtude do contexto político local, os instrumentos do Estatuto
da Cidade foram incorporados de forma bastante limitada na versão de 2007. Além
disso, como alguns pontos não foram regulamentados (caso da “Lei Municipal de
Zoneamento Urbano”), a lei jamais foi aprovada e sua aplicação ficou
comprometida. As Zonas Especiais de Interesse Social – ZEI (art. 9º) foram
incorporadas somente para fins de regularização de áreas ocupadas por moradias
populares, não sendo previstas em áreas vazias ou subutilizadas para a promoção
de novas moradias. O Plano previa, ainda, uma modalidade de “Parcelamento
urbano de interesse social” (art. 38º), com parâmetros mais flexíveis.
O projeto de lei do novo Plano, que ora tramita na Câmara de Vereadores, foi apresentado e debatido publicamente a partir do começo de 2012, tem importantes mudanças.
As ZEIS foram incorporadas (art. 17º, inciso IX) sob três formas: ZEIS 1: “terrenos sem edificações ou subutilizados, privados ou públicos, destinados à promoção de empreendimentos Habitacionais de Interesse Social”; ZEIS 2: “assentamentos informais urbanizados ou em processo de urbanização em áreas públicas ou particulares, favelas e cortiços”; e ZEIS 3: “loteamentos de interesse social, loteamentos irregulares ou clandestinos urbanizados ou em processo de urbanização situados em áreas públicas ou privadas, comprovadamente ocupados até dezembro de 2009”. As ZEIS estão caracterizadas como “parcelas do território que têm como objetivo promover a urbanização compulsória, regularização fundiária e impedir a subutilização da propriedade urbana” (art. 21º). Sua regulamentação foi remetida pelo Plano a lei específica posterior. Entretanto, como se pode ver na figura 3, o Plano indica alguns perímetros de ZEIS representados basicamente por ocupações irregulares para fins de urbanização ou regularização.
Figura 3.
Perímetro urbano de Rio Claro 2012 |
Considerações finais
As cidades de porte médio foram o território privilegiado do crescimento econômico e demográfico nas últimas décadas, configurando um quadro de “espraiamento espacial da riqueza nacional”, a partir dos anos 1970. Em compensação, essas cidades passaram a apresentar, ainda que em escalas distintas, grande parte dos problemas urbanos, físicos e sociais antes visíveis apenas nas grandes aglomerações urbanas.
A promulgação do Estatuto da Cidade representou oportuno instrumento legal para enfrentar os problemas urbanísticos resultantes dos processos de acelerado crescimento e desenvolvimento econômico observados nos municípios analisados, dispondo de uma série de instrumentos de regulação e ordenamento urbanístico. A partir de então, a política urbana deveria subordinar-se à função social da cidade e da propriedade, sendo o Plano Diretor seu instrumento central.
Evidenciam-se, contudo, sérias dificuldades em fazer valer os novos instrumentos do Estatuto da Cidade e promover uma cidade mais justa e democrática, visto que seus instrumentos ou não são autoaplicáveis ou são remetidos à regulamentação posterior, ficando à mercê de sujeições político-institucionais e de interesses particulares, comprometendo sua eficácia.
Essa distância entre enunciados normativos e os fatos demanda uma análise que considere as determinações econômicas, o padrão de expansão urbanística do período recente e as variáveis político-institucionais, uma vez que o grau de participação societária e as escolhas das elites políticas são quesitos cruciais. Esse hiato entre regulamentação formal e a realidade indica a continuidade da pesquisa, principalmente considerando as inter-relações entre perfil econômico e desenvolvimento urbano dessas cidades para produzir balanço comparativo mais substantivo sobre o potencial transformador do Estatuto da Cidade e seus correspondentes processos decisórios. Mesmo assim, há tendências a destacar.
No caso da implantação das ZEIS, embora o instrumento tenha sido incorporado e até regulamentado (casos de Piracicaba e Bauru), sua implantação ainda é lenta e os dados disponíveis indicam que sua utilização parece mais vinculada às imposições institucionais de programas de outras esferas de governo – caso notável do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV). Nessas condições, nada garante que possa cumprir seus objetivos originais de assegurar regras e padrões urbanísticos particulares para promover a ampliação da oferta de habitação de interesse social, reabilitação urbana, regularização de ocupações e proteção ambiental. Neste caso, há indícios de que o instrumento foi atropelado por ações institucionais não previstas pelo Estatuto da Cidade. Vale lembrar que o Programa Minha Casa Minha Vida foi implantado em 2009, enquanto o Estatuto da Cidade vigora desde 2001.
Quanto à dimensão propriamente política e ao quesito da participação, a análise dessas três cidades se inscreve no cenário em que provavelmente nunca foram elaborados tantos Planos Diretores no país: “em 2009, dos 1644 municípios com mais de vinte mil habitantes, 1433 declararam ter Plano Diretor, o que corresponde a 87 por cento do total”[81].
Os “fracos resultados obtidos” estão relacionados a diversos fatores, dentre os quais merecem destaque “o poder dos grupos privados sobre a produção e a apropriação da cidade...”[82] o caráter genérico e impreciso dos diagnósticos e mesmo das diretrizes estabelecidas nos novos Planos e, não menos importante, a “baixa compreensão dos mecanismos de apropriação privada da cidade e dos instrumentos de reforma urbana por parte dos técnicos e das lideranças dos movimentos populares”[83]. A gramática tecnicista e a complexidade dessas ferramentas certamente dificultam a incorporação de novos atores aos correspondentes processos decisórios.
Diversamente do que sugere Avritzer[84], o Orçamento Participativo e os Conselhos de Políticas Públicas são procedimentos que também se iniciam nas estruturas estatais mediante definição dos parâmetros diversos (orçamentários, de políticas substantivas etc.). O mesmo ocorre com os Planos Diretores Participativos. As diferenças, portanto, não residem na origem dos formatos participativos.
A hipótese adotada é que a baixa organização da sociedade civil determina proporcional capacidade de absorção participativa pelas instituições estatais. Embora haja variações, a dinâmica participativa dos três casos esteve subordinada aos atores estatais, cujo controle sobre os procedimentos participativos foi efetivamente alto.
Em Bauru, os números são mais expressivos, a metodologia empregada promoveu grande quantidade de reuniões, assembleias, capacitação e plenárias até chegar a duas sessões do congresso da cidade. Mas todos esses momentos foram conduzidos pela Prefeitura local: a equipe dirigente (Grupo de Trabalho e Núcleo Gestor) definiu não só os termos da participação como isso implicou a subordinação da participação civil. Basta lembrar que, embora os delegados presentes ao congresso votassem artigo por artigo após leitura integral do texto, esta minuta foi concebida pelo governo local.
Processo semelhante ocorreu em Piracicaba, mesmo com números menos expressivos. Da leitura participativa às entrevistas com representantes de entidades, passando pelas audiências públicas até se chegar ao Congresso da Cidade, a equipe do governo local jamais perdeu o controle dos termos substantivos e legais com que o novo Plano foi elaborado. A diferença é que, com a mudança governamental, alterações substantivas foram feitas sem ampla consulta pública.
Em Rio Claro, o processo foi bem mais fraco em termos participativos: as consultas transcorreram de forma episódica e superficial, e nova revisão foi iniciada porque identificou a baixa participação como um de seus motivos principais. Diferentemente da primeira iniciativa, a segunda foi mais permeável, disparidade que não pode ser dissociada da mudança governamental.
Forte peso do governo e fragilidade da sociedade civil ensejam os termos em que a participação transcorreu. Há grande dependência do sistema político e também da orientação político-ideológica do governo de turno, evidenciando o caráter homologatório desse tipo de processo participativo na medida em que se limita a ratificar políticas públicas formuladas ex ante pelos atores estatais.
A participação não só não foi massiva como se deu à base de delegação e transferência de interesses – ingredientes clássicos que definem a representação. Constatamos processos participativos de representação cujo mérito básico consiste em alargar os espaços nos quais são debatidas políticas públicas, em que pese seu caráter efetivamente ratificador.
Em todos os casos o Executivo aprovou com facilidade seus projetos. Isto revela tanto a fraqueza e o despreparo do Legislativo para temas complexos como a legislação urbanística quanto o amplo controle exercido pelo Executivo nos processos decisórios. O Executivo tem o monopólio da iniciativa em matérias legislativas fundamentais (orçamento, legislação urbanística etc.), daí que o amplo poder de agenda que se verifica na esfera federal[85] também se reproduz no plano municipal.
Por último, a questão envolvendo a forma como está disposta a legislação e a influência do marco estritamente institucional. Trata-se de agenda que resulta de imposição institucional. Não obstante, como suas regras são genéricas, os formatos a serem adotados podem variar bastante conforme as predileções do governo de turno. O tipo de participação em Piracicaba e em Bauru e a forma litúrgica com que foi conduzida em Rio Claro revelam que sua efetividade depende do Executivo.
Embora as instituições contem no cômputo geral, a política faz grande diferença[86]. Portanto, o continuum esquerda-direita pode ser valioso nas explicações das condutas governamentais. A mudança de governo em Piracicaba, a maior inclinação à participação em Bauru e a conduta oposta em Rio Claro no primeiro ciclo mostram que governos de esquerda são mais propensos a desenhos democratizantes.
Apesar dos limites, o modelo de Plano Diretor Participativo é um avanço significativo em relação à tradição de planos tecnocráticos de gerações passadas. A inovação se traduz em experimentações democráticas que promovem o alargamento da cidadania, particularmente do direito de participar de decisões públicas. A virtude principal desses desenhos institucionais não diz respeito à efetiva capacidade decisória compartilhada com representantes da sociedade civil – com efeito, modesta –, mas em seu significado simbólico e no seu caráter pedagógico e inclusivo.
Embora homologatória, a participação se inscreve em um movimento amplo de democratização dos processos decisórios de políticas públicas que enseja o reconhecimento de mecanismos participativos na gestão urbana (conselhos, conferências, audiências públicas etc.). Investigações qualitativas da participação suavizam as expectativas mais otimistas. Apesar do pouco tempo de implantação, agora é preciso passar a uma segunda etapa de análise criteriosa da participação na gestão dos Planos Diretores.
Notas
[1] Castello Branco, 2006, p.246.
[2] A esse respeito, ver: Doimo, 1995; Kowarick, 1993; Sader, 1988.
[3] Doimo, 1995, p.69.
[4] Brandão, 2011.
[5] Sallum Jr., 1996.
[6] Michiles et al., 1989.
[7] Lavalle, 2011.
[8] Bobbio, 1986.
[9] Confusão similar é amplamente praticada na interpretação de outras experiências inovadoras, como o Orçamento Participativo (OP), tido inadvertidamente como exemplo de “democracia direta”. Ocorre que em ambos os casos vigoram mecanismos de representação. A esse respeito, ver Miguel, 2005.
[10] Cano, 2008.
[11] Lipietz, 1996.
[12] Pires, 2006.
[13] Harvey, 1996.
[14] Amorim Fº; Serra, 2001, p.10.
[15] Steinberger; Bruna, 2001, p.45.
[16] Diniz, 1993, p.36-7.
[17] Negri, 1996, p.41.
[18] Cano, 2008, p.174.
[19] Cano, 2008.
[20] Amorim Fº; Serra, 2001, p.27.
[21] Diniz; Crocco, 1996, p.93.
[22] Castro, 2001.
[23] O Plano Real foi um ajuste macroeconômico de estabilização monetária implantado em 1994, sob a presidência de Itamar Franco. Bem sucedido no controle da inflação, que passou da casa dos aproximadamente 2.500 por cento em meados de 1990 para cerca de 5 por cento a partir de 2003, representou grande sacrifício para o crescimento da economia e do emprego em virtude dos instrumentos de que se serviu para alcançar a estabilidade: juros elevados e câmbio sobrevalorizado.
[24] Motta; Ajara, 2000, p.17.
[25] Amorim Fº; Serra, 2001, p.11.
[26] Motta; Ajara, 2000, p.20.
[27] Andrade; Serra, 2001, p.143.
[28] Steinberger; Bruna, 2001, p.45. Grifo no original.
[29] Azzoni, 1986, p.126. Grifo no original.
[30] Azzoni, 1986, p.125.
[31] Diniz, 1993, p.125.
[32] Negri, 1996.
[33] Cano, 2008.
[34] Lencioni, 2004.
[35] Lencioni, 2004, p.70.
[36] Brandão; Macedo, 2007, p.27.
[37] Dedecca et al., 2009.
[38] Brandão; Macedo, 2007, p.25.
[39] Negri, 1996, p.180.
[40] Suzigan; Furtado, 2006, p. 171.
[41] Censo 2010/IBGE.
[42] Terci et al., 2005.
[43] De modo geral, a reestruturação produtiva e a estratégia “corte, concentre e simplifique”, resultou em redução drástica do emprego industrial, com grande perda de postos de trabalho, ao mesmo tempo em que se detectou aumento significativo do emprego no setor serviços, fenômeno de caráter internacional.
[44] FIESP, 2012.
[45] O Profilurb foi instituído no fim dos anos 1970 pelo Banco Nacional de Habitação (BNH) como uma alternativa barata de política habitacional por meio da oferta de lotes urbanizados, dispondo de infraestrutura urbana e, na maior parte das vezes, contando com as unidades hidráulicas como embrião. Algumas das principais críticas ao programa é que estaria promovendo a constituição de “favelas organizadas”, além de constituir um meio para remover as favelas já existentes em direção à periferia. A respeito da política habitacional brasileira durante a ditadura militar, ver Sachs, 1999.
[46] O movimento social promovido pelos moradores de favela ganhou força e institucionalizou-se com a organização da Associação de Favelados em Piracicaba, que organizou dois congressos de favelados e contou com ajuda financeira internacional. Esse suporte garantiu, em grande parte, a urbanização dos assentamentos e a fixação nos locais originais. A esse respeito, ver Siqueira, 1993.
[47] Pólis, 2003.
[48] Pólis, 2003, pag. 19.
[49] Censo 2010/IBGE.
[50] Losnak, 2004, pp. 125-26.
[51] Losnak, 2004.
[52] Losnak, 2004, pag.135.
[53] Goulart, 2008b, p.28-9.
[54] Censo 2010/IBGE.
[55] Hogan et al., 1986.
[56] Fileni, 2004, p.71.
[57] Idem, p.72.
[58] Costa apud Fileni, 2004, p.109.
[59] Carmo, 2006, p.36.
[60] Silva, 1994, p.81.
[61] Paes, 1996 apud Fileni, 2004, p.112.
[62] Costa apud Fileni, 2004, p.116.
[63] Keller, 1964 apud Lourenção, 1986, p.162-3.
[64] Para uma posição mais receptiva ao potencial do Plano Diretor, ver Rolink (2009) e Cymbalista (2007). Para uma posição mais crítica, ver Maricato (2011) e Villaça (2004).
[65] Santos Jr; Montandon, 2011, p.27.
[66] Santos, 2011, p.277.
[67] Avritzer, 2008.
[68] Dahl, 1989.
[69] A esse respeito, ver: Caldeira e Holston, 2004; Losnak, 2004.
[70] Rigitano, 2008, p.238.
[71] Oliveira; Biasotto, 2011.
[72] O instrumento das Zonas Especiais de Interesse Social está previsto no Estatuto da Cidade (Artigo 4º, inciso V, alínea “f”), com vistas “à produção e manutenção de habitação de interesse social” (Estatuto da Cidade, 1992, p.189). Sua origem remonta ao começo dos anos 1980, tendo sido aplicado pela primeira vez na cidade do Recife, em 1983.
[73] Cardoso; Silveira, 2011, p.115.
[74] Oliveira e Biasotto. 2011.
[75] Oliveira; Biasotto, 2011, p.75.
[76] Idem.
[77] O Programa Minha Casa, Minha Vida é uma política pública de financiamento habitacional e regularização fundiária instituída pelo governo federal em 2009, por meio da Lei Federal 11.977, de 7 de julho de 2009, com o objetivo inicial de promover a construção de um milhão de moradias destinadas à população de baixa renda, objetivo rapidamente atingido. Em 2011 foi instituída a segunda fase do programa, com novas diretrizes e a meta de produção de dois milhões de novas habitações.
[78] Uma das principais críticas ao programa é que ele tem por foco a produção quantitativa de unidades habitacionais, desvinculada de uma política urbana de enfrentamento ao passivo socioambiental das cidades brasileiras, concorrendo, na verdade, para seu acirramento. Para uma análise crítica do PMCMV, ver Ferreira, 2012.
[79] Pólis, 2003, p.185-6.
[80] PMHIS, 2010, p.61,67.
[81] Santos Jr; Montandon, 2011, p.29.
[82] Santos, 2011, p.277.
[83] Idem, p. 278.
[84] Avritzer, 2008.
[85] Limongi, 2006.
[86] Goulart, 2008a.
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